Qual será o sentimento com que António Costa olha para os protestos dos “coletes amarelos” em França? Depois de quase 4 anos a governar sob uma austeridade disfarçada de reposição de rendimentos, substituindo impostos directos por indirectos, multiplicando as famosas “taxas e taxinhas” e valendo-se de cativações, será possível que o exemplo francês tire os portugueses da letargia habitual e faça eclodir por cá manifestações de dimensões tais que ponham em causa não só a maioria absoluta mas mesmo a vitória nas legislativas de Outubro?
Uma coisa é certa, os “coletes amarelos” franceses são o pior inimigo de Costa neste momento. Os portugueses perceberam ao compararem o que pagam os franceses pelos combustíveis o tamanho da nossa carga fiscal e perguntam-se “se eles ganham mais que nós, pagam menos nos combustíveis e mesmo assim se estão a manifestar desta maneira, o que é que nós estamos a fazer?” Mesmo que não ocorram as mesmas manifestações por cá a verdade é que o mal poderá já estar feito.
Outro dos problemas de Costa são as greves: guardas prisionais, enfermeiros, juízes, médicos, professores, estivadores… o mito que com a esquerda no governo não haveria greves provou ser isso mesmo, um mito. A fábula do “virar da página de austeridade” aumentou a pressão de algumas classes profissionais sobre o Orçamento de Estado, o primeiro-ministro colhe agora o que semeou ao prometer aquilo que manifestamente não pode dar. As falhas do Estado em Pedrogão Grande e Borba e a degradação dos serviços públicos como a saúde e a educação mostraram um país cada vez mais desigual, onde apesar de uma carga fiscal enorme o Estado não garante o mínimo aceitável nos serviços públicos.
A forma como chegou ao poder abriu um precedente, é possível governar sem ser o partido mais votado, a pergunta que se pode fazer, até olhando para o recente exemplo das eleições na Andaluzia, é esta: será possível o PS ganhar as próximas eleições legislativas mas não governar, ou seja, será o bloco PSD/CDS/Aliança/Iniciativa Liberal mais forte que PS/CDU/BE? À primeira vista não será fácil mas pode não ser impossível.
Rui Rio terá nesse cenário um papel fundamental, conseguirá dialogar e entender-se com CDS e outros que porventura consigam assentos no parlamento ou, pelo contrário, dar-se-á por satisfeito por ser vice de Costa? O problema de Rio é este: ao ter feito mais oposição ao governo de Passos Coelho do que ao actual governo de António Costa, tem agora pouca margem para o criticar, provavelmente faria igual ou parecido se estivesse no governo e por isso não aparece como verdadeira alternativa aos olhos do eleitorado.
Quem poderá então liderar o centro-direita? À primeira vista Assunção Cristas e Santana Lopes poderão ter esse papel, o de federar a direita, embora ambos tenham os seus problemas: Santana Lopes já foi primeiro-ministro e a experiência não lhe correu particularmente bem, Cristas foi ministra e o anterior líder do CDS foi vice-primeiro ministro com a pasta da reforma do Estado, se não foram capazes nessa altura de reformar o Estado porque devemos acreditar que agora serão capazes de o fazer?
As recentes trapalhadas para ser simpático, dos deputados com moradas falsas e presenças-fantasma prova que o parlamento precisa de renovação, não apenas de caras mas sobretudo de métodos e de maior transparência. A Iniciativa Liberal resolveu pedir ao Ministério Público que investigue as alegadas fraudes nas votações no parlamento, em comunicado o partido refere: “Não se compreende que se um eleitor tentar votar duas vezes numa votação para a sua Assembleia de Freguesia possa levar até dois anos de prisão, mas que nada aconteça a um deputado que faça o mesmo na Assembleia da República”. É isto que se pede aos novos partidos, que não sejam mais do mesmo e que tenham a capacidade de fiscalizar e implementar novas formas de fazer política.