O realizador Diogo Costa Amarante estreia, no festival de Berlim, o filme “Luz de Presença”, retrabalhado a partir de outra curta-metragem, enquanto aguarda melhores dias para fazer o próximo filme.

Diogo Costa Amarante volta a ter uma obra em competição no festival de Berlim, quatro anos depois de ter recebido o Urso de Ouro de melhor curta-metragem por “Cidade Pequena”, em 2017. Desta vez, concorre ao prémio máximo da ‘Berlinale’ com “Luz de Presença”, nova montagem e novo processo criativo a partir do filme “O verde do jardim”, que apresentou em 2019, no Festival Curtas de Vila do Conde.

Neste processo, houve muitas alterações, há coisas que foram retiradas, outras adicionadas, há inclusivamente novas imagens que, entretanto, foram produzidas e acrescentadas. Mas há, sobretudo, uma nova estrutura que me permitiu retirar tudo o que era potencialmente dispersivo ou que não era essencial, do ponto de vista da narrativa”, afirmou Diogo Costa Amarante, numa entrevista por escrito à agência Lusa.

Apesar das alterações, o foco central da história está lá: o encontro entre Diana, uma transexual, e um motociclista acidentado, numa paisagem urbana da cidade do Porto, para onde o realizador Diogo Costa Amarante se mudou há uns anos.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Realizador Paulo Carneiro leva força de jovens cabo-verdianos a Festival de Berlim

“Quando cheguei, aluguei uma casa no bairro da Fontinha, uma antiga zona operária que, naquela altura, me pareceu um dos poucos sítios no centro da cidade que ainda resistia à acelerada gentrificação”, recordou à Lusa. Foi nesse bairro que o realizador conheceu Diana Neves Silva, depois de se cruzar todas as noites com ela, à procura de um lugar seguro para estacionar a mota. Foi a pensar nela, meses depois, que decidiu fazer um filme.

Diana era, de facto, alguém que eu gostava de reencontrar todas as noites quando regressava a casa. (…) Apercebi-me que muitas das pessoas que ali moram a veem como uma guardiã do bairro”, afirmou o realizador.

Para Diogo Costa Amarante, “fazer o filme com ela foi um processo espantoso”. “Se no início estava nervosa com a presença da câmara, lembro-me perfeitamente de que, ao terceiro dia, se deu uma transformação mágica e que a Diana se entregou ao filme com grande empenho e generosidade”, elogiou.

“Luz de Presença” é uma ficção e regista o encontro fortuito e a ligação de amizade entre Diana e a personagem Gonçalo, que tem um acidente de mota e um desgosto de amor. Além de Diana Neves Silva, entram João Castro, Gustavo Sumpta e, numa breve participação, Luís Miguel Cintra.

O filme é apresentado esta semana em modo online a profissionais do setor e à imprensa especializada, naquela que é a primeira etapa do festival de cinema de Berlim, este ano condicionado pela pandemia da Covid-19. A segunda parte do festival, de sessões da programação oficial com público e entrega de prémios, foi reagendada para junho.

Diogo Costa Amarante terá o filme em competição em Berlim numa altura em que tem em mãos um doutoramento em Arte Contemporânea e um projeto de longa-metragem, com o título provisório de “Safe only” e cuja produção foi interrompida pela Covid-19.

Muitos dos atores com os quais vou trabalhar têm mais de 80 anos e uma das localizações principais é um lar de terceira idade. Pelo que, nas atuais circunstâncias, foi totalmente impossível avançar com o calendário de produção inicialmente previsto, sobretudo quando é fundamental que a rodagem garanta o mínimo de segurança a todos os envolvidos”, explicou.

Se o processo de desconfinamento correr bem, sem aumento exponencial de novos casos de infeção, o realizador conta começar a filmar “no início do verão”. A situação de incerteza que vivemos tem sido muito exigente para quem trabalha em cinema. É muito complicado, além de dispendioso, organizar toda uma equipa de produção e depois ter subitamente de se suspender tudo de um momento para o outro. Quando as condições necessárias estiverem minimamente asseguradas, arrancaremos com a produção do projeto”, afirmou à Lusa.

Ter um Urso de Ouro no currículo significou “maior visibilidade” para o filme “Cidade Pequena” (2016), uma maior circulação por outros festivais e um estímulo para continuar a fazer cinema, mas Diogo Costa Amarante deixa uma ressalva.

Quando se trabalha, como é o meu caso e de muitos outros realizadores portugueses, numa lógica de produção independente, quando somos nós que escrevemos e produzimos os nossos próprios filmes, não há propriamente portas profissionais que se abram. É um caminho simultaneamente difícil e estimulante. O preço da independência”, disse à Lusa.