Depois de transportar os convidados para as ruas de Manchester, com a coleção pre fall 2024, Virgine Viard orientou-os agora rumo às alturas, num exercício de panorâmica 360. Na cidade portuária de Marselha, o telhado do La Cité Radieuse, o complexo de apartamentos construído entre 1947 e 1952 pelo arquiteto Le Corbusier foi esta quinta-feira o cenário futurista para a apresentação da coleção Cruise 24/25 da maison francesa.
No topo do MAMO, ou Marseille Modulor, atual centro de artes com programação regular, ecoaram códigos de sempre e novidades frescas, para um singular guarda-roupa de praia. Estamos não muito distantes de Deuville, reduto também ele com vista para o azul onde Gabrielle Chanel se lançou no ramo da chapelaria e onde Viard mostrou as suas propostas para esta primavera.
Neste evento ao ar livre, as condições climatéricas, e o vento em particular, desafiaram a assistência, que antes do desfile teve oportunidade de conhecer o famoso prédio que abrigou os marselheses cujas casas foram destruídas pelos bombardeamentos aliados durante a Segunda Guerra Mundial. Desafiaram e coadjuvaram a atmosfera, diga-se, já que o elemento, tal como o mar, deram o tom para esta montra jovial que seguiu o embalo mediterrânico.
Com a composição Oxygene, de Jean-Michel Jarre, em fundo, inovação e nostalgia continuaram a dominar os planos da diretora criativa da Chanel, que como habitual sentou na fila da frente embaixadoras de eleição como Marion Cottilard, Lily-Rose Depp e Charlotte Casiraghi. “Marselha é uma cidade que me põe em contacto com as minhas emoções”, destacou Virginie nas notas sobre a coleção. “Tentei captar o seu poder de atração, a sua lufada de ar fresco, e espelhar a energia que aqui reina”.
Os looks saídos da fornada Cruise não defraudariam Coco — nem as exigências de uma geração tik tok. Querem-se tão clássicos quanto práticos — a começar pelas bailarinas pretas e pelos descontraídos chinelos no pé de sola compensada. O intemporal preto ou o branco — numa série repleta de rendas e aplicações de flores que fechou o desfile — coabitam com cores vibrantes, numa paleta que viaja entre o verde e o amarelo.
Bermudas em crochet, versões capri, e mini calções de ciclista cruzam-se com maxi cardigans; o moletão dos hoodies faz-se anunciar sob icónicos casacos de Tweed Bouclé. Por aqui também passeiam bodies e maillots, vestidos estampados com monograma, jerseys tipo neoprene, fechos e capuzes que evocam fatos de mergulhador, ondulações e bordados que incluem peixes, redes de pesca, conchas e mariscos. Nos acessórios, os talismãs ocupam a área do pescoço, e o duplo C acampa nos mais inesperados recantos.
La Cité Radieuse pareceu ajustar-se à ocasião como uma luva, com a sua vibração artística, energia alternativa e multicultural, fiel ao ambiente pulsante da segunda maior cidade francesa. Para além dos apartamentos cooperativos privados, o edifício abriga um moderno hotel de meados do século XX, uma livraria de arte, galerias de arte, e ainda uma pequena retrospetiva de Agnés Varda, cineasta de estimação de Viard.
A maison francesa aproveitou ainda para lançar a sua própria Radio Chanel, com programas transmitidos ao vivo antes e depois dos desfiles. Neste caso, a animação coube à embaixadora da marca Caroline de Maigret.
Corria 1919 quando Coco Chanel criou o conceito de coleção Croisière (ou cruzeiro de barco, em francês), um sortido de peças de meia estação destinado às clientes que rumavam à zona balnear de Biarretz no começo da primavera. A fluidez e leveza das criações, das calças amplas aos vestidos feitos para passear de barco ou praticar desporto, contrastavam com a formalidade de outros momentos altos do calendário. A temporada Resort ou Cruise seguiu a bom ritmo, repetindo-se anualmente, nos meses de maio e junho, entre o lançamento das duas principais coleções de pronto a vestir. Apresentações marcantes em lugares surpreendentes é a fórmula de eleição.