Com bastante frequência ouço maravilhas do nosso país. Dizem que Portugal e os portugueses são acolhedores. Falam da comida saborosa e de locais que surpreendem pela sua autenticidade. Contudo, como bem sabemos, visitar um país não é de longe o mesmo que decidir viver nesse país. Todas as expectativas, sejam elas de foro familiar, profissional ou de qualidade de vida estão condicionadas pelo que deixamos para trás ou o que nos leva a procurar esta mudança.

Não é por isso surpreendente que vejamos cada vez mais famílias internacionais que, antes de tomar qualquer passo, investigam as escolas IB (International Baccalaureate) para colocar os seus filhos. Mesmo quando o que provoca a mudança é um desafio profissional, quase sem excepção este é o primeiro passo, exista ou não apoio por parte de um serviço de relocation. Só depois, com essa vaga assegurada, é que se coloca o resto do processo em andamento. Apesar da mudança em si ser algo de cariz marcadamente emocional, há um aspeto prático e talvez muito mais racional de planificação antecipada que tem de funcionar para que todas as peças do puzzle encaixem no momento certo, com o mínimo de atrito possível e sem o aparecimento de consequências nefastas.

O elemento emocional no seio de uma família, e mesmo a título individual, é das vertentes mais importantes para se minimizar qualquer reação negativa, especialmente nos filhos mais jovens. Há que reforçar a união e fomentar a vontade de conhecer uma nova cultura e fazer novos amigos, praticar novos hobbies ou fomentar os actuais, aproveitar a proximidade à praia (costuma ser O Argumento) – tudo o que sirva para motivar a mudança e colmatar o sentimento de ausência das amizades que já estão desenvolvidas.

Se antes Portugal podia parecer um destino longe do pensamento para acolher profissionais, temos de reconhecer que a Web Summit e as excelentes condições de banda larga e infraestruturas de auto-estradas veio potenciar a chegada dos nómadas digitais (jovens), que agora se vê reforçada com os Corporate Nomads (com mais experiência), que podem desempenhar as suas funções de forma remota porque se provou que, na prática, resulta.

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O que estamos a constatar é um aumento de profissionais que, por vezes de forma espontânea, propõem às empresas mudar de país e continuar a desempenhar as mesmas funções remotamente, com o intuito de melhorar a sua Qualidade de Vida. O elo que faltava, que antes não existia e que o SARS-CoV-2 veio expor, foi a abordagem que as empresas passaram a ter em relação à localização dos profissionais num escritório ou mesmo noutro país.

Como base, temos um País que tem argumentos de sobra para os convencer: a qualidade de vida. Contudo não deixa de haver um aspeto fundamental neste processo todo: uma nova realidade com uma cultura própria.

Tendo em conta a multiculturalidade de quem procura o nosso país, há que procurar entender bem a realidade da origem bem como os desafios, objectivos e desejos para saber criar dentro do possível o que é verdadeiramente importante naquele momento da sua vida pessoal, familiar ou profissional. É óbvio que cada país tem uma cultura diferente, mas cada pessoa/agregado familiar também tem a sua própria história e, mais importante, expectativas. Muitas vezes é mais relevante o momento da vida, as pessoas que nos acompanham ou o processo de instalação do que pensar que qualquer pessoa seria feliz nas Maldivas só por ser um destino paradisíaco.

Tendo contacto com cidadãos estrangeiros diariamente, ainda ouço com surpresa a preocupação com a proximidade do centro de Lisboa, quando Cascais, que se encontra a 40 minutos da capital, é mais central do que o Barrio de Osuna em Madrid, ou mesmo o aeroporto, que fica a uns meros 20 a 30 minutos de distância, por contraste às 1h30 a 2 horas que se verifica em praticamente qualquer outra capital europeia. Aliás é justamente nesse intervalo de 20 a 40 minutos de distância que, na capital, conseguimos encontrar praia.

Se olharmos a outras realidades, como o Brasil, do outro lado do oceano, a segurança que para nós é tão normal ganha uma importância extrema. Isto porque o conceito de condomínio com segurança é algo essencial para que os cidadãos brasileiros não se sintam vulneráveis.

Por mais exemplos que possa dar, o cerne da questão é verdadeiramente escutar para saber ultrapassar os desafios que vão seguramente surgir. Há que saber reconhecer o que é verdadeiramente importante e relevante para poder chegar ao melhor resultado possível. Em todas as diferentes realidades é possível encontrar equivalências ou até melhorias. Em toda a minha experiência como expat, foi sempre esse o meu foco.

Quanto às pedras que surgirão no caminho, recorrendo ao poeta mais multifacetado na cultura Portuguesa, Fernando Pessoa, “Pouca coisa é necessária para transformar inteiramente uma vida: Amor no coração e sorriso nos lábios”. Tão importante como o aspecto prático de uma mudança é de facto a alma e dedicação que se coloca na forma de acolher.

O autor escreve segundo o antigo Acordo Ortográfico