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"Não há razão para não continuar a trabalhar até aos 70 anos", diz Nobel da Economia

Nobel da economia em 2010 defende que tem de ser feita uma reestruturação da dívida na zona euro e pede uma solução conjunta para os problemas de endividamento dos países.

Há quarenta anos que dedica a sua vida a estudar o desemprego. Demorou mais de vinte até ver os resultados dos seus modelos a influenciarem o pensamento económico, até que finalmente em 2010 ganhou a honra máxima entre os economistas, o prémio Nobel da economia. Christopher Pissarides esteve em Portugal para falar da sua especialidade no encontro anual do Banco Central Europeu e, em entrevista ao Observador, deixou alguns recados.

É cipriota, descendente de gregos, mas já é cidadão britânico. As suas visões económicas são também elas uma mescla. Defende uma maior flexibilização das regras laborais num caminho comum para a Europa, que a idade da reforma suba para os 70 anos, que a Europa caminhe toda para o modelo social dos países nórdicos, mas também que a dívida pública é demasiado alta para ser paga.

Christopher Pissarides alinha também na mensagem de Mario Draghi. As reformas têm de ser feitas já, mas mais que isso, não devem parar. Quer o melhor da flexibilidade da economia dos Estados Unidos, mas diz que o modelo social tem de ser europeu. Como? Mais impostos, reforma mais tarde e uma economia mais aberta.

Quem deve liderar o ataque ao desemprego. A Europa ou os países individualmente?

As melhores medidas para combater o desemprego deveriam ser nacionais, mas aplicando o mesmo princípio para toda a Europa. Estamos a transformar-nos numa economia cada vez mais integrada e precisamos de ter mercados de trabalho com estruturas semelhantes por toda a Europa, porque as economias e os mercados de trabalho iriam divergir, e isso não seria bom para a política monetária, especialmente, que tem de ser comum para todos.

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O caminho que estamos a seguir na Europa, e penso que não há forma de escapar, é em direção a mercados de produto mais flexíveis, em especial no ambiente de negócios, sem restrições nas profissões, monopólios e com mais competição, e, depois disso, mercados de trabalho mais flexíveis. É preciso um contrato laboral único para os trabalhadores em toda a Europa, mais competitividade, mais produtividade, em especial nos países periféricos.

Mas como se consegue isso?

É preciso avançar com algumas reformas institucionais, mas estas reformas são diferentes em cada país. Por exemplo, em Espanha e Itália o problema é a segmentação do mercado de trabalho, na Grécia o problema são os monopólios e a rigidez das instituições nos mercados de produto que impedem a produtividade de subir. Mesmo em países como a Alemanha, o setor dos serviços precisa de reformas. Precisamos de uma maior harmonização na regulação nos serviços tecnológicos. Mesmo com orientações das instituições europeias, estas reformas têm de ser feitas ao nível nacional.

Considerando a dimensão das economias, para esse caminho único quer dizer que os países periféricos precisam de reformas mais profundas?

As reformas precisam de ser grandes no sentido que há muitos lobbys que resistem a essas reformas, e politicamente são difíceis e pareceriam grandes decisões. Mas claro que ninguém espera que os países do sul vão além dos países que fizeram reformas. Por exemplo a Irlanda é é suposto ser um país periférico que teve problemas com a expansão do seu setor imobiliário, mas tem mercados de produto e laboral que já são flexíveis, não precisa de fazer mais reformas. Isso aconteceu no final dos anos 80. Como o governador do banco central da Irlanda explicou aqui, foi, porque é que os trabalhadores irlandeses aceitaram estas reformas. Ele diz que foi por causa da diáspora irlandesa, especialmente nos Estados Unidos e em Inglaterra, que explicaram quão melhor essas economias funcionam porque não têm rigidez nesses mercados. É esse tipo de reforma que se deve procura, não ir além.

A Alemanha fez uma reforma profunda em 2005, a Itália está passar agora por isso – o que Renzi está a fazer é muito bom e está a flexibilizar a economia -, a Espanha adotou medidas importantes em 2012 que começam agora a ter efeito. Já na Grécia foram aprovadas algumas leis, e reformaram no sentido correto, mas quase nada foi implementado.

Vê a Europa seguir o exemplo Americano, especialmente considerando as diferenças entre as duas economias e as críticas ao sistema de proteção social americano?

Se dissermos aos reformistas europeus que deviam seguir mais o exemplo americano, as objeções são fortes devido à posição dos Estados Unidos nos rankings em termos de desigualdade, baixos rendimentos e desemprego, saúde… as questões sociais. Precisamos de separar as políticas sociais das políticas económicas. Se seguirmos apenas as medidas económicas de como liberalizar a economia, o modelo americano é um bom modelo e tem tido muito sucesso. Tem a maior produtividade do mundo, mais alta que na Alemanha, em França e em qualquer outra parte. Normalmente crescem mais e conseguem competir com qualquer um internacionalmente. Isso é puramente em termos económicos.

Mas em termos sociais a questão é bem diferente…

Nesse aspeto, o sistema americano é apavorante, mas podemos ter um sistema flexível, mais ou menos como sistema que eles têm, mas com um sistema de apoio social verdadeiramente europeu. Na minha opinião, esse sistema de apoio social até devia ir além do que existe no Reino Unido, ir até ao nível do sistema sueco. A única questão que é fundamental é que o apoio social tem de ser pago pelas receitas dos impostos, não através de dívida. Temos agora um excessivo endividamento dos países, mas mesmo se não estivéssemos nessa situação não seria uma boa ideia usar dívida para pagar apoio social indefinidamente.

A decisão que temos de fazer enquanto europeus é quanto estamos dispostos a pagar de impostos, e quanto apoio estamos preparado para dar.

Como se paga esse sistema?

A decisão que temos de fazer enquanto europeus é quanto estamos dispostos a pagar de impostos, e quanto apoio estamos preparado para dar. Se dissermos que não gostamos de impostos elevados e não vamos para um sistema de mercado livre, mas tentarmos fazer com que as empresas deem proteção social aos seus empregados, teremos o pior resultado possível, porque irá resultar em menos produtividade, menos rendimentos e o rendimento que levaremos para casa será mais baixo do que se estivéssemos num ambiente de mercado e a pagar impostos mais altos.

Defende que deve ser estendido ao resto da Europa o modelo social, com elevados impostos, dos países do Norte, como a Suécia. Mas como podem os países mais pequenos que já têm uma carga fiscal muito alta fazer isso?

A forma de o fazer é implementar reformas que aumentem a produtividade da economia. Assim, os rendimentos sobem rapidamente e com o aumento dos rendimentos, mesmo com as elevadas taxas de impostos que vocês já têm, vão acabar por ter mais receitas para gastar em medidas sociais. O fundamental é começar com reformas estruturais que vos vão dar rendimentos mais altos. Não vão ter o mesmo nível de rendimentos e aumentar os impostos para dar mais apoio social, isso é que não funciona.

Mas para além da elevada carga fiscal a Europa também tem um problema de envelhecimento da população. Como é que atingimos o ponto de partida para mudar para esse modelo?

A população está mais envelhecida, mas também cada vez mais saudável, por isso deviam aumentar a idade da reforma. Podiam manter pensões mais ou menos como elas estão, mas se alguém se reformar mais cedo deve ser mais penalizado. Se ficarem têm um incentivo para receber uma pensão maior e não há razão para não continuar a trabalhar até aos 70 anos. As pessoas com 70 anos são saudáveis, muitas pessoas importantes que estão aqui hoje têm 70 e estão a trabalhar. O envelhecimento da população é um problema muito sério se não lidarmos com ele e aumentar a idade da reforma é importante.

70 anos não é muito drástico?

Quando a atual idade da reforma, em alguns países 65 anos e outros mesmo abaixo, foram implementadas a esperança média de vida era inferior a 70 anos. Quando 65 anos se tornou na idade normal de reforma no Reino Unido, a esperança média de vida era cerca de 67 ou 68 anos. A expetativa dos trabalhadores era que teriam direito a pensão durante dois ou três anos depois de parar de trabalhar. Agora, a esperança média de vida é 75 a 80 anos, se sobrevivermos aos 65 podemos viver até aos 80 anos. A OCDE calcula que o tempo de vida saudável se estenda por sete ou a oito anos depois dos 65. Por isso, se continuarmos com as atuais idades de reforma temos algo perto de 10 anos de vida saudável e muito capaz que não estamos a usar no mercado laboral. É nisso que devemos estar a trabalhar.

Está a defender a idade da reforma indexada à esperança média de vida?

Eu apoiaria uma idade da reforma que esteja indexada à esperança média de vida porque os países que têm uma esperança média de vida baixa não têm problemas demográficos. Não sei quanto à zona euro, mas usando o exemplo da Rússia. A Rússia tem uma esperança média de vida muito baixa, à volta de 60 anos, não tem problemas demográficos como nós temos no resto da Europa, porque as pessoas depois da reforma não vivem muitos anos para serem suportados pelas gerações mais novas.

A população está mais envelhecida, mas também cada vez mais saudável, por isso deviam aumentar a idade da reforma. Podiam manter pensões mais ou menos como elas estão, mas se alguém se reformar mais cedo deve ser mais penalizado. Se ficarem têm um incentivo para receber uma pensão maior e não há razão para não continuar a trabalhar até aos 70 anos.

Mas como se vende isso ao eleitorado, vendo casos como os do Japão ou da Alemanha onde há um problema grande de envelhecimento da população?

Como vendemos isso aos eleitores é um problema para os políticos, e felizmente não sou um político (risos). Mas há muitas decisões que são difíceis e que temos de convencer os eleitores que são boas para a economia e boas para a sociedade. Não é uma boa abordagem dizermos que estamos bem e que vamos manter o mesmo sistema, porque eventualmente vamos acabar por ficar para trás e depois vamos descobrir que é demasiado tarde para recuperar. Que é mais ou menos o que aconteceu com as nossas economias. O Reino Unido era assim e acabou por fazer reformas. Não foi fácil. E eu nunca apoiei a forma como a Margaret Thatcher fez as reformas, sempre em conflito, mas a ideia era a correta. São decisões difíceis, mas têm de ser tomadas.

Concorda com Mario Draghi que as reformas têm de ser feitas já ou com quem aponta que isso pode prejudicar a retoma?

Eu acho que nunca devíamos desistir de fazer tudo passo a passo e priorizar, começar pelos mercados de produto, e só depois o mercado de trabalho, que é mais difícil. Mas eu concordo com ele. Não devíamos deixar a economia sair da crise aos poucos e assim que estivermos fora da crise dizermos que os nossos problemas estão resolvidos, porque assim nunca vamos ter um crescimento forte e vamos acabar por cair novamente na mesma situação em que estamos agora. Não devíamos desistir nunca do esforço reformista.

Não devíamos deixar a economia sair da crise aos poucos e assim que estivermos fora da crise dizermos que os nossos problemas estão resolvidos, porque assim nunca vamos ter um crescimento forte e vamos acabar por cair novamente na mesma situação em que estamos agora.

Não está preocupado com o impacto recessivo de algumas destas medidas?

Temos de nos focar nos mercados de produto, porque isso aumentaria o investimento e assim que tivermos investimento será mais fácil fazer as reformas necessárias no mercado de trabalho, porque há mais criação de emprego. O importante é como vamos fazer, isso é que vai determinar se vamos ser bem-sucedidos. O que não podemos é encostar-nos e dizer que a crise acabou, dizer que nos vamos forcar agora noutras coisas porque as pessoas estão cansadas da crise e de reformas. O processo de reformas tem de ser contínuo. A Alemanha fez reformas numa altura em que a zona euro estava a crescer rapidamente, podiam quebrar as regras de Maastricht e ter défices mais altos, e ainda assim avançaram com as reformas e fez maravilhas à sua economia.

Não será mais fácil para países com economias mais fortes como a Alemanha fazer esse tipo de reformas, porque têm menos limitações?

Não acredito. Acho que é igual para todas as economias.

Acho que eventualmente tem de haver algum tipo de reestruturação de dívida. Tem de haver uma decisão tomada em conjunto por toda a zona euro porque a dívida é muito alta, tanto na zona euro como um todo, como nos países, em termos individuais. Nunca vão ser capazes de crescer rapidamente com tanta dívida

Então porque não avançam? É uma questão de cultura?

É uma questão importante. Muitos dos meus amigos na Grécia dizem que o problema é cultural, que é preciso mudar a cultura, que não é suficiente passar uma lei no Parlamento e dizer que ela está no ordenamento jurídico porque há uma cultura de desobediência. Não se pagam os impostos, não se avança com o que o Parlamento aprovou… Esse é o tipo de coisas que é muito difícil de mudar, mas nós passamos por grandes mudanças culturais. Esperemos que uma crise profunda como esta traga um grande choque cultural que os leve a mudar.

Mencionou os elevados níveis de dívida pública. O que acha que deve ser feito?

Acho que eventualmente tem de haver algum tipo de reestruturação de dívida. Tem de haver uma decisão tomada em conjunto por toda a zona euro porque a dívida é muito alta, tanto na zona euro como um todo, como nos países, em termos individuais. Nunca vão ser capazes de crescer rapidamente com tanta dívida, por isso devia haver um grande encontro, uma grande conferência, uma conferência da dívida como os gregos queriam fazer, à semelhança da forma como a questão da dívida dos países africanos foi resolvida. Tem de ser algo específico para a zona euro. Pode não ser muito urgente agora porque as taxas de juro estão muito baixas, mas quando começarem a subir novamente vai ser difícil. Eu espero que o façam, porque é absolutamente necessário.

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