Não houve propriamente falta de compromisso, não se pode dizer que a entrega não foi total, não será justo sequer dizer que não foram criadas oportunidades suficientes para encontrar um desfecho diferente, mas o FC Porto, no dia seguinte à promessa de aposta total no triunfo na Taça da Liga para quebrar a maldição da única prova que Pinto da Costa nunca ganhou, perdeu mesmo com o Santa Clara nos Açores e foi eliminado da Final Four, vendo assim cair o primeiro objetivo da época. Ainda assim, e ao contrário do que aconteceu noutras ocasiões, a reação de Sérgio Conceição reconheceu o mérito açoriano mas virou atenções para a frente, assumindo que poucas coisas mudaram na preparação de um ciclo que tinha agora um dérbi.

“É sempre igual porque nada do nosso estado de espírito pode interferir na preparação para o jogo. Para mim é mais difícil porque não ando tão bem disposto. Os jogadores já me conhecem… Ninguém anda aqui para ser simpático, mas sim para sermos profissionais e fazermos o melhor pelo clube. Neste jogo com o Boavista há que perceber o que vamos fazer para superar o adversário, o estado de espírito não interfere na preparação”, deixando um aviso aos jogadores sobre o que nunca pode faltar em qualquer cenário.

“O espírito de compromisso tem de estar sempre no nosso dia a dia e quem não o tiver claramente não acompanha aquilo que é a equipa. Há características básicas e fundamentais no futebol. O estar alerta dentro do jogo, pensar que cada lance do jogo não pode ser decisivo.. Isso é básico e quem não tiver isso…. Tivemos seis ou sete ocasiões para não perder aquele jogo mas o Santa Clara, pelo que fez, mereceu ganhar o jogo. Dentro desse compromisso que tem de estar no nosso dia a dia, quando não sentem esse compromisso, ficam de fora”, referiu, antes de uma tirada mais humorada mas com muito de sério.

Questionado sobre uma publicação de Grujic, que após a partida nos Açores escreveu que no FC Porto ou se ganha ou se aprende, o treinador mostrou-se quase surpreendido com a tirada mas elogiou a mesma e recordou um nome de peso no universo azul e branco. “O Grujic está um filósofo incrível… Muito interessante, muito interessante… Mas é por aí, ele tem razão. Não sou muito adepto das redes sociais mas se ele disse isso acho interessantíssimo. Acho que é uma frase à Pedroto. Aqui ‘ou se ganha ou se aprende’, isso é uma verdade”, destacou, aludindo ao técnico que está muito na génese do que é o “ADN FC Porto”.

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Era neste contexto que chegava a receção ao Boavista, que não ganhava há seis jogos mas numa série onde tinha averbado apenas uma derrota (na Luz), na antecâmara de uma deslocação a Itália para defrontar o AC Milan que terá um peso quase decisivo no futuro dos azuis e brancos na Liga dos Campeões. E era desta forma também que assinalava um ano sem derrotas do FC Porto no Campeonato, depois daquele desaire em Paços de Ferreira onde um nome em particular fez muita falta à equipa azul e branca: Pepe. O mesmo Pepe que cumpria o 200.º encontro no Campeonato depois de ter passado mais de uma década no estrangeiro entre Real Madrid e Besiktas no seguimento da primeira passagem que teve pelo Dragão.

Mais uma vez, o central mostrou toda a importância que tem na equipa aos 38 anos, pela forma como vai comandando toda a equipa e fazendo a extensão de Sérgio Conceição em campo. E ainda houve grandes exibições de Evanilson, que bisou pela primeira vez no Campeonato, e de Vitinha, um verdadeiro pêndulo no meio-campo dos azuis e brancos. No entanto, e mais uma vez, Luis Díaz e Taremi foram os fatores mais desequilibradores em termos ofensivos, somando nesta altura 14 golos (sete cada) que são tanto ou mais do que todas as equipas da Primeira Liga à exceção do Benfica entre várias outras assistências que só esta noite foram quatro numa noite que terminou em goleada e que Danny Loader não mais esquecerá.

Com Marcano em dupla com Pepe, Vitinha no meio-campo com Uribe e Evanilson de novo titular com Taremi na frente, o FC Porto teve uma entrada muito forte no dérbi, controlando todos os aspetos do jogo e obrigando Alireza a quatro defesas nos primeiros 13 minutos quando três dos seus companheiros ainda não tinham sequer tocado na bola. Como? Muito critério na construção com Uribe e sobretudo o talento de Vitinha, uma pressão alta que sufocava a saída dos axadrezados e a magia de Luis Díaz e Taremi na frente, com movimentos diferentes mas igualmente capazes de furarem a muralha contrária. O golo era quase um cenário inevitável, surgindo pela cabeça de Luis Díaz no meio dos centrais depois de uma jogada na direita entre Uribe, Otávio e João Mário perante a passividade visitante sobre o portador da bola (18′).

Quando o Boavista fazia três/quatro passes no meio-campo ofensivo, ficava sempre a dúvida do porquê de não jogar mais. É certo que o FC Porto tinha grande mérito pela forma como condicionava a saída contrária mas os axadrezados também faziam pouco ou nada para esticarem o jogo e aproveitarem os jogadores mais virtuosos no setor ofensivo mas bastou apenas um remate para tudo mudar, com Hamache a encher-se de fé e a rematar cruzado de pé esquerdo fora da área para o empate (30′). Quando os dragões dominavam a partida como queriam, acabaram por ser surpreendidos à “bomba” e o cenário só não piorou mais porque Musa, na sequência de uma transição rápida, permitiu a Diogo Costa brilhar e evitar a reviravolta (36′).

Em pouco mais de cinco minutos, e mesmo sem ter perdido o controlo do jogo, os azuis e brancos passaram da vantagem ao risco de desvantagem. Também aqui, o grande demérito do Boavista acabou por vir ao de cima, pela forma como não conseguiu aproveitar esse momento em que ficou na frente em termos anímicos e sofreu ainda antes do intervalo: numa grande combinação com Taremi a assistir Evanilson nas costas da defesa axadrezada, o brasileiro apareceu na área descaído sobre a esquerda e rematou em jeito para o 2-1 (41′), sendo que ainda no período de descontos Alireza evitou mais um golo, neste caso de Uribe.

Em busca de uma maior solidez na recuperação e na saída, João Pedro Sousa trocou Reymão por Seba Pérez mas bastou pouco mais de um minuto para aquilo que poderia ou não ser uma boa estratégia ruir com a sensação de dejá vu: Taremi voltou a entrar num espaço entre linhas e com possibilidade de se virar sem marcação por perto, fez o passe de rutura para Evanilson e o brasileiro atirou de pé esquerdo para o 3-1 (47′). O FC Porto percebia como, quando e onde podia fazer a diferença em termos ofensivos, jogando com nota artística para criar mais situações de perigo junto da área do Boavista até mais um lance em que o Dragão ficou a pedir penálti não sancionado sobre Taremi (que parece tocado na perna direita, à semelhança do que tinha acontecido no primeiro tempo com Evanilson). Aos 60′, o jogo “acabara”.

Apesar de uma situação com perigo ainda criada pelo Boavista e de algumas saídas do FC Porto que podiam ter conhecido outro desfecho, os três cartões amarelos em minutos consecutivos a Pepe, Otávio e Taremi deram lugar a uma versão menos conseguida do jogo para as três equipas, sobretudo até a de Tiago Martins na arbitragem com uma série de erros nas áreas sem que o VAR liderado por Nuno Almeida alterasse essas decisões, tanto que Sérgio Conceição optou por tirar o iraniano dizendo de uma forma percetível no banco “Nem vale a pena, nem vale a pena, isto é uma vergonha”. Haveria apenas tempo para uma estreia de sonho de Danny Loader, avançado inglês da equipa B que fechou as contas da goleada no sexto minuto de descontos de calcanhar após mais um grande trabalho de Luis Díaz na esquerda.