Há três coisas para perceber sobre o “activismo” climático. A primeira, creio que já todos perceberam: num sistema que negue às pessoas o direito de falarem, de se manifestarem ou de votarem em liberdade, compreende-se a violação da lei; mas numa democracia liberal? Num regime em que quem tem uma ideia a pode exprimir em público, manifestar-se por ela, eleger representantes nos órgãos de soberania para defender essa ideia, e assim mudar as políticas públicas, para quê sentar-se na estrada ou atirar tinta? Das duas, uma: ou os activistas não acreditam na democracia, ou não acreditam nas suas próprias ideias, isto é, na força dos seus argumentos para persuadir os outros. Mas então, em que acreditam?

Dir-me-ão: acreditam que o mundo vai acabar, e daí o desespero das suas acções: não têm tempo para debater com quem não pensa como eles. Mas ouvindo os activistas climáticos, quando eles se dignam a falar em vez de parar o trânsito, percebe-se que a questão não é eles acreditarem que o mundo pode acabar: é eles acreditarem que o mundo deve acabar. O mundo que deve acabar é aquele em que as políticas são determinadas pela maioria, e grande parte das decisões compete aos indivíduos e às famílias, porque é isso que impede a proibição imediata dos combustíveis fósseis. E como a democracia liberal e a economia de mercado foram as formas políticas e sociais que deram à humanidade mais liberdade e mais prosperidade, é natural que os activistas não esperem convencer as pessoas a mudar, a não ser pela força: agora atirando tinta e sentando-se na estrada, mais tarde talvez de outra maneira.

Esta é a segunda coisa que interessa compreender a propósito do activismo climático: trata-se de movimentos que, a pretexto do clima, atacam o que as extremas-esquerdas sempre atacaram: a democracia liberal e a economia de mercado. O clima é o que menos lhes importa. Durante a Guerra Fria, agitavam-se com igual veemência em nome da “paz” e do “desarmamento”. Também então o mundo ia acabar, a menos que as democracias ocidentais renunciassem a defender-se da expansão soviética. São sempre os mesmos, através de gerações diferentes: aqueles que acham que a perfeição só pode ser dada ao mundo pelo poder absoluto de uns poucos de iluminados, e nunca pelas massas ignorantes a fazerem livremente as suas escolhas.

E chegamos assim à terceira coisa. Se o objectivo dos activistas é subverter a democracia liberal e a economia de mercado, como o velho comunismo, a quem servem, agora que esse comunismo faliu? Para perceber isso, temos de deixar de olhar para quem atira tinta, e olhar para quem leva com a tinta: o poder estabelecido. Desde a década de 1980, que as esquerdas socialistas tentam recentrar a seu favor o debate político, que então perderam a favor das direitas liberais. Para isso, aproveitaram todas as “crises”: a financeira em 2008, a epidémica em 2020, a climática agora. A solução, seja o problema a banca, um vírus ou a temperatura, é sempre a mesma: mais Estado, mais poder para os governos decidirem em vez dos cidadãos. Não digo que essas esquerdas queiram, como os radicais do activismo, acabar com a democracia liberal e a economia de mercado. Mas querem mais poder, como durante o “consenso social democrata” do pós-guerra, no tempo das nacionalizações e das “políticas industriais”. Os activistas servem-lhes para manterem no horizonte público, em modo apocalíptico, os temas com que esperam justificar a expansão do Estado e a diminuição dos direitos individuais. Por isso, quando o ministro limpa calmamente a tinta da gravata, não é o estoicismo que lhe dita a calma, mas a satisfação de ver os idiotas úteis a cumprir o seu papel.

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