O empresário David Neeleman aceitou sair do capital da TAP por um valor que rondará os 55 milhões de euros, confirmou o Observador. No entanto, o acordo final depende ainda de uma condição imposta pelo Estado na reta final das discussões que não está garantida. A companhia brasileira Azul terá de ceder o direito a converter em capital o empréstimo obrigacionista de 90 milhões de euros que fez à empresa portuguesa.

De acordo com uma fonte próxima do processo negocial, a concordância da Azul a esta cedência, que estará neste momento em discussão, é o obstáculo a um acordo final para a TAP que evite a solução mais drástica da nacionalização. Segundo o Jornal Expresso, as negociações entre o Estado e os privados falharam no prazo previsto para chegar a um acordo e o diploma que aprova a nacionalização está pronto para aprovação do Conselho de Ministros, informação que não foi ainda possível confirmar.

David Neeleman é acionista e presidente do conselho de administração da Azul que foi um dos veículos que usou para realizar o investimento na transportadora portuguesa. No entanto, como parte interessada, não deverá participar na tomada de decisão pela companhia brasileira.

Num primeiro cenário, o Governo queria que os privados contribuíssem para o esforço financeiro, aceitando converter os empréstimos à companhia em capital. Mas agora que a solução passará pela saída de David Neeleman, o Estado quer quer a Azul abdique do direito a converter essas obrigações em ações da TAP SGPS, a entidade que recebeu o financiamento.

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Neste quadro, a companhia continuaria a receber os juros desta emissão, 7,5%, até ao seu vencimento em 2026, mas para a Azul este não será o momento mais adequado para resolver a questão, ainda que seja expetável no quadro de uma reestruturação da TAP, que também será financeira, venha a ser negociado algum desconto ou haircut nos direitos dos credores da transportadora.

A participação de 45% de David Neeleman na transportadora portuguesa seria comprada pelo Estado e, eventualmente, em parceria com o outro acionista privado, Humberto Pedrosa, que poderia aumentar a sua posição na TAP.

Caso avance a nacionalização, a compra da posição de Neeleman cai por terra, bem como os 55 milhões de euros que poderia receber. Também os direitos da Azul enquanto credora da TAP ficariam comprometidos numa nacionalização. No entanto, David Neeleman e a Azul têm um trunfo neste cenário mais drástico.

A revisão do acordo de 2017, garantiu aos privados o direito a serem ressarcidos das injeções financeiras que fizeram no quadro de capitalização da TAP. Isto no caso de o Estado assumir a totalidade ou controlo da transportadora, no quadro de incumprimento ou bloqueio entre os acionistas. E terá sido essa cláusula assumida no primeiro Governo de António Costa no quadro da reversão da privatização de 2015 que permitiu a David Neeleman conseguir um acordo para a compra das suas ações por 55 milhões de euros.

Daí que a nacionalização também não agrade ao Governo, que gostaria de um acordo que envolvesse privados, nos termos do plano de ajuda aprovado pela Comissão Europeia, e evitando uma guerra jurídica de resultados imprevisíveis e que teria ainda um custo em termos de imagem para Portugal como destino de investimento.

Uma outra fonte conhecedora do processo disse ao Observador que há uma nacionalização teria fortes consequência para o plano de ajuda do Estado. Não no sentido global (de a Comissão Europeia reverter a autorização de ajuda de Estado num valor até 1.200 milhões de euros), mas sim nos termos do plano de reestruturação que está associado à ajuda estatal, que “iriam, certamente, endurecer”, indicou.

Costa insiste em acordo hoje. Dinheiro da ajuda terá de chegar à TAP até meados de julho

Já esta quarta-feira, o primeiro-ministro, António Costa, afirmou esperar que ainda hoje haja uma solução para a TAP, por acordo com os acionistas privados da companhia aérea, e não imposta pelo Estado. A pressa em chegar a uma solução depois de meses de ruído e avanços e recuos, prende-se com a situação de tesouraria da transportadora que só teria caixa pagar pagar despesas (quando quase não tem receitas) até ao final de junho. O objetivo é que a primeira tranche dos 1.200 milhões de euros da ajuda pública entre na TAP na primeira quinzena de julho, mas o Estado quer assegurar as condições essenciais, financeiras e jurídicas, desta intervenção antes de assinar o primeiro cheque.

António Costa falava em declarações conjuntas aos jornalistas com o presidente do Governo espanhol, Pedro Sánchez, no Castelo de Elvas, no distrito de Portalegre, após as cerimónias oficiais que assinalaram a reabertura da fronteira entre Portugal e Espanha.

“Estou certo de que, se não hoje, no limite, nos próximos dias, teremos uma solução final. Mas, se tivesse de apostar, eu diria que hoje será o dia da solução para a TAP, e espero que negociada e por acordo com os nossos sócios privados, e não propriamente com um ato de imposição do Estado”, declarou, acrescentando: “Se for necessário, cá estaremos para isso. Espero que não seja necessário”.

Segundo o primeiro-ministro, “a TAP está seguramente a caminho de ter uma solução estável que assegure a Portugal manter a sua companhia”, o que considerou fundamental para a continuidade territorial e o desenvolvimento económico do país e a sua ligação ao mundo.

Questionado sobre se o Governo deseja que o empresário David Neeleman saia da TAP, António Costa não respondeu à pergunta e limitou-se a referir que não teve “oportunidade nas últimas horas de ter informações” sobre esta matéria. “Mas creio que o problema, a questão, será ultrapassada muito rapidamente”, reiterou.