A quarta-feira de Rui Costa, presidente do Benfica, começou, continuou e terminou mal. Durante a manhã, o movimento “Servir o Benfica”, do outrora candidato Francisco Benítez, solicitou uma reunião para esclarecer a auditoria forense à SAD encarnada e constituição de assistente no processo Cartão Vermelho. Depois, antes da receção ao Gil Vicente, um grupo de adeptos contestou a direção encarnada nas imediações da Luz. Por fim, o Benfica perdeu, ficou a 12 pontos do FC Porto e as bancadas uniram-se em cânticos de insulto e reprovação ao presidente eleito em outubro.

Uma equipa sem voz que se mexe ao som de silêncio e pouca gente (a crónica do Benfica-Gil Vicente)

Os três fatores, todos juntos, têm um único significado: atualmente e depois da saída de Jorge Jesus, a massa adepta do Benfica responsabiliza Rui Costa e não Nélson Veríssimo pelos maus resultados. Os encarnados ainda não conseguiram ganhar duas vezes seguidas para o Campeonato sem Jesus, levam três jogos consecutivos sem vencer nos 90 minutos e já estão, pelo menos de forma teórica, totalmente arredados das contas do título. Ou seja, e já sem Taça de Portugal e Taça da Liga, a época do Benfica vai novamente terminar sem troféus e está agora reduzida aos oitavos de final da Liga dos Campeões contra o Ajax e à réstia de esperança de ainda chegar ao segundo lugar.

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O Benfica chegou à quarta derrota para o Campeonato, o mesmo número que registou em toda a época passada, sendo que três delas foram no Estádio da Luz. Os quatro desaires à 20.ª jornada são mesmo a pior marca dos encarnados desde 2010/11 e a equipa de Nélson Veríssimo perdeu 22% dos jogos realizados até agora, sendo que em 37 partidas sofreu um total de 39 golos. O treinador não compareceu na flash interview e, cerca de 40 minutos após o apito final, a BTV anunciou que seria “o Benfica” a reagir à derrota na sala de imprensa. Uma hora depois do fim da partida, acabou mesmo por ser Veríssimo a dar a cara na conferência.

“Antes de mais, quero pedir desculpa à BTV por não ter comparecido na flash. Estivemos reunidos no balneário, o presidente quis dizer umas palavras relativamente ao jogo. Independentemente da questão das oportunidades que possamos ter tido, temos de reconhecer que não estivemos bem. Obviamente, perdemos em casa, é o que fica e não quero escudar-me nas oportunidades. Temos de reconhecer que a equipa não esteve ao nível esperado e desejado e que estes jogadores têm qualidade e capacidade para fazer mais. Mas a responsabilidade por essa falta de dinâmica e controlo do jogo, em muitos momentos, é minha”, começou por dizer o técnico, revelando então que Rui Costa desceu ao balneário após o apito final para “expressar as ideias que tem relativamente à equipa”. “Temos de ouvir, aceitar e dar uma resposta”, acrescentou.

Em seguida, Nélson Veríssimo acabou por deixar críticas à arbitragem de Artur Soares Dias — principalmente no que toca ao golo anulado a Otamendi, ainda dentro dos primeiros 10 minutos e quando o resultado estava a zeros, por uma eventual falta ofensiva de Vertonghen. “Muito sinceramente, gosto muito de me focar no que é o jogo: o Gil Vicente ganhou e ponto final, fez dois golos e nós só fizemos um. Mas é difícil explicar por que é que, aos cinco ou seis minutos, é anulado um golo. Para que é que serve o VAR, então? É difícil entender. Houve claramente uma falha hoje. Se há VAR, deixamos seguir o lance até ao final. Na nossa opinião, é um golo limpo que é anulado”, atirou, garantindo depois que compreende a insatisfação manifestada pelos adeptos durante e depois do jogo.

“É óbvio que compreendemos. E temos de compreender e aceitar. Temos de reconhecer, e esse pode ser o ponto de partida, que não estamos num momento bom. Temos de ter essa capacidade para dar a volta. Olhando para a qualidade dos nossos jogadores, sentimos que há margem para crescer. Obviamente que a tranquilidade vai ser encontrada com resultados positivos e é disso que andamos à procura. Quanto a tudo o resto, estou tranquilo. Sei que temos uma tarefa difícil mas aliciante. Nunca fui de virar a cara à luta e estamos aqui para as próximas batalhas”, terminou Veríssimo, confirmando ainda que João Mário e Rafa não foram titulares essencialmente por uma questão de gestão de esforço, até porque o avançado acabou de recuperar da Covid-19.

Quase duas horas depois do final do jogo, numa nova declaração sem direito a perguntas dos jornalistas, Rui Costa apareceu na sala de imprensa do Estádio da Luz e deu a cara pelo momento da equipa, deixando também uma posição firme relativamente à arbitragem. “Quero, enquanto presidente do Benfica, assumir a responsabilidade pelo mau momento da equipa e até este momento do próprio clube, onde nenhum benfiquista quer estar envolvido. Nenhum de nós quer estar na situação em que estamos hoje. Assumo essa responsabilidade enquanto presidente mas exijo que nenhum de nós se esconda a isso. Os profissionais que trabalham no Benfica, dentro e fora de campo, que não se escondam a este momento. É uma exigência que faço. Sabia perfeitamente, quando assumi a liderança deste clube há quatro meses, o quanto tinha de fazer para voltar a pôr este clube onde todos os benfiquistas querem. Sei perfeitamente qual é o caminho que quero dar ao clube”, começou por dizer, alargando depois o discurso às queixas sobre os critérios de arbitragem, principalmente sobre o golo anulado esta quarta-feira a Otamendi.

“Mas uma coisa é o que não estamos a fazer dentro de campo, o que temos de fazer muito melhor. Outra coisa é o que nos estão a fazer dentro de campo. E aí sei separar bem as águas, até porque estive lá dentro muitos anos. Temos de ser muito melhores. Mas isso não invalida que não exponha aqui aquilo que nos estão a fazer dentro de campo. Até ao dia de hoje, tentei manter uma postura construtiva do futebol português — até para prejuízo próprio, uma vez que os nossos adeptos se sentem prejudicados e até hoje não me ouviram falar da arbitragem. Tentei ser correto, é uma das minhas missões no futebol. Mas estou aqui para defender o Benfica e o Benfica não está, de todo, a ser defendido dentro de campo, se bem que não quero que nos beneficiem. Mas são casos a mais continuar calado e até peço desculpa aos nossos adeptos por ainda não ter falado”, continuou.

“Basta ver o que se passou hoje neste estádio. E repito que nada elimina o que não estamos a fazer dentro de campo. Mas basta ver o jogo do Estoril, quando empatámos no último minuto. Basta recordar o que se passou com o Moreirense. O primeiro golo no Dragão com o FC Porto. Até ao golo de hoje, o golo anulado ao Otamendi por falta do Vertonghen, que nem chegou ao VAR. Com o mesmo critério, e bem pior, não se assinalou penálti sobre o Otamendi. É hora de dizer basta. Exijo este respeito, exijo que o Benfica seja respeitado dentro de campo. Já não é só uma questão de VAR ou não VAR, porque hoje nem chegou ao VAR para ser analisado. Acabou por ser evidente demais. Uma coisa não invalida a outra: assumo aqui a responsabilidade por tudo o que se está a passar e por aquilo que a equipa não está a fazer. Mas não vamos continuar a esconder o que nos estão a fazer dentro de campo. Basta!”, prosseguiu Rui Costa.

“São casos a mais e casos demasiado flagrantes. Para ficar claro, sei que não é um momento fácil para nenhum benfiquista. Aquilo que peço é difícil — mas já nos basta aquilo que nos estão a fazer dentro de campo, a devassa pública que estão a fazer diariamente ao Benfica na tentativa de nos desunir cada vez mais. Mas não vai ser isso que vai quebrar a minha vontade. Peço que estejamos cada vez mais juntos. Só todos juntos conseguimos sair deste momento. É um momento delicado, onde há pouca confiança. Mas há um futuro à nossa frente onde sei que todos queremos chegar. Sabemos o que temos de mudar, sei o que estou a fazer, sei das dificuldades que estamos a atravessar. Só todos juntos podemos sair deste buraco. Já basta o que nos estão a fazer lá fora diariamente”, terminou o presidente encarnado.