Acaba de acontecer na Suécia o que aconteceu em Portugal, em 2015, quando o PSD de Passos Coelho ganhou as eleições. O PS de António Costa firmou uma aliança governativa, ou uma «posição conjunta», que veio a ser conhecida por geringonça por graça de Pulido Valente, de centro esquerda-esquerda radical com o apoio do PCP, do Bloco e do PEV.

Na Suécia, as mesmíssimas circunstâncias obrigam agora a que o partido mais votado, o PSD, com 107 mandatos, não forme governo. Há uma aliança governativa ou «posição conjunta» entre a direita etno-nacionalista, ou nativista, partido dos Democratas Suecos, com 73 mandatos, os Moderados, com 68, os Democratas Cristãos com 19, e os Liberais com 16. A Esquerda, o Centro e os Verdes somaram 66 mandatos o que, por muito pouco, não chega para uma maioria com o PSD.

O crescimento do partido dos Democratas Suecos (DS), ao contrário do que afirma alguma comunicação social, não é surpreendente. Os DS são a segunda maior força partidária no país. É um partido nativista, nacionalista e populista. Com os seus congéneres populistas europeus partilha as políticas anti-imigração, o anti-globalismo e o proteccionismo. E tentou desde 2002, com sucesso, demarcar-se da Nova Democracia e do seu discurso e propostas – o mesmo fez Marine Le Pen quando se distanciou das propostas anteriores oferecendo a Zemmour a controvérsia enquanto ela própria se normalizava.

O crescimento da direita radical na Suécia foi mais lento do que nos países seus vizinhos. De acordo com estudos sobre o fim da excepcionalidade sueca no que à extrema-direita diz respeito, essa manteve-se enquanto as estruturas socio-económicas determinaram a agenda política. Isso identificava os eleitores com o PSD e impedia a sua radicalização e a polarização: não se colocavam, como nas restantes democracias ocidentais, as situações classicamente exploradas pela extrema direita ou pela extrema esquerda, de os trabalhadores contra o capital ou a desaprovação do grau de envolvimento estatal na economia. Também as políticas socio-culturais que favorecem a radicalização e a polarização, pois tendem a ser divisoras nas suas questões como o aborto, a religião, a segurança ou a imigração, tinham pouca relevância.

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Mais, a Suécia caracterizava-se por um voto de classe, isto é, as pessoas da mesma classe social votavam da mesma maneira – a avaliação é estatística – como consequência da partilha dos mesmos interesses e preocupações. Ora, este voto reduziu-se de forma significativa nas últimas décadas. Não apenas pelas grandes alterações sociais, modernização e globalização da economia, e mesmo pelo aumento do grau de escolaridade, mas também pela polarização político-partidária que, como nas restantes democracias ocidentais, vai erodindo o centro esquerda e o centro-direita. Em simultâneo, à medida em que os partidos de matriz social democrata se aproximam da classe média e do centro, tornam-se indistintos, por cá é o infame «centrão», e alienam os votos de classe – dos operários fabris, por exemplo. A convergência política ao centro favorece o crescimento dos partidos extremistas. De igual forma, as dependências internacionalmente acordadas reduzem o reportório partidário e a liberdade de decisão dos partidos no arco do poder. Mais significativa, no entanto, é a alteração das agendas políticas da economia para as questões socio-culturais.

Em 2002 os Democratas Suecos tiveram 1,4% dos votos. Duplicando a partir daí os votos em cada eleição até 2014 quando ganharam 12,9% do eleitorado. Nesta altura tornou-se evidente o que aconteceria na Suécia e esta eleição confirmou. Pior. Sabemos o que está a acontecer na Europa.

A Nouvelle Droite e o grupo G.R.E.C.E ofereceram o substracto teórico e académico para o florescimento de mil movimentos nacionalistas e populistas nas democracias ocidentais. Na verdade, ofereceram uma mundivisão sofisticada, porém fascizante, e amplamente divulgada na última década a partir da editora Arktos, propriedade do sueco Daniel Friberg, agora sediada em Budapeste, e cujas publicações são a biblioteca fundamental da direita radical europeia e da alt-right norte-americana. Ou como preferem dizer de si mesmos, da Nova Direita Europeia, e cuja internacionalização não é acidental e cujas ligações são um programa de pensamento e acção. A Arktos está a crescer tanto quanto a extrema-direita e para além da editora, dos podcasts, das conferências.

A extrema-direita está em marcha.

PS: recomendo a leitura de The Oxford Handbook of Sweedish Politics, de Jon Pierre

A autora escreve segundo a antiga ortografia