De acordo com os dados da GLOBOCAN 2022, em Portugal foram diagnosticados 682 novos casos de cancro do ovário em 2022, sendo o 11.º tipo de cancro em termos de taxa de incidência no sexo feminino. No mesmo ano foi responsável por 472 mortes, colocando-o como o oitavo cancro mais mortal no sexo feminino. Mundialmente, ocupa o oitavo lugar quer em taxa de incidência, quer em taxa de mortalidade.

Relativamente às neoplasias malignas do trato ginecológico, o cancro do ovário corresponde a cerca de 30%. Nas últimas décadas a sua taxa de incidência tem vindo a aumentar, em especial nos países ocidentais. Em Portugal, a GLOBOCAN estima que entre 2022 e 2045 a taxa de incidência do cancro do ovário aumente 9,5% e a sua mortalidade 19,3%, acima do aumento das taxas de incidência e mortalidade na Europa.

O cancro do ovário tem um impacto económico importante, não só para os serviços de saúde, como para a sociedade em geral. O consumo de recursos de saúde com o tratamento e seguimento das doentes, as perdas de produtividade associadas à morbilidade e mortalidade, o apoio social e/ou de cuidadores informais necessário em estádios avançados, tem associados custos diretos, mas também custos de oportunidade que devem ser tomados em consideração da perspetiva da sociedade. Um estudo recente estimou que o cancro do ovário terá um custo económico mundial de 438 mil milhões de euros (a preços contantes de 2017) de 2020 a 2050, com um peso de 0,011% no PIB no mesmo período de tempo, o que corresponde a uma perda per capita de 49,6 euros a preços de 2017. Em Portugal, este estudo estima um custo de 34.575 milhões de euros (a preços constantes de 2017), com um peso de 0,408% no PIB entre 2020 e 2050 e uma perda per capita de 3.561 euros a preços de 2017, para todos os tipos de cancro. Com base nos dados disponíveis naqueles estudos, é possível estimar que o cancro do ovário em Portugal de 2020 a 2050 terá um custo de 712 milhões de euros (a preços de 2017) e uma perda per capita de 73,3 dólares. Adicionalmente, é importante referir que, tanto o tratamento, como a carga da doença, têm um impacto muito significativo na qualidade de vida relacionada com a saúde (QVRS). As mulheres afetadas enfrentam vários desafios, incluindo alterações na função física e a nível psicológico, problemas sociais e disfunções sexuais, entre outras. Vários estudos demonstraram que todos estes efeitos provocam uma diminuição elevada na sua QVRS, com o consequente impacto no seu bem-estar. Este impacto negativo na QVRS é transversal à generalidade das mulheres, verificando-se tanto em países em vias de desenvolvimento, como em países desenvolvidos e constituindo também um custo para a doente e para a sociedade.

Considerando a enfase crescente nos cuidados de saúde centrados no doente, a QVRS, avaliada através de medidas de resultados reportados pelos doentes (os chamados Patient Reported Outcome Measures – PROMs), tem vindo a tornar-se cada vez mais importante na avaliação das intervenções terapêuticas, pelo que têm vindo a ser publicados vários estudos que avaliam o impacto da QVRS em doentes com cancro do ovário. Em Portugal, existe pouca evidência sobre esta temática, pelo que são necessários mais estudos para avaliar a QVRS das doentes com cancro do ovário para se perceber com maior exatidão quais os fatores que têm maior impacto na QVRS.

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No cancro do ovário, devido à ausência de sintomas e sinais específicos e de qualquer método de rastreio ou diagnóstico precoce, cerca de 70 a 80% dos casos são diagnosticados em estádios avançados. Esta condição conduz a diagnósticos tardios, o que se traduz em tratamentos mais caros e menos eficazes quando comparado com o que sucede nos casos em que se efetua um diagnóstico precoce.

De acordo com as várias sociedades científicas nacionais e internacionais, nomeadamente a Sociedade Portuguesa de Ginecologia e a Sociedade Europeia de Ginecologia, qualquer lesão suspeita de malignidade do ovário deve ser referenciada a um Centro de Referência, onde a doente possa ter acesso aos melhores cuidados que garantam o maior tempo livre de doença e a maior sobrevivência possíveis. A complexidade elevada da terapêutica, em particular do tratamento cirúrgico, obriga a equipas altamente treinadas e multidisciplinares, condição que garante um tratamento mais eficiente para a doente e para as estruturas de saúde, traduzindo-se em mais tempo de vida e qualidade de vida, assim como menos custos económicos.

Infelizmente em Portugal ainda não foram estabelecidos Centros de Referência para o tratamento do cancro do ovário, os quais deverão ser certificados, numa perspetiva ideal, por entidades internacionais. No entanto, existem estudos que demonstram que os cirurgiões e os hospitais que efetuam um elevado volume de procedimentos têm sido frequentemente associados a melhores resultados para os doentes em comparação com os seus homólogos de baixo volume. Esta associação é mais forte em procedimentos de alto risco e tecnicamente complexos, como é o caso do tratamento cirúrgico do cancro do ovário. Os centros de referência para o cancro do ovário têm vindo a ser implementados com êxito em algumas regiões da Europa, com resultados promissores para as doentes, em especial em estádios avançados.