A diretora de Informação da Lusa, Luísa Meireles, propôs esta quinta-feira, numa conferência em Lisboa, que a agência de notícias portuguesa sirva como “uma plataforma” de “vontades” contra a “praga” da desinformação.

“Temos vontade de reunir vontades para combater notícias falseadas ou falsificadas”, afirmou Luísa Meireles, oradora na conferência “Combate às fake news — uma questão democrática”, que esta quinta-feira decorre na Culturgest.

“Nós estamos a fazer a nossa parte. (…) Pensamos que as agências de informação, e a Lusa em particular, (…) têm uma especial responsabilidade nesta tarefa”, reconheceu, propondo que a Lusa sirva de “plataforma” de entendimento entre os órgãos de informação portugueses. “Ajudem-nos a fazer mais e melhor”, apelou.

Luísa Meireles começou por partilhar algo que “nunca” pensou que lhe pudesse acontecer. “Nem de propósito”, a diretora de Informação da Lusa foi alvo de desinformação esta noite, ao ser citada pela agência de notícias angolana Angop, 100% pública, sem nunca ter prestado declarações a este órgão de informação oficial.

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“A Lusa é muitas vezes usada para dar um selo de credibilidade a manobras de política interna”, lamentou, realçando que a fake news de que foi alvo foi “disseminada por um meio de informação tradicional, que deve verificar as fontes”.

Hoje, “a fronteira entre factos e opiniões tornou-se perigosamente ténue” e, neste contexto, “um dos nossos maiores desafios é o facto de não partilharmos uma base comum de factos”, afirmou a jornalista.

Sublinhando que os jornalistas “não são imunes aos erros”, Luísa Meireles acredita que, neste “caminho perigoso para as sociedades democráticas”, a agência de notícias pode não ter fórmulas mágicas, mas tem o dever de ajudar a encontrar respostas, que passarão, “certamente”, por promover a literacia para os media e, “talvez”, por equipas especializadas em verificação de factos.

Luísa Meireles tem uma certeza: a solução passa por “criar plataformas de entendimento para melhor combatermos o fenómeno”. E isso a Lusa pode, e quer, fazer. “Os jornalistas estão na primeira fila deste combate, porque não podem deixar de estar”, sublinhou.

Luísa Meireles citou ainda os resultados preliminares de um inquérito interno feito aos jornalistas que trabalham na Lusa, concebido por Ana Pinto Martinho, investigadora no ISCTE.

O inquérito concluiu que os jornalistas que trabalham na Lusa “estão esmagadoramente conscientes dos conteúdos falsos e enganosos”. Estão ainda “preocupados” e temem “não estar preparados”, mas “99% sabem que são importantes para desmascarar” conteúdos falsificados ou manipulados. O “cuidado com as fontes” é apontado como o principal recurso para combater a desinformação.

A jornalista espanhola Mar Marín, oradora no mesmo painel, defendeu que é preciso “voltar à essência do jornalismo” para melhor reagir a um “desafio complexo, mas imprescindível, que precisa de resposta urgente”.

Aos órgãos de informação “não basta denunciar, há que combater a mentira”, defendeu a delegada da agência de notícias espanhola Efe, parceira da Lusa na conferência, que já criou uma equipa de verificação de factos, para responder ao “momento especialmente delicado” que se aproxima, com as eleições europeias de maio.

Reconhecendo a “incapacidade dos meios tradicionais para atacar o problema“, a delegada da Efe em Lisboa disse que “o analfabeto mediático é um alvo perfeito par propagar a mentira” e reparou que “os cidadãos parecem não estar conscientes da magnitude da ameaça”.

Em Espanha, mencionou, 36% dos cidadãos informam-se através da rede social privada WhatsApp, uma das plataformas mais usadas para disseminar informações falsas.

É um esforço diário, ninguém pode baixar a guarda. Não podemos continuar a ser cidadãos passivos, temos de guardar reservas mínimas e questionar”, sustentou

Respondendo ao apelo da diretora de Informação da Lusa, Mar Marín afirmou: “Não devemos perder esta oportunidade, juntos somos mais fortes”.

Público deve saber que ‘Fake News’ existem porque desestabilizam países, segundo Walter Dean

O professor universitário e ex-jornalista norte-americano Walter Dean defendeu esta quinta-feira, em Lisboa, que as ‘fake news’ mudam eleições, como aconteceu nos Estados Unidos, e as pessoas devem saber que existem porque desestabilizam os países.

“O público deve levar a sério as ‘fake news’”, afirmou à agência Lusa Walter Dean, atualmente professor convidado na Universidade Nova de Lisboa, que tem estudado o tema das “notícias falsificadas”.

Durante uma conferência sobre o combate à desinformação que a Lusa organiza esta quinta-feira, em Lisboa, em parceria com a agência espanhola EFE, o especialista citou investigações recentes que concluíram que os russos “desestabilizam democracias, confundindo assuntos” ou criando confusões que levam as pessoas a pensar “quais são os factos” ou se devem confiar nas instituições governamentais.

“Acho que o principal é que as pessoas têm de prestar atenção às ‘fake news’”, disse, sublinhando a dimensão que as falsas informações alcançam nas redes sociais.

O aspeto político é atualmente, para Walter Dean, o ponto crítico, com os países a transformarem a informação num campo de batalha, uma guerra por ideias, pela consciencialização pública.

“Começaram a usar a informação em propaganda para alcançar prioridades nacionais e se pretendem criar confusão ou desestabilizar é isso que vão tentar fazer. E isso pode mudar a forma como os países funcionam”, disse.

Confessando um interesse especial por Portugal, por ser uma democracia “relativamente jovem”, Walter Dean afirmou que está a tentar perceber a relação entre cidadãos e instituições governamentais.

Um dos principais desafios é como reagem a ‘fake news’. Por um lado, têm de proteger a liberdade de expressão e, por outro, têm de proteger a qualidade da informação que os eleitores usam para tomarem boas decisões sobre a governação”, declarou.

“A internet torna isso mais difícil, porque há ali tanta informação e tão disponível. Qualquer um pode agora publicar e editar, passando informação a outras pessoas. Pode isto ser regulado, deve ser regulado?”, questionou.

Para Dean, estas são questões “muito importantes”, não unicamente para Portugal. “Mas é reconfortante ver que há pessoas inteligentes em Portugal a tentar resolver isso”, disse.

O ponto de partida, preconizou, é reconhecer que as falsas notícias existem, que é importante discutir a questão e pensar numa resposta.

Lusa vai desenvolver projeto de “fact-checking”