“Há muito que o que querem é meter as unhas no estatuto da carreira docente.” Mário Nogueira, secretário-geral da Fenprof, acusa o Governo de António Costa de não resolver o diferendo da recuperação do tempo em que as carreiras dos professores estiveram congeladas por ter outro objetivo em mente: mexer na estrutura da carreira docente. Em entrevista ao jornal Público, o líder da Fenprof diz mesmo que “se o PS tiver a maioria absoluta [nas próximas eleições] a carreira, tal como ela existe hoje, está liquidada”.

Durante este mês de janeiro, o ministro da Educação esteve no Parlamento e quando questionado sobre o início das novas negociações sobre a recuperação do tempo de serviço, disse apenas que o Orçamento do Estado está em vigor até ao final do ano. Durante a discussão na especialidade, a oposição aprovou uma norma no OE que obriga Tiago Brandão Rodrigues a abrir uma nova ronda com os sindicatos para negociar este tema. No entanto, até à data não chegou qualquer convocatória aos professores, estando prevista uma concentração de docentes em frente ao ministério já na próxima quinta-feira.

Apesar da urgência dos sindicatos em voltar à mesa negocial, as declarações do ministro fazem crer que não há a mesma urgência da parte da tutela. Confrontado com este possível adiamento das negociações, Mário Nogueira não se mostra surpreendido.

Não sei se teriam algo a ganhar [com o adiamento das negociações], mas poderiam ter uma coisa que há muito querem que é meter as unhas no estatuto da carreira docente. O Governo sabe que se começar a recuperação [do tempo de serviço] agora, há um faseamento que se vai prolongar por um tempo e que, portanto, enquanto este se prolongar, não poderá assumir que uns já não irão progredir de escalão devido à recuperação porque, entretanto, a estrutura da carreira mudou e os escalões serão outros”, explica o sindicalista.

Por outro lado, defende que essa tem sido a intenção deste o princípio das negociações. “A verdade é que isto é o que os governantes querem desde o início: tentar adiar o máximo possível a questão da recuperação para verem até onde podem ir no pós-eleições. E se o PS tiver a maioria absoluta a carreira, tal como ela existe hoje, está liquidada. Se não tiver, poderá não estar, mas tentarão sempre fazer algo nesse sentido, que é o de empobrecer ainda mais a classe docente.”

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Aliás, Mário Nogueira faz questão de lembrar que a intenção inicial do Governo, quando foi assinada a declaração de compromisso em novembro de 2017, foi propor que a recuperação se iniciasse apenas em 2020.

Sobre os efeitos que a postura do Partido Socialista em relação aos professores terá nas próximas eleições, o líder da Fenprof alerta que António Costa poderá estar a ver mal a realidade.

“Penso que o PS de hoje ainda pensa exatamente o mesmo do que pensava o PS do Sócrates e da ministra Maria de Lurdes Rodrigues. Ou seja, que perdendo os professores poderão ganhar a opinião pública. O dr. António Costa meteu na cabeça que ao fazer esta guerra, e ao levá-la até ao fim, vai ter mais votos. Eu, por acaso, estou convencido do contrário e também no PS há quem esteja. E não só por se saber que terá sido, em muito, por causa do descontentamento dos professores [na altura em relação a Maria de Lurdes Rodrigues] que perderam a maioria absoluta em 2009.”

Regresso às greves em cima da mesa

Acusando a Educação de estar “sem ministro”, Nogueira diz ainda que o que “o Governo está a fazer nesta negociação é uma gestão política com base na qual pensarão que será melhor ir empurrando o assunto para a frente”.

“Mas nós não vamos esperar. Já no próximo dia 24 vamos estar em frente à Presidência do Conselho de Ministros para exigir a abertura de negociações. Se tal não acontecer em Fevereiro iremos entregar um abaixo-assinado que poderá ser o maior de sempre dos professores. E, entretanto, estamos a recolher opiniões sobre que ações poderemos vir a desenvolver que tenham um forte impacto no funcionamento das escolas”, explica o sindicalista.

Pelo caminho, há a ameaça de novas greves. “Podemos voltar às greves, mas não necessariamente no final do ano, porque esse já não será um tempo útil. Podemos avançar com greves novas, atípicas, antes desse período. O veto do Presidente da República ao diploma do Governo que apenas devolvia cerca de três anos devolveu muito ânimo aos professores. O veto e a posição das regiões autónomas de avançarem para a contagem integral do tempo de serviço.”