Dara Murphy, ministro dos Assuntos Europeus e da Proteção de Dados, diz que a Irlanda acompanhou de perto a situação em Portugal e que, ao contrário do que é pedido pelo Governo grego, não considera que haja “necessidade de um aglomerado de países com dificuldades financeiras”. Quanto às eleições que se avizinham na União Europeia, Murphy assegura que, aconteça o que acontecer, o Reino Unido deve continuar “a ter um papel importante na União Europeia” e que deve ser dada a hipótese ao atual Governo português de manter o “trabalho excelente” após as legislativas.

O ministro Dara Murphy entrou em funções há menos de um ano e é militante do partido de centro-direita Fine Gael que atualmente governa a Irlanda em coligação com os trabalhistas. Em entrevista ao Observador, Murphy considerou que durante o período da crise na Irlanda – o país pediu resgate para o seu setor bancário em 2010 e teve uma saída limpa em 2013 -, o país olhou para Portugal, que esteve sob programa de ajustamento entre 2011 e 2014, “com simpatia” e que foi importante saber que as medidas indicadas pelo memorando estavam a ser implementadas. “Foi uma ajuda para os irlandeses e para o Governo irlandês saber que se estava a fazer um bom trabalho aqui em Portugal e que as medidas estavam a ser aplicadas e que Portugal estava a chegar a um ponto em que o futuro da economia estava assegurado. Na Irlanda havia simpatia pelo que estava a acontecer em Portugal”, disse o ministro.

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Murphy diz que as medidas implementadas através dos programas de ajustamento, tanto na Irlanda como em Portugal “foram para o benefício” das economias destes países, não considerando ser necessária uma união mais forte entre países que passaram por estes programas. “Acho que a União Europeia tem apoiado muito os países em dificuldades, mas também cabe aos próprios países estarem interessados no projeto europeu. […] Eu não acho que haja necessidade de haver um aglomerado de países com dificuldades financeiras porque várias países, num passado recente, sofreram destes mesmos problemas”, afirmou Murphy.

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Quanto às respostas adotadas pelos 28, especialmente pelo 19 países da zona euro para combater a crise, o ministro diz que demoraram demasiado tempo a ser encontradas e implementadas. No entanto, medidas como a União Bancária – lembre-se que o setor bancário irlandês colapsou após a queda da Lehman Brothers em 2008 – são vistas como algo muito positivo pelo ministro, já que impedem pretendem evitar o contágio de crises do setor bancário. “No que diz respeito à União Bancária e aos testes de stress, há medidas fortes que devem prevenir a probabilidade de certos problemas voltarem a acontecer e se os problemas acontecerem, haverá medidas para limitar o contágio às restantes economias europeias. Temos de aceitar que este é um novo conceito, uma experiência muito nova no mundo e tem sido muito bem-sucedida”.

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O ministro reconhece, no entanto, que a Irlanda sofreu nos últimos anos com as consequências da crise. Questionado pelo Observador sobre os custos sociais para o país, Murphy admite que o desemprego e a falta de investimento nas estruturas públicas têm tido um impacto negativo na população. Apesar de a Irlanda ser muitas vezes apontada como um país onde não houve movimentações sociais significativas como resultado da crise, o ministro diz que este “período difícil na Irlanda”, tem sido acompanhado pelo crescimento do partido Sinn Fein, que Murphy qualifica como “um partido populista que diz ser socialista”.

“São muito incoerentes, mas a nossa coligação vai dizer aos irlandeses que têm uma escolha entre estabilidade e algo que nós não sabemos bem o que é, porque luta contra tudo e contra nada. Este tipo de política é muito injusta para as pessoas porque não se pode prometer uma coisa que já se sabe que não se vai conseguir cumprir”, defende Murphy.

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Quanto às eleições que se avizinham em vários países europeus, nomeadamente em Portugal, Dara Murphy, diz que é natural que as caras mudem com alguma frequência no Conselho Europeu, já que se trata de 28 países diferentes. “No que diz respeito a Portugal, há um entendimento entre os meus colegas europeus que o trabalho feito pelo Governo português é excelente e que lhe deve ser permitido continuar o trabalho que está a fazer depois das eleições”, comentou o ministro.

Outra eleição mais próxima e determinante, especialmente para a Irlanda, é a do Reino Unido. Murphy preferiu não partilhar com o Observador a sua opinião sobre o melhor resultado para o país, mas considerou que independentemente de quem vença, é importante que o país permaneça na União Europeia. “A maioria dos britânicos quer continuar na União e todos partilhamos muitas das preocupações que o Reino Unido tem. Todos queremos crescimento, menos burocracia e mais trabalho”, disse o ministro.

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Proteger dados informáticos e novas leis europeias

Questionado pelo Observador sobre a sua pasta de Proteção de Dados, Dara Murphy respondeu entre sorrisos que pensa ser “o primeiro-ministro deste tipo na Europa”, mas que “não será o último”. Sobre a razão da existência desta pasta na Irlanda, Murphy nega que seja porque o país serve de sede europeia a 29 das 30 maiores empresas globais que recolhem e tratam dados, como a Google. “Temos muitas empresas sediadas na Irlanda que lidam com tratamento de dados, mas há muitas razões para isso, desde logo falamos inglês e muitas destas empresas são norte-americanas, temos uma força de trabalho com muito boas qualificações e temos um ambiente empresarial competitivo. O meu trabalho é assegurar os direitos dos cidadãos e dar uma proteção governamental a estes dados”, justificou o ministro.

Murphy é mesmo um dos ministros mais ativos na vontade de alterar as regras europeias sobre a proteção de dados, numa lei chamada General Data Protection Regulation, que deverá ficar definida no próximo Conselho Europeu de Junho. Segundo o ministro, estas leis de privacidade dos cidadãos europeus não são atualizadas há 20 anos e para além de passarem a ter mais explicitamente os termos em que os dados vão ser transmitidos às empresas, esta li poderá vir a tornar “mais fácil” que um utilizador de qualquer um dos 28 Estados-membros apresente uma queixa contra uma empresa online que use de forma incorreta os seus dados ou viole a sua privacidade.

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Com a Comissão Europeia a avisar que a melhor maneira de proteger os dados é fechar as contas do Facebook, o ministro reconhece que mecanismos como o Safe Harbor – um programa que permite a partilha de dados entre os EUA e a União Europeia – precisa ser reavaliado, embora considere que seja necessário. “Admito que o Safe Harbor tenha de ser melhorado. Eu sei que a Comissão está neste momento nos EUA a negociar isto e peço que aos americanos que tenham noção que os europeus estão preocupados com o excesso de vigilância sobre os dados e que nos opomos a esse tipo de vigilância. Espero que possamos ver bons progressos entre a UE e os EUA”, afirmou o ministro.

Com os ataques ao Charlie Hebdo e a aproximação do Estado Islâmico à Europa, foi retomado no seio da União Europeia a questão da Lista de Nome de Passageiros (ou PNR em inglês) ou a partilha entre todos os Estados-membros dos dados dos passageiros que circulam de avião dentro do espaço Schengen. Murphy diz que a dificuldade neste debate, já que muitos se opõem a esta partilha, devido à intrusão na privacidade dos cidadãos europeus e tratamento externo dos dados, é o “conflito entre o que é proporcional em termos de vigilância aos cidadãos para prevenir e proteger contra o terrorismo”.

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