O futuro da mobilidade nas cidades portuguesas deve passar pela equidade do espaço público, servindo todas as pessoas e com liberdade de escolha do modo de transporte, defende a MUBi – Associação para a Mobilidade Urbana em Bicicleta.

“Os municípios, de um modo geral, hoje em dia têm um grande desafio pela frente, não é apenas a questão climática que está na ordem do dia, mas é também uma questão de equidade do espaço público”, declara António Pedro, membro da direção da MUBi, em declarações à agência Lusa a pretexto das eleições autárquicas de 26 de setembro, numa reflexão sobre os desafios do poder local nos próximos anos.

Para tentar chegar junto das candidaturas às autarquias, a MUBi lançou o manifesto “Cidades Vivas”, com 10 medidas para devolver a cidade às pessoas, considerando que as eleições autárquicas representam uma oportunidade para os municípios assumirem “um amplo e firme compromisso por uma mudança de paradigma nas políticas urbanísticas e de mobilidade”, priorizando as deslocações a pé e em bicicleta, o transporte público e os sistemas de mobilidade partilhada, em detrimento da utilização do automóvel individual.

A MUBi promove o uso da bicicleta, mas a visão da associação é para “uma sociedade mais saudável, mais segura, mais confortável e mais inclusiva”, refere António Pedro, adiantando que as medidas propostas aos candidatos a futuros autarcas estão organizadas em quatro grandes domínios: planear o futuro, proteger o dia a dia, desenhar para todos e ativar a mobilidade.

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O planeamento do futuro inclui “elaborar e implementar um plano de mobilidade urbana sustentável como um documento orientador dos investimentos”, com a preocupação de reduzir as desigualdades territoriais e sociais, ou seja, com políticas públicas para “garantir que existe uma redistribuição equitativa no território – não pode haver apenas um investimento nas zonas mais ricas ou nas zonas mais centrais, tem de haver também um investimento nas zonas mais desfavorecidas” e é preciso ter mecanismos para garantir a participação pública dos cidadãos.

Para a MUBi, “é inaceitável a perda de vidas humanas resultantes do tráfego automóvel”, pelo que se propõe a redução do volume de tráfego motorizado, assim como a adoção de velocidades máximas de 30 quilómetros por hora (km/h) em zonas urbanas.

“O espaço público deve ser de todos e para todos, portanto, promover ações para melhorar a segurança dos utilizadores mais vulneráveis, melhorar o acesso universal a todas as infraestruturas e serviços de mobilidade. Queremos uma cidade que sirva todas as pessoas, com todo o tipo de mobilidade e com a liberdade de escolher o seu modo de transporte, e não empurrar as pessoas para situações em que têm de utilizar o transporte motorizado, porque simplesmente é aquele que é mais seguro ou que é mais racional nas suas deslocações”, explica António Pedro.

A associação considera ainda que é preciso incentivar uma mobilidade ativa, seja andar a pé ou de bicicleta, em complemento ao transporte público, “não só por uma questão de saúde, para fazer com que as pessoas tenham a atividade física que devem ter, mas também para terem um modo de transporte mais sustentável e ajustado ao seu dia a dia”.

A mudança de paradigma associado à cultura de mobilidade exige “vontade e coragem política”, indica o representante da MUBi, referindo que “a maioria das pessoas está disponível para utilizar mais a bicicleta no seu dia a dia ou iniciar a sua utilização, andar mais a pé e usar transportes públicos, no entanto a principal razão pela qual não o fazem ou não o fazem mais, com mais frequência, é a questão da segurança”.

“As nossas estradas, as nossas ruas, têm de ser seguras e o seu desenho tem de prevenir os acidentes, tem de prevenir o excesso de velocidade”, afirma António Pedro, acrescentando que a sensibilização e a fiscalização são importantes, mas “é fundamental o foco na infraestrutura”.

A redução da velocidade, indica, consegue-se com ruas um pouco mais estreitas, passadeiras sobrelevadas e cruzamentos desenhados de maneira a dar maior visibilidade do condutor em relação aos peões: “Isto são tudo questões que envolvem um repensar a cidade, que foi nos últimos anos desenhada para os automóveis e neste momento tem de ser desenhada com o foco nas pessoas.”

O ciclista explica que “até 30 km/h a probabilidade de morrer num atropelamento é de 20%”, mas no caso de se ser atropelado a 50km/h, que é o limite nas cidades, ainda que “muito pouco cumprido”, a probabilidade de morrer sobe para 80%.

Além de diminuir o risco de mortalidade em acidentes rodoviários, a redução da velocidade vai ter impacto imediato na diminuição da poluição do ar e da poluição sonora, aponta António Pedro.

O representante da MUBi reforça que “não se trata de retirar o automóvel da cidade, trata-se é de redistribuir de forma mais equilibrada o espaço que foi em demasia atribuído ao automóvel e que neste momento tem de ser redistribuído, novamente, para as pessoas”.

Dando como exemplo o caso de pais que levam os filhos à escola de carro quando podiam ir a pé porque têm receio que as crianças sejam atropeladas, o dirigente comenta que se está, constantemente, num círculo vicioso em que os cidadãos andam todos de carro para se protegerem uns dos outros, dos carros uns dos outros. E este cenário, apela, tem de terminar.