Falar (cada vez mais) sobre saúde mental e disponibilizar soluções de apoio psicológico em grupo e mais acessíveis. Foi focado nestes dois princípios que Pedro Marques, de 26 anos, e a sua equipa estão há mais de um ano a desenvolver o projeto da Hug-a-Group: uma app que permite aceder a grupos de apoio moderados por psicólogos, dedicados a várias temáticas — desde distúrbios alimentares, ansiedade ou mindfulness — e tudo feito através de vídeochamada. A aplicação está disponível a partir deste sábado, em que se celebra o Dia Mundial da Saúde Mental.

A abordagem da terapia de grupo, explica ao Observador Pedro Marques, fundador e presidente da Hug-a-Group, é ainda muito encarada como sendo destinada apenas a problemas relacionados com o abuso de substâncias ou álcool.

“É algo que ainda não existe muito na realidade europeia. E há vários estudos que mostram que estes grupos, quando aplicados a temáticas como a ansiedade generalizada ou a depressão, têm resultados muito positivos”, acrescenta.

Pedro, que “desde miúdo” tem problemas de ansiedade e ataques de pânico, sempre soube que queria trabalhar em algo relacionado com a área da saúde mental. Enquanto estava na equipa de vendas da HiJiffy, uma startup de hotelaria, foi desenvolvendo a Hug-a-Group como hobby. “Até que chegou uma altura em que vi que isto podia ter pernas para andar e que podia ser útil. Tive a coragem de me despedir para me dedicar a isto”, explicou.

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Na app da Hug-a-Group há quatro grandes componentes: a terapia de grupo, onde a pessoa pode escolher o tema que lhe é mais próximo e marcar uma sessão moderada por um psicólogo;  a “jornada do bem estar”, que consiste numa série de exercícios de auto-ajuda elaborados por psicólogos para complementar o trabalho feito em grupo; uma comunidade onde o utilizador pode desabafar com outras pessoas e reduzir a sensação de isolamento; e ainda um diário, onde cada um pode escrever o que está a sentir ou a pensar e comparar a sua evolução ao longo do tempo.

A app da Hug-a-Group tem quatro principais componentes: as terapias de grupo, a jornada do bem estar, a comunidade e um diário

Para já, a plataforma conta com 20 psicólogos — e como um dos objetivos da startup é tornar a app acessível ao maior número de pessoas — o preço das sessões é também uma prioridade.

“Segundo a Deco, em Portugal, o preço de uma sessão de terapia individual é em média 55 euros, algo que fica um pouco acima das possibilidades da maior parte dos cidadãos”, explica a Hug-a-Group.

No caso desta plataforma, há planos para uma sessão de terapia de grupo e acesso às restantes componentes por 15 euros e quatro sessões por mês (uma por semana) por 56 euros, o máximo que é cobrado. A primeira consulta é gratuita.

Apesar de estar a ser lançada oficialmente para todos este sábado, a app da Hug-a-Group tem feito vários testes piloto. Foi o caso de uma parceria com uma farmacêutica no Brasil, onde a app foi testada com 40 mulheres desempregadas, entre os 25 e os 39 anos, e também um projeto com a CUF, que ainda está a decorrer e que é destinado a apoiar cuidadores informais, “que nem sempre têm tempo para cuidar da própria sua saúde mental”. Atualmente, a startup é um dos projetos residentes na Casa do Impacto, integrando o Rise, programa de aceleração de inovação social.

“A app é mais uma alternativa barata, comunitária e que pode ter impacto”

Uma das prioridades definidas pela equipa da Hug-a-Group é a privacidade dos utilizadores. É por isso que todos os que se registam na app podem fazê-lo de forma anónima. No início, acrescenta Pedro, é sempre feita uma espécie de “consulta” prévia, para perceber com que tipo de patologias se está a lidar. Mas também isto é feito de forma anónima.

“A pessoa preenche um questionário que tem um instrumento de medição de ansiedade e depressão — um instrumento que é comum em psicoterapia — aí conseguimos perceber mais ou menos com que tipo de patologias estamos a lidar”, esclarece o responsável.

A única altura em que o anonimato é deixado de parte, acrescenta Pedro Marques, é nas sessões de grupo, quando há a relação entre a pessoa, o grupo e o psicólogo. “E é também aí que contamos com o psicólogo, porque ele tem a opção de reportar alguma situação mais preocupante. Se alguém tiver problemas mais graves que não podem ser resolvidos com esta metodologia, eles entram em contacto connosco”, sublinha, acrescentando que a plataforma tem diversos contactos para linhas de ajuda, como é o caso da SOS Suicídio ou de Apoio à Vítima.

A app foi desenhada a pensar na pessoa que tem o primeiro problema de saúde mental, que está à procura de soluções mais baratas e quer perceber melhor como pode resolver os seus problemas. Também pode servir de complemento a quem já faz terapia há anos, mas para situações mais complexas — como esquizofrenia, bipolaridade, problemas que exigem uma intervenção diferente — nós não a recomendamos. Não podemos dizer que vamos resolver todos os problemas da saúde mental. O meu psiquiatra costumava dizer-me que ‘a saúde mental é como ir ao alfaiate: temos que picar vários alfinetes para perceber o que é que funciona’. Pode depender de medicação, de idas ao psicólogo, do tipo de psicólogo, do tipo de intervenção, etc. A nossa app acaba por trazer mais uma alternativa barata, comunitária, e que acreditamos que pode ter impacto”, refere Pedro Marques ao Observador.

Os psicólogos da Hug-a-Group recebem sempre uma formação sobre a linha de trabalho da plataforma e têm ainda de cumprir determinados critérios: estarem inscritos na Ordem dos Psicólogos; terem, pelo menos, três anos de experiência; experiência em intervenção em grupo e ainda facilidade com a tecnologia.

Para celebrar o Dia Mundial da Saúde Mental, a startup está a oferecer um mês gratuito às primeiras 150 pessoas que se registarem, o que inclui acesso a todo o conteúdo interativo da app e a duas sessões de grupo. Para isso, é necessário fazer um pré-registo no site da plataforma. A expectativa, sublinha Pedro, será sempre “gerar o máximo impacto possível, contribuindo para a redução do estigma da ida ao psicólogo e facilitando o acesso a soluções de psicologia”. “Queremos que se continue a falar sobre saúde mental. A pandemia trouxe este tema para cima da mesa, mas tem que continuar”.