Boavista Footballers. Fundado no primeiro dia de Agosto 1903, o primeiro equipamento é todo preto. Oito anos depois, em 1911, os portugueses tomam conta do clube e formam o Boavista Futebol Clube. A cor das camisolas mantém-se, a dos calções muda para branco. No início dos anos 20, mais umas alterações estéticas com as riscais verticais pretas e brancas mais calção preto. Falta ainda qualquer coisa, não falta? Em 1928, o Boavista joga com riscas verticais vermelhas, brancas e azuis, um calção preto mais meias às riscas horizontais brancas e pretas. A mudança é mal recebida pelos adeptos e também pela imprensa. È então que o presidente Artur Oliveira Valença vai a França e regressa com a proposta de um equipamento revolucionário, que iria mudar a vida do clube e até do país. Eis o Boavista de xadrez. Qual o clube convidado para a apresentação oficial? O Benfica, pois claro. Com toda a pompa e circunstância, o Boavista goleia 4-0 na tarde de 29 Janeiro 1933 e inicia um braço-de-ferro futebolístico com o Benfica. Sem fim à vista, sobretudo após a reviravolta deste sábado à tarde.

Campeão em título, à procura do penta, o Benfica apresenta-se com uma novidade no onze, chamada Rúben Dias, um jovem central de 20 anos da equipa B. È ele o companheiro do capitão Luisão. De resto, tudo na mesma: em equipa que perde (vs CSKA Moscovo, 2-1 na 3.ª feira, para a Liga dos Campeões), não se mexe. O Boavista mantém o 11 da última jornada, embora tenha mudado de treinador a meio da semana (sai Miguel Leal, entra Jorge Simão). O início de jogo é algo enfadonho e só o golo de Jonas acorda a malta. Bola bem ganha por Luisão no meio-campo, passe para Pizzi. Depois, uma série de tabelinhas bem sucedidas entre Seferovic, Pizzi e Zivkovic. O cruzamento do sérvio é bom, a desmarcação de Jonas é melhor ainda. Do cabeceamento nem se fala, 1-0. Sem saber ler nem escrever, o Benfica espanta a ressaca europeia e vê-se na confortável posição de vencedor.

O Boavista reage com energia. Só isso. Varela raramente é incomodado. Luisão idem idem, Rúben Dias aspas aspas. Muita parra, pouca uva. Honra lhe seja feita, a pressão do Boavista é constante e o Benfica simplesmente não sai do seu meio-campo. Às tantas, a estatística das faltas é impressionante: zero para o Boavista, cinco para o Benfica. De repente, 6-0 por Jonas. No quadradinho seguinte, 7-0 por Salvio. E, logo a seguir, 8-0 por Pizzi. O Benfica joga mal sem bola, está mal habituado. E o Boavista nem aproveita essa desorientação. A partir da meia-hora, o Benfica cresce e começa a dar trabalho a Vagner. O guarda-redes (‘tadito, é o único a jogar sem a camisola do xadrez) segura o 1-0 em três ocasiões provocadas por Jonas, Zivkovic e Pizzi. Até ao intervalo, nada de nada.

Para a segunda parte, Jorge Simão faz entrar David Simão para o lugar de Gilson e o Boavista entra cheio de força, disposto a dar a volta. Luisão cede canto antes do primeiro minuto e dá-se o enésimo craccccc de Salvio. O argentino lesiona-se e é substituído por Rafa. Cinco minutos depois, 1-1 de Renato Santos. O lance é confuso até dizer chega, cheio de air balls. O único benfiquista a cabecear é Jonas, curiosamente. Renato vê o momento de arrancar para o golo e fura a defesa benfiquista antes de bater Varela, com um remate cruzado.

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Muito bem, empate. E agora? É um ver-se-te-avias porque tanto Boavista como Benfica querem muito muito muito ganhar. Não há encolhimentos nem perdas de tempo, a bola está sempre a andar solta pelo campo. Se o Benfica ameaça Vagner, o Boavista descobre o caminho para a baliza de Varela. É bonito, assim. Sem amarras nem princípios defensivos de todo. Ganha o futebol, cresce o ânimo. O Benfica é mais perigoso, ainda e sempre, através do inevitável Jonas. Só que Vagner está atento. Os cantos sucedem-se uns atrás dos outros e o Benfica cria zero oportunidades. Zero mesmo. É uma autêntica nulidade em bolas paradas. Já o Boavista. Bom, não nos precipitemos a desvendar o final da trama.

O Benfica mexe e entra Jiménez para o lugar de Seferovic. Como é seu apanágio, o mexicano entra a abrir. No primeiro minuto, serve Jonas para um remate à guarda de Vagner. No segundo, isola-se pela direita e atira ao primeiro poste para outra defesa de Vagner. Ainda há um passe mágico de Pizzi para uma bela receção de André Almeida. Vale o corte in extremis de Raphael Rossi para canto. Mais um. E outro sem perigo algum. O Boavista agarra-se à bola e passeia-se no meio-campo contrário, só para desenjoar. Felipe Augusto faz falta sobre Bulos e é livre direto. Fábio Espinho, lembra-se dele? Não? Pois, é dele o autogolo do 3-3, na Luz, no início deste ano. Já se fez Luz? Boa, porque Fábio quer marcar na baliza certa. E consegue-o com a ajuda de Varela. O guarda-redes do Benfica lança-se à bola e chega a tocar nela antes de a deixar entrar na baliza. Que erro colossal, 2-1 para o Boavista.

Tu queres ver que o Benfica vai perder pela segunda vez em quatro dias de virada? Rui Vitória faz entrar Gabriel de imediato (só sera Gabigol quando marcar um golo que seja) e o brasileiro até tem uma boa oportunidade, só que atrapalha-se com Rafa e a bola vai parar tranquilamente às mãos de Vagner. Nos seis minutos de compensação de neutralizações (sempre desejei escrever isto, caramba; está cumprido mais um sonho), o Benfica nem cócegas faz ao Boavista. O tetracampeão está irreconhecível e disso se aproveita o Boavista para dar um golpe de autoridade na primeira vitória sobre um grande desde o regresso à 1.ª divisão, em 2014-15. Xeque-mate, o xadrez volta a reinar no Bessa.

Estádio do Bessa, no Porto
Árbitro Artur Soares Dias (Porto)
BOAVISTA Vagner; Edu Machado, Raphael Rossi, Sparagna e Talocha; Idris e Gilson (david Simão, 46′); Renato Santos, Fábio Espinho (Rochinha, 75′) e Kuca; Bulos (Rui Pedro, 90+1)
Treinador Jorge Simão (português)
BENFICA Varela; André Almeida, Luisão, Rúben Dias e Grimaldo; Salvio (Rafa, 50′), Pizzi, Felipe Augusto e Zivkovic (Gabriel, 76′); Jonas e Seferovic (Jiménez, 69′)
Treinador Rui Vitória (português)
Marcadores 0-1 Jonas (7′); 1-1 Renato Santos (55′); 2-1 Fábio Espinho (74’)