“O Jovem Karl Marx”

Parte filme biográfico de época convencional, parte “buddy movie” comunista, parte “Marxismo para Totós” em versão cinematográfica, “O Jovem Karl Marx” foi produzido pelo também realizador francês e comunista antediluviano Robert Guédiguian e é realizado pelo cineasta e activista de esquerda haitiano Raoul Peck, que já foi ministro da Cultura do seu país. À base de muita, muita conversa, em tom de palestra escolar entusiasmada (há tiradas como “és o maior pensador materialista dos nossos tempos!”) e numa atmosfera do tipo “Quarto com Vista para a Cidade” em registo de revolução social, Peck conta a história da amizade entre o jovem e depauperado Marx (August Diehl) e o jovem e endinheirado Engels (Stefan Konarske), e da génese do marxismo, com a Revolução Industrial em pano de fundo e Jenny, a devotada mulher de Marx, a completar o grupo. Formalmente engomado, didáctico e condensado, o filme acaba por transformar o biografado num santinho de papel maché. Se Peck fez “O Jovem Karl Marx” a pensar que o marxismo está de novo na moda, o filme não é lá grande anúncio para uma doutrina que a História já comprovou sobejamente dar maus e sangrentos resultados. O que virá a seguir? “A Infância de Lenine”? “Estaline no Seminário”?

“Ma Loute”

O francês Bruno Dumont repete aqui a matriz da sua realização anterior “O Pequeno Quinquin”, só que passada no início do século XX e carregando ainda mais na farsa grotesca e na caricatura de traços espessos. Filmado, como sempre, na agreste região natal do realizador , o Nord-Pas-de-Calais, “Ma Loute” põe em cena os excêntricos membros da família burguesa dos Van Peteghem, que vão passar as férias na moradia que têm junto à praia, e os de uma família de pescadores e apanhadores de bivalves da zona, a que pertence o jovem Ma Loute do título, e que são canibais, alimentando-se dos turistas que matam. Os misteriosos desaparecimentos estão a ser investigados por um bizarro par de polícias, um gordíssimo e outro magérrimo, e tão burros e incompetentes como os dois agentes de “O Pequeno Quinquin”. “Ma Loute” é uma comédia negra e anarquizante tão arrevesada como gratuita, que depressa se auto-consome no seu próprio ridículo e desperdiça actores como Fabrice Luchini, Juliette Binoche e Valeria Bruni Tedeschi. E se Bruno Dumont julga que está a ser iconoclasta, subversivo e “simbólico” ao mostrar burgueses decadentes dos alvores do século XX a serem devorados por proletários boçais, então precisa de rever urgentemente os seus conceitos de subversão, iconoclastia e simbolismo.

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https://youtu.be/h-ZTwId8mnI

“Esta Terra é Nossa”

O belga Lucas Belvaux realiza este filme de “agit-prop”, estreado em França à boca da campanha para as eleições presidenciais, onde a personagem da líder de direita radical Agnès Dorgelle (Catherine Jacob) é uma sósia de Marine Le Pen e o seu partido, o Rassemblement National Populaire (RNP), uma evidentemente mal disfarçada Frente Popular (FN). A acção passa-se em Hénart, cidade mineira do norte assolada pela insegurança, pelo desemprego, pelo afluxo de refugiados e por tensões sociais e raciais, que Belvaux (também autor do argumento, com Jérôme Leroy, autor de “Le Bloc”, um policial político no qual o filme se inspira) apresenta como um microcosmos da França. Pauline Duhez (Émilie Dequenne, sempre óptima) é uma enfermeira muito querida e popular na zona e desligada da política, que um médico amigo (André Dussolier) convence a concorrer à Câmara Municipal como cabeça de lista do RNP. O que interessa aqui ao realizador é apenas a diabolização daqueles que elegeu como inimigos. “Esta Terra é Nossa” foi escolhido como filme da semana pelo Observador, e pode ler a crítica aqui.