Podia ter ido para França, Austrália ou Argentina, mas Alessandro Ford escolheu a Coreia do Norte como destino para um intercâmbio de quatro meses. A experiência fez dele o primeiro ocidental a estudar no regime cerrado de Kim Jong-un. Em entrevista à BBC, o jovem belga de 18 anos faz revelações impressionantes daquilo em que nos norte-coreanos acreditam: o ébola foi uma criação da CIA que ficou fora de controlo, os campos de internamento de prisioneiros políticos são “campos de reeducação”, e a música ocidental é “egoísta”.

O intercâmbio aconteceu entre agosto e dezembro do ano passado. Quando chegou, sentiu que os norte-coreanos eram difíceis de entender, mas o pouco que sabia da língua ajudou-o a comunicar e inclusivamente a fazer alguns amigos. Os colegas, fascinados por conhecer alguém de fora, colocavam-lhe inúmeras perguntas: “Explica-me tudo sobre o teu país”, pediu-lhe um amigo e soldado que tinha sido enviado para estudar na sua universidade, agarrando-o e sentando-o na cama.

Naturalmente, as diferenças causaram surpresa (e estranheza) aos locais. Alguns exemplos foram o serviço militar não ser obrigatório, do estado não oferecer casa aos cidadãos, e esta poder ser escolhida e comprada com dinheiro.

Numa dada ocasião, Alessandro perguntou a um grupo de colegas o que pensavam sobre os campos de internamento para prisioneiros políticos. Mas a resposta que obteve, desencorajou-o a discutir politica: “Não são campos como aqueles onde os japoneses nos colocavam, são campos de reeducação. Quando alguém não entende os pensamentos políticos do nosso grande líder, precisam de ser instruídos”, respondeu-lhe uma amiga.

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Era constantemente vigiado por estudantes norte-coreanos que viviam com ele. “Jogávamos futebol juntos, comíamos juntos, bebíamos juntos. Eu dava-me bem com as pessoas que me estavam a vigiar por isso era uma relação estranha”, revela à BBC.

Apesar dos produtos de entretenimento estrangeiros serem estritamente proibidos na Coreia do Norte, Alessandro teve oportunidade de mostrar aos colegas alguma música ocidental. Mas os norte-coreanos não ficaram impressionados. “Acharam que alguém a fazer rap ou a cantar acerca de um amante, sobre eles próprios ou sobre ganhar dinheiro ou ficar famoso era egoísta e que se deveria cantar sobre algo com significado – como o Estado, o seu país ou a sua família”, relata o jovem estudante belga.

A única forma que Alessandro tinha de saber o que se passava no mundo era através dos noticiários norte-coreanos – controlados pelo Estado. “Toda a gente no meu dormitório parecia acreditar nas notícias quando diziam que o [vírus do] Ébola tinha sido criado pela CIA como uma arma para destruir um país qualquer sem nome e que a CIA tinha perdido controlo [da experiência]”. Depois, “perguntei aos meus amigos se eles acreditavam nisto e eles disseram: ‘Claro, se as notícias disseram, porque iriam mentir?'”.