Uma “pressão interna brutal”. É assim que no PS se descreve o processo que levou, no espaço de menos de 48 horas, o homem que esteve para ser candidato do partido à Câmara Municipal do Porto — Eduardo Pinheiro, secretário de Estado da Mobilidade — a recuar e desistir da corrida autárquica. Uma decisão com que António Costa já veio dizer-se “totalmente solidário” e até compreensivo, passando para a concelhia e a federação portuenses a responsabilidade de encontrarem agora “uma solução vitoriosa”, num cenário mais caótico do que nunca.

O convite a Pinheiro — que só tinha sido formalizado na terça-feira à tarde, apesar de o secretário de Estado ter sido sondado anteriormente — tinha provocado ondas de choque. Muito por causa da perceção de que a escolha facilitaria um possível acordo futuro com Rui Moreira, um cenário que irritou as bases do Porto e que o autarca do Porto não excluiria.

Já a desistência está a provocar o caos na estruturas, descreve fonte do PS local, que frisa a estranheza da situação: “Minar uma escolha do secretário-geral também é minar o secretário-geral…”.

Escolha de Costa para o Porto divide PS. Possível acordo com Moreira arrepia estruturas

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A mesma fonte atribui a decisão de Eduardo Pinheiro à “pressão interna brutal” que se sentiu desde que, na terça-feira, foi conhecida a escolha articulada entre Pizarro e Costa. A nível local, as bases não estavam satisfeitas com o nome dada a “pouca notoriedade” que lhe reconhecem e à sensação de que, com um candidato pouco conhecido e anunciado a poucos meses das eleições autárquicas, o PS estaria a “desistir” da corrida e a entregá-la a Moreira — com quem Pinheiro teria mais facilidade em chegar a acordo, a colocar-se esse cenário, do que qualquer um dos outros possíveis candidatos.

Pizarro pode ser única solução

Embora a intenção da concelhia não passasse por “obstaculizar” o nome — a estrutura tinha reunião marcada para esta quinta-feira, para discutir a opção que foi apresentada já como dado adquirido — a escolha tinha caído mal. Até porque na concelhia já havia um nome que reunia consenso: o de Tiago Barbosa Ribeiro, presidente da estrutura. No entanto, Barbosa Ribeiro tinha feito saber, nos últimos dias, que já não estaria disponível para avançar, dada a demora no processo.

Também José Luís Carneiro, outro nome que estava em cima da mesa, se tinha retirado da corrida — não só não era consensual entre as bases, até porque chegou a apoiar o rival de Pizarro, José Manuel Ribeiro, numa guerra quente pela distrital portuense, como não agradava a ideia de que a opção por Pinheiro poderia sinalizar que Costa estaria mesmo a apostar num eventual acordo com Rui Moreira.

Pizarro seria outra opção, mas, como recandidato repetente — já concorreu à Câmara do Porto e perdeu duas vezes — havia reservas em voltar a concorrer e acabou mesmo por chegar a acordo com Costa na quarta via que era representada por Pinheiro. Ainda assim, há quem entenda que, com pouco tempo para preparar uma candidatura e uma ‘nega’ pública à escolha que tinha o aval de Costa, Pizarro poderá mesmo ser o único candidato em condições de avançar nesta altura.

No comunicado em que Eduardo Pinheiro confirma a desistência, citado pela Lusa, o governante diz ter recebido o convite “com orgulho”, mas, após “relexão cuidada”, ter decidido “declinar”, sem mais detalhes e assegurando apenas a sua “total disponibilidade para apoiar o partido em torno de uma candidatura alternativa ao atual poder autárquico”.

As fontes locais descrevem agora o ambiente de confusão que se vive, de regresso à casa de partida. Rui Rio foi rápido a ironizar com a situação, recorrendo ao Twitter para sugerir que o PS colocasse um “anúncio no jornal” para encontrar candidato. A batata quente passa agora para a federação, que tinha articulado a escolha com Costa. A um mês do congresso do PS e a três das autárquicas, a divisão é maior do que nunca.

Costa manifesta solidariedade

Em declarações à Lusa, Costa disse “compreender e manifestar total solidariedade ao Eduardo Pinheiro na sua decisão de não aceitar o convite para encabeçar a lista do PS à Câmara Municipal do Porto”, fazendo questão de classificar Pinheiro como “um dos melhores e mais promissores jovens quadros políticos do PS”. Um quadro “já com muitas provas dadas, quer como autarca, quer como membro do Governo, que, para bem do país, continuará a servir”, esclareceu, para frisar que Pinheiro continuará no Executivo.

Os elogios não ficaram por aqui: Costa disse estar “certo de que o futuro de Eduardo Pinheiro será repleto de sucesso” e considerar “uma honra para o PS poder contar com a força da sua militância, lealdade e dedicação”.

E esses elogios não são um pormenor: a escolha de Pinheiro, que surgiu depois de um impasse que se arrastava há meses entre as várias opções em cima da mesa — várias das quais despertavam guerras antigas na estrutura do Porto — tinha aparecido por acordo entre a federação do Porto, liderada por Manuel Pizarro, e o próprio primeiro-ministro. Agora, diz Costa, conforme os estatutos do PS, caberá à concelhia ou à federação encontrar “uma solução vitoriosa”.