O CDS tem um problema de sobrevivência. E não temos muito tempo para resolvê-lo. Não se trata de uma opinião singular mas de um juízo consensual: não há ninguém que pense que as coisas nos estão a correr bem.

A consolidação dos novos partidos à direita, que estas eleições presidenciais vieram confirmar, só reforça a velocidade da erosão do CDS: um partido que não marca a agenda, que não se antecipa, que não passa a mensagem, que não se afirma como alternativa, que não é ouvido nem tido em conta, que parece conformado em caminhar para a irrelevância.

Não merecerá a pena atribuir culpas nem continuar debates internos, porque o essencial é falar para fora, não para dentro: só assim podemos somar e voltar a crescer.

Mas é urgente, isso sim, saber o que temos de fazer para inverter este velocíssimo trajecto para o desaparecimento. Porque o país perde muito se o CDS desaparecer.

O CDS foi essencial para a desmilitarização do regime, para a desestatização da economia, para o fim do imposto sucessório, para a estruturação do sector social, para a definição de políticas de família, para a reforma do arrendamento, para a profissionalização das Forças Armadas, para a afirmação de uma agricultura empresarial, para a redução do IRC, para o incentivo às exportações dinâmicas ou para as políticas de turismo.

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Em tudo isso o CDS deixou a sua marca, a sua inspiração: uma visão do Mundo que tem a Pessoa antes do Estado, que tem a família como célula essencial, que acredita na iniciativa de cada um de nós e que forja uma economia social de mercado.

Não podemos deixar que esse legado desapareça, não podemos permitir que esse trajecto tenha um termo, não podemos tolerar que o empenho e o esforço dos milhares de militantes e dirigentes do CDS se esfume.

O que fazer, então, num quadro de concorrência partidária, no meio de uma pandemia, e à beira de uma enorme crise que atirará milhares de famílias e empresas para situações de enorme vulnerabilidade?

O futuro prepara-se agora. O CDS tem de focar-se em duas coisas essenciais: como pôr a economia a crescer, criando riqueza para famílias e empresas; e como fazê-lo sem deixar ninguém para trás, apoiando quem precisa.

Um país só está melhor quando está melhor para todos, um país só está melhor quando cria oportunidades para todos, seja qual for o seu contexto de nascimento. E essa é, do meu ponto de vista, a razão de ser do CDS, o nosso propósito político.

Essa mensagem é mais oportuna do que nunca no preciso momento em que o PS descuida a escola pública, em que não consegue agilizar o SNS, em que se mostra incapaz de reforçar a competitividade da economia, em que parece indiferente ou acomodado ao nosso definhar – e que nesta pandemia mostrou não saber planear para evitar o pior, limitando-se a esperar o melhor sem o preparar.

O PS não é bom a resolver problemas e os aliados que encontrou e escolheu desconhecem o funcionamento da economia. É possível fazer diferente. Os outros países conseguem, nós também.

É nisso, e só nisso, que o CDS tem de concentrar-se, focar-se. Foi sempre essa a minha opinião. Tudo o mais é distracção, tudo o mais serve o propósito do radicalismo e do populismo, tudo o mais deixa as pessoas sem partido que lhes ofereça respostas.

Porque é aí que está o eleitorado órfão: o eleitorado moderado, sensato, reformista, que teme experimentalismos, que quer liberdade e segurança, que durante décadas pagou os seus impostos e que agora não vê o retorno devido num dos quadros económicos e sociais mais dramáticos dos últimos anos.

É esse eleitorado que está à procura de alternativas e não encontra. É por isso que o PS resiste nas sondagens mesmo quando tudo começa a desmoronar-se: porque a alternativa parece não surgir, criando uma sensação de vazio. É no espaço político que o CDS sempre quis ocupar que estão as respostas para os principais desafios do país.

Deveria, por isso, ser o CDS a oferecer essa alternativa com garra, com novidade, com experiência, com ambição, com capacidade de comunicação, com energia, virado para fora, aberto ao Mundo, percebendo a mensagem das novas gerações e de todos aqueles que se sentem excluídos das preocupações dos políticos e que exigem – e merecem – respostas concretas, racionais, credíveis e humanistas aos seus problemas e aspirações.

Temos de deixar de falar para dentro, de ter medo do que nos dizem os jovens, de lidar mal com a contemporaneidade: temos de actualizar a nossa mensagem tendo em conta o que país precisa e quer ver debatido num tempo de emergência, a que se seguirá uma grande urgência na recuperação.

O CDS tem de ser o primeiro a dar resposta, o primeiro a propor, o primeiro a falar, o primeiro a marcar a agenda, o primeiro a apresentar equipa credível, o primeiro a saber comunicar, o primeiro a saber desafiar, o primeiro a deixar claro que o futuro de Portugal, que a saída da crise, que a competitividade da economia e que a criação de oportunidades para todos, dependem de um modelo de desenvolvimento assente na força das famílias e das empresas.

Nada disto é fácil, mas tudo isto é urgente. Não sendo fácil, é possível.

O CDS tem de aparecer com nova força, com protagonistas a quem o país reconhece competência e ambição, com capacidade de liderança e agregação, ou corre o risco de confirmar o que muitos já dão por adquirido: a nossa irrelevância.

Sucede que diariamente se confirma que a actual direcção do CDS não foi capaz de liderar esse projecto e essa estratégia, independentemente das boas intenções.

A crise de sobrevivência que o CDS hoje atravessa não conseguirá ser resolvida com esta direcção. É claro, e por demais evidente, que esta direcção tem total legitimidade para continuar em funções, tendo ganho um Congresso.

Mas é para mim claro e evidente que daqui a um ano, quando o seu mandato terminar, será demasiado tarde para reagir, com os partidos emergentes a consolidar-se cheios de entusiasmo e o CDS a decair projectando uma imagem de erosão.

Daqui a um ano, será tarde demais. Se for já, ainda vamos a tempo de autárquicas, ainda vamos a tempo de projectar uma nova força.

Portanto, o CDS tem de tomar uma decisão: quer mudar de caminho enquanto é tempo, e portanto mudar de direcção; ou quer seguir o caminho até aqui, mantendo tudo como está?

As duas opções são legítimas. Mas quem preferir tardar um ano estará a dizer aos portugueses que o CDS não atravessa problema de maior, que o risco não é gravíssimo, que estamos num caminho aceitável, que esta vertigem para a irrelevância é uma invenção ou uma ilusão.

É por isso, e neste contexto, que proponho ao partido realização de um Conselho Nacional urgente que discuta se deve devolver a palavra aos militantes através de um congresso electivo, se necessário em formato digital como há dias a Democracia Cristã alemã organizou. Em poucas semanas será possível fazer esse congresso, se o Conselho Nacional reunir já e assim o deliberar.

É esta a minha proposta, porque temos muito pouco tempo. Este meu apelo de mudança, e de mudança a tempo de podermos reagir e vencer, é um dever de consciência.

E é um apelo à consciência independente de cada um, de cada militante, sem facções, sem tribos, sem segmentos, sem revanchismo, sem tendências – de olhos postos no futuro, aberto a todos os que podem contribuir para dar uma nova força ao CDS neste derradeiro momento e que sentem, na consciência da sua militância, que precisamos mesmo de mudar.

Ainda vamos a tempo.