Esta quarta-feira, na Web Summit, referida como a maior conferência de tecnologia e empreendedorismo da Europa, Craig Federighi apresentou-se com o estilo a que habituou quem acompanha os eventos de lançamento dos iPhone e Macbook — um farto cabelo grisalho de risca ao lado e a já icónica camisa azul. E, como de costume, as palavras de ordem do vice-presidente de engenharia de software da Apple foram “segurança” mais “dados [pessoais]”. Contudo, a vinda de Federighi a Portugal não foi inocente na tentativa de convencer a plateia que a União Europeia pode criar uma lei que vai deixar “todos os smartphones inseguros”. Como o fez? Com uma “analogia imperfeita” para defender o ecossistema fechado de software da sua empresa.

Segundo o responsável dos sistemas operativos da empresa, como o iOS, o iPadOS ou o macOS, quando se compra uma casa para a família a “principal preocupação é a segurança”. Por isso, se se “encontrasse uma falha grave” — como uma porta traseira para deixar encomendas, exemplificou — ficávamos preocupados porque não estávamos a proteger quem amamos. Fazendo uma comparação, disse: “escolher uma casa é como escolher um telemóvel”, continuou Federighi, lembrando que estes equipamentos “têm todos os dados pessoais”.

A tal “analogia imperfeita”, como a apelidou Federighi, serviu para justificar que uma possível nova legislação europeia levou a Apple a ter um dos seus principais responsáveis na Web Summit. Atualmente, discute-se em Bruxelas se se deverá impor que as tecnológicas sejam obrigadas a deixar que os utilizadores descarreguem software para dispositivos não passando por barreiras criadas pelas empresas, como a App Store, a loja de aplicações da Apple. O nome dado a este mecanismo é “sideloading” e, disse o vice-presidente da empresa no palco principal da Web Summit, pode fazer aumentar o cibercrime.

“Mesmo antes de o iphone existir as pessoas estavam familiarizadas com este problema”, referiu. Depois, defendeu que a Apple, ao obrigar que os programadores e utilizadores tenham de passar pelo crivo da App Store, está a “proteger as pessoas”. Federighi não referiu que isso permite à empresa que ajuda a liderar cobrar taxas extra que têm sido bastante contestadas — tem sido acusada de fechar demasiado o seu software.

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Não obstante, o argumento mostrou-se forte para uma audiência que o aplaudiu no fim: “O ponto único [App Store] de distribuição de software”, que incluiu “revisão por humanos reais”, garante que “não há falhas”, defendeu.

Mesmo com um tema que não tem uma resposta certa, o executivo da Apple teve a audiência do seu lado enquanto esteve em palco. A certo momento, Federighi até pergunta ao público quem tem um iPhone e para ligar a lanterna e apontar para o palco. De repente, a sala enche-se de luzes. Visivelmente surpreendido, o vice-presidente diz: “Bem, mas na Europa são menos — há um iPhone por cada smartphone“.

Não há um sistema de segurança perfeito, mas conseguimos ficar um passo à frente de quem quer fazer mal”, defendeu Federighi.

Com este novo argumento, Federighi afirmou que o mercado já oferece um sistema aberto, como é o caso do Android, da Google. Mesmo assim, criticou algumas falhas deste software. Segundo o informático, o Android, por ser mais aberto, mas também mais utilizado, é mais propenso a que piratas informáticos explorem as suas vulnerabilidades. Situação que é menos comum no iOS, argumentou.

Não é fácil tentar criar uma plataforma aberta enquanto se tenta protegê-la”, disse o vice-presidente da Apple.

Craig Federighi referiu também: “O nosso objetivo nunca foi vender o máximo”. Por isso é que, argumentou, há outros sistemas operativos. Contudo, segundo o executivo, se uma lei que permite o sideloading passar, cria-se “uma porta secundária de casa” que “pode ser explorada”. “Os legisladores querem dar mais escolha aos consumidores, mas o sideloading será um passo atrás”. “Vai abrir uma caixa de pandora de software não revisto”, concluiu.

A Web Summit arrancou na segunda-feira novamente em formato presencial depois de um ano em que foi totalmente online. Até quinta-feira, ainda passarão pelo Altice Arena e pela FIL nomes como Tim Berners-Lee, inventor da Web. Este ano, devido à pandemia de Covid-19, há várias restrições.