Pelo menos sei que tenho uma apoiante relativamente à subida do IUC.” Fernando Medina ainda não tinha conseguido desembaraçar-se da tinta verde que segundos antes lhe tinham atirado para cima e já concluía com a frase que fez rir a plateia: “Pelo menos sei que tenho uma apoiante relativamente à subida do IUC.

Tomemos nota: a plateia riu. O ministro sorriu. Tudo gente gira, não é? Para que esta história acabe de forma perfeita só falta acrescentar que quem interrompeu a intervenção de Fernando Medina na Faculdade de Direito foi de imediato apresentado nas notícias como activista, termo que em Portugal é sinónimo de jovem sonhador, bem intencionado e que precisamente por acumular esses factores positivos – a juventude e as boas intenções – não mede a adequação das suas acções. Não estivesse o protesto no lado bom mediaticamente falando e em vez de activista seria apresentada como mulher aos gritos, o que é substancialmente diferente para efeitos de apreciação.

Outro ponto essencial passa por aquilo que é apresentado como a reacção tolerante dos ministros. Lamento, mas não há aqui tolerância alguma. A reacção de Fernando Medina e do Governo ao que aconteceu naquela sala da Faculdade de Direito, tal como já tinha acontecido aquando do ataque das mesmas ou outras “activistas” ao ministro Duarte Cordeiro, não tem nada a ver com tolerância, antes pelo contrário trata-se de um exercício cínico e autocrático de poder por parte do PS. Afinal, além do poder que as eleições lhes conferem, os socialistas exercem um outro poder não menos importante e nunca sufragado: o de decidir quem é ou não democrata. Que assuntos são ou não populistas. Que actos são intoleráveis na democracia ou pelo contrário apenas uns azougados protestos de jovens bem intencionados… E é esse poder que os socialistas exibem quando, perante os ataques da Climáximo, sorriem como se estivessem perante um convidado efusivo num casamento. Ou quando no campo politicamente oposto agigantam o Chega.

Esta táctica do PS em relação aos que considera seus activistas úteis vai custar-nos caro, muito caro. Em primeiro lugar quem tem de ir trabalhar, apanhar um avião, levar os filhos à escola ou simplesmente quer ir a um museu ou andar na rua em paz e se confronta com as acções destas vestais fanatizadas sente-se tratado como um cidadão de segunda. Para mais, quando Fernando Medina ou Duarte Cordeiro desvalorizam o acto de quem lhes atirou tinta para cima estão também a desvalorizar o impacto que as acções destes activistas têm ou podem vir a ter na vida de cada um e a deixar implícito que existe uma espécie de superioridade moral nesses seus protegidos que os autoriza a fazer sem consequências de maior aquilo  que é interdito aos demais. Uma pergunta acode-me cada vez mais: se um destes protestos acabar em confrontos, o Governo vai culpar quem? Não menos importante, se outros militantes doutras causas e doutras geografias políticas adoptarem tácticas similares à dos activistas climáticos-esquerdistas como vai reagir o Governo? Ou será que o grau de violência permitida é proporcional à pertença de esquerda?

Os socialistas transformaram a sociedade numa espécie de corredor de espelhos em que ora aumenta ora diminui a visão que temos sobre a realidade. Gestor dessa visão desproporcionada, o PS vê o seu poder crescer à custa da erosão do centro, enquanto espaço que tem como denominador comum o respeito pelos outros e a recusa de lógicas revolucionárias em que se procura impor pela força dos protestos aquilo que as maiorias rejeitam.

Por fim, quanto à não apresentação de queixa por parte dos ministros contra as pessoas que os atingiram com tinta, convém fazer o seguinte esclarecimento: os governantes têm de ser capazes de distinguir-se a si mesmos do cargo que desempenham. Se Medina ou Duarte Cordeiro não quisessem apresentar queixa caso fossem agredidos numa discussão privada esse seria um problema deles. Mas acontece que eles foram agredidos enquanto ministros. Logo não só têm o dever de defender o prestígio institucional do cargo que ocupam como não têm o direito de decidir se a agressão foi grave ou não. Por outras palavras, um Governo não é uma loja da Gucci: perante a montra partida da sua loja na avenida da Liberdade, em Lisboa, a Gucci entendeu não apresentar queixa contra as activistas. Discordo dessa opção mas a empresa está no seu legítimo direito de a tomar. O mesmo não se pode dizer dos ministros. Ia escrever que é grave que não tenham percebido isso. Mas talvez seja ainda mais grave: perceberam e porque perceberam protegem os seus activistas úteis.

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