Foi há três anos. Um incêndio violento deflagrou na Catedral de Notre-dame de Paris, a 19 de Abril de 2019. A agulha da catedral e o telhado desabaram e o interior e alguns dos artefactos que albergava foram gravemente danificados. Todavia, uma cruz resistiu (ainda e sempre) ao invasor ardente. A imagem da Cruz dourada, que sobreviveu a altas temperaturas no altar de Notre Dame, correu mundo. Nesta Semana Santa essa Cruz ilumina uma verdade incontornável: a vida surge da morte. A Cruz sintetiza a realidade de que os valores Cristãos são o cerne da nossa cultura Ocidental. E a nossa reacção natural deveria ser motivo de celebração e não de decepção. Daí que qualquer ataque aos símbolos Cristãos e seus locais de culto seja um ataque aos valores Cristãos.

Hoje, muitas das ideias que parecem humanistas não passam de delírios egoístas que só desejam propalar caprichos de grupúsculos sociais. E torna-se irónico que a estrutura social que permite a ateus-agnósticos-esquerdistas-progressistas veicular a sua mensagem de ódio a ideais Cristãos vem precisamente do Cristianismo. Os que zombam da Cruz de Cristo foram formados no caldo cultural Cristão. E ostentam sinais claros de que foram formados nesse ambiente transformador. O Deus que atacam é responsável pela liberdade que revelam na sua atitude. A pretensão humanista de que o ateísmo e a preocupação pela vida humana andam de mãos dadas não passa disso mesmo: uma pretensão oca. Sei que o humanista (leia-se ateus, progressistas, etc) dirá que a ciência social (que animal aberrante é esse?) fundamenta a sua crença. Todavia, isso não passa de mitologia social. As fontes dos valores do humanismo não estão nem na razão, nem numa forma de pensar científica, mas sim no seu passado. E concretamente na história duma “seita” obscura que se inspirou numa cruz obscura onde morreu um singelo carpinteiro que viria a “alvoroçar o mundo” (Actos 17.6). Por muito que doa, é essa a origem das ideias humanistas.

A Cruz e o Humanismo

A Cruz é o centro da narrativa da Humanidade. A crucificação na opinião geral não era um mero castigo. Era um acto dissuasivo reservado para os mais vis criminosos. Séneca descrevia este horror: “ser pendurado nu… numa longa agonia… vendo o corpo inchar com feios vergões no peito e nos ombros”. E a sublime estranheza que emerge é de que o meigo Nazareno pendurado na Cruz é Deus. Atentemos no facto de que ser divino nos primeiros séculos da Era Cristã era reservado aos vitoriosos, heróis e reis. A medida de poder, era a capacidade de inflingir dor, não a humildade de aceitar a tortura. Mas é pela dor que Cristo faz o seu percurso vitorioso. Foi um “escândalo”. Mas escândalo sublime! Porque nesse facto, o Cristianismo revelou ao mundo que o Servo sofredor é fonte de força e poder. Nietzsche viu isso e disse que “por causa do Cristianismo, a medida da compaixão do homem pelos fracos e sofredores, transforma-se na forma como ele mede a altivez da sua alma” (tradução livre). Os instintos Cristãos de Nietzsche estavam intactos. Curiosamente, numa situação semelhante, Richard Dawkins – biólogo ateu evolucionista – confessou no ano passado que “o repicar dos sinos da Catedral de Winchester era mais belo do que o som agressivo do Allahu Akhbar (chamado à oração dos Islamitas). Ou será que é a minha educação cultural a falar mais alto?”. Sumariamente, ele foi classificado pelos progressistas de serviço, de islamofóbico e o resto é o blá blá blá habitual. Entretanto, fica a nota de que Dawkins – o ateu – tem os instintos de alguém educado numa civilização Cristã. E isso não surge magicamente. São os valores Cristãos a entrar em acção. A acusação de que Cristianismo é patriarcal e repressivo deriva dum ambiente que forjou esses valores de análise e instrospecção que são em si totalmente Cristãos.

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A Cruz e o Cristianismo

É verdade que uma sobre-exposição aos símbolos Cristãos criou em nós uma dura carapaça que tanto Nietzcshe como Dawkins reconheceram, diante duma experiência do Belo (outro valor Cristão). Eles perceberam o “escândalo”, a estranheza sublime. A cruz, esse instrumento de tortura imperial, permanece um símbolo de transformação dos valores da Humanidade que perdura na História. “Deus escolheu as coisas fracas deste mundo para confundir as fortes, e as loucas para confundir as sábias” (1 Coríntios 1.27). Que audácia de encontrar num cadáver torcido e derrotado a Glória do Criador do universo! Que coragem que um Deus morto continue a brilhar, imenso e potente, ardendo nos corações mais gélidos. Porque o Cristo ressurrecto não pode ser iludido apenas porque nos recusamos a crer n’Ele. A descrença não o apaga da memória. Aqui reside a estranheza sublime do Cristianismo e da civilização que gerou e dos valores culturais que inspira. O seu poder continua actuante. Ardendo em vidas que carregam no seu coração derretido a imagem dum Deus que se derramou em amor num instrumento de dor.

Gosto da história do Ricardo que era sempre posto de parte pelos colegas de escola. Um dia, durante a Páscoa, a professora para tentar ilustrar a bonita verdade do renascer da natureza e da Ressurreição de Cristo, deu uma caixinha de cartão a todos os alunos. Tinham uma missão: ir para o campo e trazer de volta um símbolo da Páscoa. A goratada foi em alegre algazarra cumprir a tarefa. De volta, colocaram as caixinhas em cima da mesa da professora. Um a uma a professora foi abrindo as caixas. A primeira tinha lá dentro uma borboleta que saiu voando assarapantada. “Que lindo!” – exclamaram as crianças. A caixa seguinte continha um ramo singelo de flores silvestres. “É a natureza a voltar à vida” – dizia a professora, passando a outra caixa. A caixa seguinte estava… vazia. Simplesmente vazia. “Assim não vale” – disse a miudagem – “alguém fez batota”. “É minha” – interveio o Ricardo. “Nunca fazes nada de jeito” – gozaram os colegas. “Eu fiz bem! Está vazia porque o túmulo também está vazio” – explicou o pequeno Ricardo. O silêncio que caiu na sala foi luminoso.

A Cruz e o Progressismo

Por vezes pergunto-me o que fazem os ateus e os progressistas durante a Páscoa? No Natal sabemos. Comem peru engordado no aviário. E na Páscoa? Comem borrego!? Certamente que não! Não podem partilhar do símbolo máximo da Cruz e da Ressurreição de Cristo. Seria, digamos… incoerente! Na Páscoa, quando a Igreja de Cristo celebra o Seu poder sobre a morte, na Cruz, e a esperança duma restauração futura, que fazem os ateus!? O humanismo poderá ajudar para o dia a dia desta existência louca, mas deixa qualquer céptico-ateu-progressista vazio, diante dum túmulo frio. Porque ninguém escapa à realidade da morte.

Nikolai Ivanovitch, editor do Pravda, durante a Revolução Bolchevique, foi um escritor prolífero e conferencista requisitado. Em 1917 durante uma conferência, ele gritava insultos contra a Fé Cristã enquanto apresentava provas e evidências da superioridade do ateísmo. Depois de uma hora a “olhar para as cinzas da Fé”, lançou o repto: Há perguntas? Um velho sobe no palanque e grita a saudação da Igreja Ortodoxa: “Cristo ressuscitou!” Em massa o povo ergue-se: “verdadeiramente ressuscitou!” Aí está! Mas, o céptico pede um sinal. Provas e documentação. Que provas? Que informação? Há mais evidências da Ressurreição de Cristo do que há sobre a vida de Júlio César. Há mais provas sobre a Cruz e a Ressurreição de Cristo do que factos que provem que Alexandre o Grande morreu com 33 anos. Os relatos da Cruz vil e esquálida de Cristo são detalhados e válidos. Esses relatos envolvem os quatro Evangelhos e descrevem na perfeição os processos envolvidos na crucificação. São descrições históricas e não há razão para duvidar da sua veracidade. Até historiadores cépticos distintos como Géza Vermes, afirmam: “A morte de Jesus de Nazaré na Cruz é um facto estabelecido”. Ora, os cépticos são uns ingénuos aceitando milhões de factos minúsculos sobre uma miríade de coisas, sobre as quais existem apenas fios ténues de evidência. Cristo durante a Sua última semana de vida teve uma frase demolidora: “da boca dos pequeninos e crianças de peito tiraste perfeito louvor?” (Mateus 21.16). Mas é claro que os progressistas e os ateus deste mundo, serão “crescidos” demais para louvarem a Deus. Resta-lhes uma alternativa coerente com a sua descrença. Enfiem-se num túmulo frio e inóspito, enquanto os Cristãos festejam. Olhem, o de Cristo está vazio. Não precisa dele. É facto incontestado que os vivos não têm necessidade de túmulos!