“Em Portugal, temos de mudar a forma como avaliamos os acontecimentos internacionais e nos preparamos para defender os nossos interesses permanentes e os nossos valores. Tendemos para uma visão muito estática do mundo, fechada sobre nós, e temos dificuldade em reconhecer padrões de identificação dos factos. A intuição continua a ser a nossa principal ferramenta para reagirmos aos acontecimentos que se vão sucedendo cada vez mais rapidamente. Em especial quando a perplexidade ou a urgência da decisão e da escolha são grandes. Somos o país do «e depois logo se vê». Continuamos a ter uma visão pouco informada e ingénua da política internacional. (…) O nosso horizonte temporal não pode continuar a ser o de semanas ou meses. Temos de pensar de uma forma mais estratégica sobre o nosso destino como comunidade política. Conseguiremos?”
Miguel Monjardino, in “Por onde irá a História”, Fevereiro de 2023

De acordo com o Balanço de Aprovisionamento do INE, o grau de auto aprovisionamento de milho em Portugal, nos últimos cinco anos (dados até 2022), variou entre 23,7% e 27,3%. Por outro lado, as importações portuguesas de milho com proveniência do Brasil aumentaram de 26,9% (558.750 toneladas) do total, em 2021, para 51,8% (1.182.205 toneladas) do total de importações em 2022.

Desde há vários anos que o Brasil consolidou a sua posição como terceiro maior produtor mundial de milho e, recentemente, rivaliza com os Estados Unidos da América como maior exportador mundial. Contudo, os produtores brasileiros de milho desenvolvem a sua atividade com padrões de qualidade e de segurança alimentar e ambiental há muito vedados aos produtores europeus (e portugueses em particular!), a quem é exigido um conjunto de enormes restrições e imposições, sujeitando-os a uma inaceitável e desleal concorrência!

Bem andou o Primeiro Ministro Luís Montenegro, ao declarar, em recente visita à Ovibeja, que “Impomos a nós próprios regras de tal maneira restritivas mas, depois, deixamos que os nossos consumidores possam ter nas prateleiras produtos que vêm de outras geografias onde essas regras não são impostas”, e que “Somos nós que estamos a pagar pelo desrespeito das regras ambientais e a prejudicar a nossa própria saúde, por via das nossas ações. Não faz sentido e é preciso atalhar este problema com coragem no país e na Europa”.

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No entanto, é a afirmação que “Não estamos a defender um protecionismo europeu. Estamos a defender que haja justiça no comércio internacional, regras de compromissos no mercado internacional e uma consciência de equilíbrio” que, apesar das boas intenções, me suscita as maiores dúvidas, pela sua aplicabilidade prática.

Estará o Brasil disposto a acatar as regras e os padrões europeus de segurança e de sustentabilidade, para continuar a exportar milho para a Europa? Tenho as maiores dúvidas! Não faltam ao Brasil oportunidades e mercados alternativos (China!) para o seu agronegócio, sem ter que atender às boas intenções e às exigências das boas práticas europeias.

Estará Portugal consciente deste facto e preparado para reduzir e minimizar o risco da exposição a esta crónica e perigosa dependência? Não o creio! É tempo de deixarmos o «e depois logo se vê»!