A bastonária dos enfermeiros denunciou esta quinta-feira situações de pessoas que estão a ser vacinadas contra a Covid-19 que não têm contacto direto com doentes, classificando esta situação “própria de um país saloio” que tenta vacinar “os amigos da instituição”

A acusação foi feita por Ana Rita Cavaco aos deputados da Comissão Eventual para o acompanhamento da aplicação das medidas de resposta à pandemia da doença Covid-19 e do processo de recuperação económica e social.

A bastonária adiantou que têm chegado à Ordem dos Enfermeiros situações que, apesar de serem pontuais, “são importantes e que se estão a agravar com o início da vacinação dos lares, em que estão a vacinar primeiro pessoas que não têm contacto direto com doentes ao invés de enfermeiros, médicos e assistentes operacionais”.

“Isto é próprio de um país saloio que tenta vacinar aqueles que conhecem, os amigos da instituição, e alguém tem que ir verificar o que é que se está a passar”, apelou numa audição conjunta por videoconferência com o bastonário da Ordem dos Médicos no parlamento.

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Segundo a bastonária, esta situação está a passar-se nalgumas instituições do país, adiantando que a OE já enviou estes relatos para a Assembleia da República e que irá continuar a fazê-lo porque “entende que tem que haver culpados daquilo que acontece”.

Ainda sobre a vacinação, disse que teve conhecimento por uma notícia que há doses disponíveis de vacinas que depois não são adquiridas na totalidade pelo Governo.

Isso é que os senhores deputados devem averiguar porque todas aquelas a que nós temos direito e que estão disponíveis devem ser usadas de imediato porque são a nossa melhor esperança para podermos sair a breve prazo desta pandemia”, defendeu.

Durante a audição Ana Rita Cavaco deixou críticas ao PS pelo chumbo da “justa valorização da carreira” dos enfermeiros.

“Por muito que queiram vir aqui agradecer aos enfermeiros, à exceção do Bloco de Esquerda e do PCP que votaram a favor, os senhores abstiveram-se, mas os enfermeiros não se têm abstido de dar a vida pelas pessoas e pelo país”, salientou.

Portanto, sustentou, é “lamentável que se preocupem em agradecer aos enfermeiros e depois chumbem a justa valorização da sua carreira”.

É evidente que não é por isso que os enfermeiros vão deixar de fazer aquilo que estão a fazer e aquilo que tem de ser feito, mas os enfermeiros terão memória porque é uma vergonha as pessoas terem-se abstido e terem votado contra, quando os enfermeiros não estão nem contra o país, nem se abstêm de fazer aquilo que tem que fazer todos os dias, com péssimas condições porque não chegamos para todos”, vincou Ana Rita Cavaco.

Lamentou ainda o país não ir buscar os mais de 20 mil enfermeiros que estão a trabalhar no estrangeiro e deixar partir 1.230 durante o ano da pandemia, em 2020.

“Tornámo-nos num país que comprou ventiladores, que importou ventiladores e exportou enfermeiros”, sublinhou.

O vice-presidente da OE, Luís Barreira, disse, por sua vez, que os profissionais estão esta quinta-feira confrontados com “o sofrimento ético”.

Um enfermeiro numa urgência para 30 doentes ou um enfermeiro numa unidade de cuidados intensivos para três ou quatro quando o rácio preconizado é de um para um isto leva obrigatoriamente à falta de cuidados de qualidade que os doentes deveriam ter e que obrigatoriamente com este número e com esta afluência de doentes no serviço de urgência é impossível”, lamentou Luís Barreira.

Apelou ainda ao Ministério da Saúde para que crie uma política que permita fixar os enfermeiros e que permita regressar os que estão no estrangeiro.

A Covid-19 já matou em Portugal 9.686 pessoas dos 595.149 casos de infeção confirmados, de acordo com o boletim mais recente da Direção-Geral da Saúde.