Como o título sugere, “Hit & Run” só sabe andar para a frente. Os nove episódios da criação da dupla Lior Raz e Avi Issacharoff, autores de “Fauda” – o melhor thriller israelita a chegar ao Ocidente nos últimos anos, também disponível na Netflix –, sabem que se forem empurrando a carroça de uma conspiração, a audiência fica entretida. O suspense no final de cada episódio torna-se isco para saltar rapidamente para o seguinte. Contudo, o cliffhanger é também um mecanismo de movimento veloz, uma ferramenta para possibilitar um rápido salto narrativo.

A série da Netflix tem estado no Top 10 da plataforma de streaming ao longo das últimas semanas. Aliás, colocou-se ali de imediato, logo após a estreia a 6 de agosto. Tem ganhado também alguma tração internacional e há quem compare o fenómeno ao de “A Casa de Papel” (até porque, quando chegar ao final de “Hit & Run”, perceberá que o caminho só está meio percorrido). A comparação deve-se menos ao conteúdo e mais à forma como usa as ferramentas.

[O trailer de “Hit and Run”]

O protagonista, Segev (Lior Raz), tem na pele a determinação dos lobos solitários de personagens como Jack Bauer (“24”) ou aquelas que Liam Neeson tem interpretado no cinema na última década. Conquista pela convicção de que só precisa de si – mesmo que seja mentira, o que vence é a impressão – e de que sozinho consegue chegar lá. A mensagem passa logo na primeira cena, com Segev na prisão a ser atacado por outros prisioneiros. Apesar de acontecer num momento no futuro em relação à ação principal (no final da cena há um “três semanas antes”), esses minutos com Segev constroem uma personagem nos olhos do espectador. Rapidamente confirmada nos momentos seguintes, pela forma como lida com a família, como guia o carro e como tem uma profissão (guia turístico) que só pode ser um refúgio para um passado negro (o seu físico indica isso). Apesar disto, o Segev que se vê no presente da ficção, em Telavive, é um homem de família.

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A família vai sofrer algumas mudanças em breve. Danielle (Kaelen Ohm), a mulher, é uma bailarina e recebeu uma proposta para voltar a Nova Iorque. Na viagem para o aeroporto, é atropelada – o tal “Hit & Run” – e morre. Apesar de ser súbito, é coisa que se está à espera: está no título. O evento perde impacto porque é menos um acidente e mais um catalisador para o que irá acontecer a seguir. Se “Hit & Run” se movia com muita velocidade até aqui, a partir de agora passa a andar a mil.

A série tem ganhado também alguma tração internacional e há quem compare o fenómeno ao de “A Casa de Papel” (até porque, quando chegar ao final de “Hit & Run”, perceberá que o caminho só está meio percorrido) © DR

Para funcionar, “Hit & Run” tinha de ser frenético. Por ser um conjunto de coisas que estão mais do que vistas, desde o desenho do protagonista, ao oportunismo no aparecimento de novas personagens ou à solução do isto não é o que parece. Por exemplo, o acidente não é um mero acidente, é um acontecimento propositado que parece dizer que está relacionado com o passado de Danielle, para rapidamente montar toda uma história sobre o passado de Segev, para afinal voltar a dizer que é sobre o passado e a família de Danielle.

Ou seja, anda-se à volta do mesmo copo de água, nem meio cheio nem meio vazio, mas tal como “24” queria que o espectador estivesse sempre com os nervos em franja, no jogo do quem-é-quem, “Hit & Run” quer que a audiência volte para cada episódio à procura de algo de novo, mesmo que seja absurdo ou um salto narrativo para o abismo. É aqui que o frenesim de ação entra para colher resultados, a velocidade bloqueia a vontade de pensar: “Hit & Run” torna-se numa guloseima conspirativa.

Lior Raz carrega bem Segev, o protagonista que tem de tornar tudo isto minimamente credível e, ao mesmo tempo, comunicar ao espectador de que ele importa, que no meio destas voltas todas, a sua missão, a mulher que morreu e a filha que deixa em Telavive, são motivos suficientes para quem está deste lado preocupar-se, manter-se atento e querer ir até ao fim desta dumb fun que é “Hit & Run”.