Camila Moutinho e Daniela Oliveira somam uma década de amizade e agora um projeto comum. A Retry está online desde o dia 8 de maio e o que começou por ser uma solução prática para escoar a roupa que já não usavam, tornou-se um negócio que promove uma economia circular dentro numa área consumista por natureza, a moda. Uns vendem, outros compram. Aparentemente, todos saem a ganhar.

“Nós já trocávamos peças, vendíamos algumas a amigas através de grupos no WhatsApp. Basicamente, queríamos vender roupa e não tínhamos tempo para ir aos mercados de segunda mão”, explica Camila. “E também não havia assim nenhuma plataforma que chamasse a atenção”, remata.

O site da Retry foi lançado a 8 de maio © Divulgação

O site resulta de um investimento próprio, garantido pelas duas amigas, que em tempos foram também colegas na Faculdade de Direito da Universidade do Porto. Daniela concluiu o curso com distinção, Camila trocou as leis pelo design multimédia. Curiosamente, a mudança de trajeto veio a dar jeito na hora de criar uma plataforma online, dedicada à compra e venda de roupa em segunda mão.

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“O nosso objetivo é que as pessoas obtenham a satisfação que têm quando compram algo em primeira mão”, refere Camila. Para cumprir o propósito, todas as peças postas à venda na Retry são previamente examinadas ao vivo. A quem vende, não exigidas marcas de luxo nem peças de design vintage — apenas que a roupa esteja em bom estado. Após a avaliação, tudo é categorizado de C e A+. A escala vai de peças que podem ter algumas marcas irremediáveis, como é por vezes o caso das peles, às que nunca foram usadas e até conservam a etiqueta da loja.

Neste processo, a dupla conta com alguns contactos no setor têxtil para ajudar a despistar uma ou outra dúvida e ainda procede à higienização de roupa e acessórios e à produção de materiais de divulgação. Até 150 euros, a comissão associada à venda de peças através da plataforma é de 50%. A partir daí, a fatia vai diminuindo até chegar aos 35%, uma forma de promover a venda de peças de maior qualidade.

Além de vestuário de mulher, a Retry aceita peças masculinas e de criança © Divulgação

Essencialmente, Camila e Daniela querem garantir oferta para todo o tipo de procura, incluindo vestuário masculino e de criança, embora esta última categoria ainda não esteja presente no site. Se nas primeiras semanas a Retry foi usada sobretudo por quem queria fazer compras, agora as duas frentes do negócio equilibraram-se com o aumento dos utilizadores que querem despachar o que já não vestem. Além de particulares, o conceito passa ainda por firmar parcerias com marcas ou lojas que tenham stocks para escoar.

Camila fala num mercado difícil, para o qual Portugal tem menos abertura do que a generalidade dos países europeus. Contudo o sentimento é também de missão, numa altura em que é fundamental consciencializar os consumidores da urgência em reduzir a pegada ecológica da moda. “A mudança de comportamento vai acabar por acontecer”, confia a designer.

MyCloma. A roupa nunca fica sem destino

Aos 20 anos, Ana Catarina Monteiro personifica uma nova geração, especialmente consciente na hora de comprar. Conta que sempre teve o hábito de se desfazer do que já não veste — tentou vender nas plataformas mais comuns e chegou mesmo a criar um perfil de Instagram, onde muitas pessoas a contactavam com a mesma necessidade. “A maioria da roupa não tem de acabar a sua vida útil só que já não me serve ou porque já não gosto dela”, explica ao Observador.

Há menos de uma semana, nasceu a MyCloma. Uma plataforma online que serve de banca a todos os que pretendem vender a roupa que já não querem e também aos que procuram achados em segunda mão. Contudo, o negócio desta estudante de contabilidade e administração vai além deste modelo simples. Numa clara a aposta na comodidade, as peças são recolhidas em qualquer ponto de Portugal continental. Depois de analisadas, podem ir parar à loja online, com um preço ajustado pela própria empresa, ou resultar numa doação a uma organização que as distribua por quem mais precisa.

O site da MyCloma foi lançado a 28 de junho © Divulgação

“Os pedidos aumentam todos os dias. Já recolhemos cerca de 7.000 peças e 3.000 estão prontas a entrar no site. Em quatro dias, vendemos 20% das peças que tínhamos”, revela Ana. Feitas contas, já cerca de 4.000 peças de roupa e acessórios foram doados, embora não seja essa a via do negócio. São as comissões que tornam o formato rentável — 50% em peças até dez euros, 25% nas que custam até 50 euros e 10% a partir daí.

Com uma equipa de seis pessoas, a MyCloma quer faturar 20 mil euros até ao final do ano e 400 mil nos próximos três. A plataforma já está a vender para Espanha e em breve o serviço de recolha estará disponível também nas ilhas. Objetivos plausíveis, mas que dependem da velocidade a que esta nova consciência conquistar lugar ao preconceito. Nesse campo, Ana mantém-se otimista.

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“As gerações mais novas procuram adotar hábitos mais sustentáveis e um consumo mais consciente. Ao terem a opção de comprar peças a preços mais baixos, em bom estado e às vezes com mais qualidade até, a reação só pode ser positiva”, admite. O referido preconceito ainda está lá — de que a roupa em segunda mãe é “suja” ou está destinada a “pessoas carenciadas”. Uma crise vem sempre pôr tudo em perspetiva. Neste caso, o design do site e a qualidade das fotografias também dão uma ajuda.