A Universidade Católica de Moçambique (UCM) vai criar, a partir de 2017, uma cátedra com o nome de Jaime Gonçalves, antigo arcebispo da Beira e um dos principais mediadores do Acordo Geral de Paz, anunciou o reitor da instituição.

“É com emoção e sentido de justiça que anuncio que a reitoria decidiu estabelecer, já em 2017, a primeira cátedra da UCM e que será a cátedra Dom Jaime Gonçalves”, revelou Alberto Ferreira, citado na página eletrónica do estabelecimento de ensino superior.

Segundo o reitor, “Dom Jaime não se cansava de repetir que o seu sonho era ver uma Universidade Católica que fosse capaz de formar mulheres e homens não só intelectualmente, mas também atores sociais” e depositários de valores éticos e humanitários, democráticos, de justiça, liberdade e transparência.

Jaime Gonçalves morreu a 6 de abril na Beira e o seu funeral juntou religiosos, académicos e políticos de todos os quadrantes, incluindo o atual Presidente da República, Filipe Nyusi, e o ex-chefe de Estado Joaquim Chissano, signatário do Acordo Geral de Paz, celebrado em Roma em 1992, terminando 16 anos de guerra entre o Governo de Moçambique e Resistência Nacional Moçambicana (Renamo).

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“Além de ter sido um dos negociadores da paz para o país, Dom Jaime notabilizou-se, enquanto arcebispo e magno chanceler da UCM, como lutador incansável pela justiça, pela paz, tolerância e reconciliação”, salientou Alberto Ferreira, no ano em que a universidade celebra duas décadas de existência.

Na cerimónia fúnebre realizada em abril na Beira, o Presidente moçambicano, Filipe Nyusi, recordou a “inteligência e perspicácia” de Jaime Gonçalves e expressou o desejo de manter vivo o legado do mediador do Vaticano nos acordos de Roma.

“Na divulgação da fé e da esperança, na missão que abraçaste, interagiste com a sociedade despertando a consciência coletiva dos moçambicanos para a necessidade de construirmos uma sociedade de igualdade, justiça, harmonia social, paz e reconciliação. Queremos ser continuadores da tua obra e manter vivo o teu legado”, declarou Filipe Nyusi.

Na sua última entrevista, divulgada pela Lusa a 18 de fevereiro, Jaime Gonçalves defendeu que o entendimento de Roma ainda é a solução para os conflitos no país e devia ser revisitado pela Igreja nesta nova fase de crise.

Jaime Pedro Gonçalves nasceu em Nova Sofala a 26 de novembro de 1936, tendo frequentado o seminário em Zobué, província de Tete, e prosseguido os estudos em Maputo, Namaacha, Canadá e Roma. Assumiu a diocese da Beira em março de 1976, menos de um ano após a independência de Moçambique.

Condecorado pelo Estado moçambicano em 2014, voltou a juntar-se aos signatários dos acordos de Roma, Joaquim Chissano e Afonso Dhlakama, num evento da Universidade Católica, em setembro de 2015, na Beira, acusando os políticos de ameaçarem a paz com seu “orgulho e medo” e de promoverem uma democracia de ódio.

“Estão todos os dias enchendo a boca a dizer paz, paz, paz! Qual paz? Paz de vergonha? Onde está a paz?”, questionou.

Já depois da morte de Jaime Gonçalves, Governo e Renamo voltaram ao diálogo em Maputo, com a presença de mediação internacional, incluindo o representante do Vaticano na capital moçambicana e também Mario Raffaelli, antigo mediador da Comunidade de Santo Egídio nos acordos de Roma, e que regressou a Moçambique por indicação da União Europeia.

Apesar do reatamento das negociações, a violência política tem marcado as últimas semanas, com denúncias cruzadas de ataques armados e assassínios de dirigentes.