Esporeado pelo Europeísmo Federalista, o velho Iberismo volta a galope. Parece estar com especial genica no norte, onde uma certa burguesia do Porto, representada pelo seu presidente da câmara, acalenta utopias galaico-portuguesas e, em última análise, iberistas.
Posto isto, convém lembrar alguns factos. Portugal nunca anexou a Espanha, como esta nos fez entre 1580 e 1640 e tentou milhentas vezes antes e depois. Portugal jamais deixou passar pelo seu território inimigos da Espanha para a atacarem, como nos aconteceu no tempo de Napoleão e quase ia sucedendo no de Hitler. Portugal não deixou colónias espanholas desprotegidas para serem invadidas por terceiros, como os Filipes fizeram com as possessões portuguesas da Ásia e América, atacadas por holandeses e ingleses. Portugal não ficou a ocupar contra o direito internacional parcelas do território espanhol, como ainda hoje acontece com a nossa Olivença. As empresas portuguesas não entram no mercado vizinho para o monopolizar, formando cartéis ou através do ‘dumping’, como fazem por cá os bancos e muitas estruturas de distribuição espanholas. Os barcos portugueses não invadem as águas territoriais da Espanha com pesca de arrasto que destrói a fauna e flora marítima. Não temos pretensões abusivas sobre ilhas do vizinho, como a Espanha em relação às Desertas que pertencem ao arquipélago da Madeira. Portugal não constrói centrais nucleares perto da fronteira para os efeitos de eventuais desastres irem para o lado de lá. Portugal não retém descaradamente a água dos rios quando ela faz falta, libertando-a quando há cheias.
Este elenco desagradável serve para lembrar que há razões de fundo para dizermos há séculos que ‘de Espanha nem bom vento nem bom casamento’. E que a Espanha constitui na realidade um factor de pressão constante e uma ameaça tácita contra a soberania portuguesa.
Historicamente, a nossa independência baseou-se na expansão marítima, nas possessões ultramarinas e na aliança estratégica com a principal potência atlântica, a Inglaterra. Porém estes activos desapareceram no último meio século. Com a agravante do ingresso na União Europeia, que enfraqueceu as soberanias e o controlo nacional das fronteiras históricas, territoriais e morais.
Neste quadro, é bizarro que uma certa direita portuguesa ataque por sistema o Estado, depositário e garante último da nossa soberania. E ignore ou desdenhe o chefe da Casa Real de Bragança enquanto se prosterna e deleita com Filipe de Borbón. E se compadeça acefalamente das dores centralistas de Madrid perante o emancipalismo da Catalunha, que historicamente nos foi sempre tão conveniente.
Talvez estas misérias se expliquem pelo desaparecimento de uma autêntica elite nacional de direita. A qual hoje em dia é praticamente só massa, que não estuda ou sequer lê, cultivando-se sobretudo pelo ecrã, a internet e as revistas cor-de-rosa. Pondo o Partido no antigo lugar da Pátria e o Clube de Futebol no lugar sagrado da Igreja.
E foi assim que da moral de Aljubarrota e dos Lusíadas chegámos à moral do Mercadona e da Hola.