“Houve um tempo em que vocês nos mandavam cuecas para o palco”, recordou Kevin Richardson, o mais velho dos Backstreet Boys (hoje com 47 anos), mais ou menos a meio caminho do primeiro concerto da DNA Tour, que arrancou este sábado, 11 de maio, na Altice Arena, em Lisboa. Tinha ficado em palco apenas com AJ Mclean para o seu solo – cada um dos cinco membros da banda teve direito a um – quando surgiram dois provadores onde foram trocar de roupa ao vivo e aproveitaram para devolver o favor: “Agora tomem as nossas.”

Os Backstreet Boys sabem que estão mais velhos. Reconhecem, com piada, que já lá vão os tempos de levar com a roupa interior de adolescentes apaixonadas. Já lá vão 26 anos (sem interrupções, caso raro no universo boy band) desde que a banda surgiu em 1993, e já lá iam 21 desde a primeira vez que atuaram em Portugal, na Praça de Touros de Cascais.

Mas sabem, sobretudo, que num pavilhão a abarrotar de gente estão ainda a cantar para as mesmas pessoas que suspiraram por eles à frente de posters arrancados das páginas centrais das revistas Bravo e Super Pop, que eram a forma de responder na altura à curiosidade adolescente sobre a vida dos ídolos que agora basta seguir no Instagram.

A Altice Arena estava ali, em comunhão, à procura de fazer uma viagem no tempo – e foi isso que os Backstreet Boys ofereceram, sem pudor, logo a partir das primeiras músicas, tão anos 90 como “I Wanna Be With You” ou “Get Down (You’re The One For Me)”, a primeira a levantar toda a gente para dançar – e todos os telemóveis para filmar –, e juntando a esta barriga cheia de revivalismo coreografias clássicas com os chapéus, imagens dos rapazes ainda adolescentes que provocaram muitos gritos e até o famoso color block das roupas brancas da cabeça aos pés.

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Backsteet’s Back: não menosprezarás o poder da nostalgia

Noutros tempos, um concerto de Backstreet Boys teria gente acampada à porta, reportagens sobre os primeiros a chegar à fila com tendas de campismo e pais no final para recolher os miúdos. Agora, e apesar de o single do novo álbum (Chances) ter levado a banda de volta, 20 anos depois, a um número um da tabela Billboard nos EUA, nunca seria assim. E a caminho da Altice Arena, as dúvidas eram legítimas: que público será este? E um pavilhão tão grande não será ambição a mais?

É então que se aprende a primeira lição a retirar de um concerto de Backstreet Boys em 2019: não menosprezarás o verdadeiro poder da nostalgia. Porque logo à volta do pavilhão já se percebia o que ia acontecer lá dentro – grupos de casais amigos que deixaram os filhos com os avós, antigas colegas de escola que foram buscar merchandising antigo ao fundo de uma gaveta e até (várias) despedidas de solteira.

E depois da estranheza inicial de se ver um grupo de cinco quarentões (o mais novo, Nick Carter, que começou com 13 anos, já tem 39, e a média da banda anda pelos 44) a fazer coreografias sensuais em cima de um palco sem ser, lá está, numa discoteca em Lafões para um grupo de mulheres com bandoletes eróticas a condizer, a fórmula resulta mesmo num concerto divertido, cheio de momentos em que as pessoas se abraçam, recordam com uma pequena lágrima a balada que ouviram no primeiro desgosto de amor e cantam (mesmo muito alto, com as vozes a subir até ao teto) os refrões de êxitos como “I Want It That Way”, “Everybody (Backstreet’s Back)”, “Quit Playing Games (With My Heart)” ou “As Long As You Love Me”.

Lições de vida: o amor à barba e não, essa música não era dos Take That

Há, claro, outras coisas que se aprendem sobre a vida num concerto de Backstreet Boys em 2019. Uma delas é que se eles envelheceram, toda a gente que está ali para os ver também. E que isso pode afetar a memória (“Qual é o nome deste, mesmo? Howie? Havia um Howie?”), pode ter efeitos cómicos de confusão (“Que engraçado, pensava mesmo que esta música era dos Take That”) e tem um certo impacto na análise da evolução de gostos pessoais (“Quem diria que agora aquele que parece mais giro já não é o loiro com cara de bebé mas sim o homem barbado?”).

Outra coisa que se aprende, infelizmente, é que uma certa música dos Excesso, muito inspirada em “I’ll Never Break Your Heart” (“Não sei viver sem ti, não vou esquecer o que vivi…”) pode resistir durante demasiado tempo dentro de uma pessoa. Ah, e jantar demasiado antes de ir para um concerto dançar e beber cerveja pode provocar dor de burro – preocupações de saúde que nunca surgiram em espectáculos de One Direction, por exemplo.

No fim da noite, a vitória é de todos. Deles, que até cantaram a capella sem desafinar e perceberam que uma viagem no tempo pode ser uma celebração não-decadente. Do público, que de certeza ouviu tudo o que queria ouvir, pelo menos nos intervalos entre um vídeo para o grupo de Whatsapp e umas stories no Instagram. E até de alguém que, no meio do regresso à adolescência, ainda conseguiu confirmar a venda do marsúpio do segundo filho no OLX. Afinal, estamos todos mais velhos. E não faz mal.