O Banco de Portugal pediu esta terça-feira uma solução “sistémica” que ajude a banca portuguesa, em base voluntária, a “libertar-se dos ativos não geradores de rendimento”, incluindo os empréstimos em risco que são um fardo para o capital e para a atividade das instituições bancárias. “É fundamental que os bancos se possam libertar destes ativos”, disse Carlos Costa, pedindo que se use o modelo italiano como “protótipo” e que se peça um regime de exceção às autoridades europeias semelhante ao que tiveram os bancos do norte da Europa em 2008 e 2009 (após a crise do subprime norte-americano), isto para evitar que as ajudas públicas inerentes obriguem à resolução de bancos.

As declarações foram proferidas numa conferência organizada pela Associação Portuguesa de Bancos (APB) e pela TVI.

Carlos Costa diz que os desafios da banca portuguesa dizem respeito, sobretudo, à questão da “rentabilidade“. É preciso “gerar capital e atrair capital para resolver problemas pendentes” e “para fazer face aos novos requisitos de capital no quadro europeu”. Neste âmbito, “não é possível resolver a questão dos bancos portugueses sem ter consciência de que há um problema sistémico – ativos não produtivos, que não geram rendimento, ativos imobiliários e ativos em risco”.

É fundamental que os bancos se possam libertar destes ativos”, diz Carlos Costa. A questão é “a que preço?“, perguntou o governador do Banco de Portugal, lembrando que extrair esses ativos dos bancos irá gerar “necessidades de capital adicionais“. O governador do Banco de Portugal diz que a solução pode passar por “uma construção idêntica à que foi feita noutros países, baseada num jogo de garantias e contragarantias que minimizem os custos”.

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“Mas não basta”, diz Carlos Costa. “Os bancos não têm capacidade de atrair capital para compensar” essa extração de ativos problemáticos. Daí que o modelo italiano do Atlanta possa servir como “protótipo”. “Não se consegue resolver banco a banco”, diz o governador do Banco de Portugal, reconhecendo que se poderá criar “um problema de ajuda pública, o que levaria a processos de resolução que seriam desestabilizadores” para a banca portuguesa.

O governador do Banco de Portugal insiste, contudo, que se crie um sistema de “titularização que mitigue a perda de capital associada“. A este propósito, Carlos Costa lembra que em 2008 e 2009 houve um regime de exceção (waiver) da política de ajudas públicas da UE que permitiu ajudar os bancos do norte da Europa a libertarem-se da sua exposição ao mercado subprime norte-americano.

Carlos Costa indicou que teria sido importante fazer um “banco mau” deste género na altura do resgate da troika mas isso foi impossível porque levaria a uma subida dos níveis de dívida pública para níveis insustentáveis. A opção passou, portanto, pela digestão gradual dos problemas, diz Carlos Costa, que confessou invejar a situação do seu colega irlandês [na Irlanda e em Espanha houve programas deste tipo].

Se for negociado com as autoridades europeias esse waiver, isso permitirá “intervir sem encostar os bancos ao mecanismo perigoso da resolução“, diz Carlos Costa, lembrando que, na altura, os bancos do sul da Europa não tiveram problemas (em 2008 e 2009) porque tinham de ir ao mercado buscar poupança (dos outros), não o contrário.

Importante para a banca nacional é, também, diz Carlos Costa, que se continue a trabalhar na modernização do modelo de negócio da banca e que haja um compromisso do Estado português para garantir que os chamados ativos impostos diferidos (DTA) se cristalizem como ativos que contem para o capital regulatório. Esses ativos, que estão relacionados com a capacidade de descontar impostos em lucros futuros graças a prejuízos passados, são um “elemento importante nos balanços dos bancos”. “Trata-se de um elemento intangível – não pode ser titulado – mas é importante que o soberano torne tangíveis e permanentes estes ativos, de forma que estes possam integrar o capital – caso contrário este capital irá desaparecer em termos regulatórios, o que criaria uma pressão muito grande sobre o sistema financeiro português”.