Abel Ferreira não o disse dizendo. “A final será o David contra Golias. Nunca vendi ilusões a ninguém. Vamos ver quem será o adversário. Conheço muito bem o treinador português [Leonardo Jardim], trabalhei com ele, é um amigo. Falo do próximo jogo quando sair o adversário. O que controlamos está feito”, referiu o técnico português depois do triunfo do Palmeiras frente aos egípcios do Al Ahly na meia-final do Mundial de Clubes. Sem o dizer, o que o campeão sul-americano disse era que esperava encontrar o Chelsea e não o Al Hilal no encontro decisivo da prova. Ele e 99% pensariam assim. Mas era no outro 1% restante que os campeões da Ásia se focavam em busca da maior surpresa de sempre da competição. Antes, já tinham feito história.

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“É injusto que algumas equipas tenham de jogar quatro jogos em oito dias, enquanto outras, que são as melhores, só precisam disputar dois e estão bem mais descansadas. Acho que devemos organizar melhor o calendário, com mais dias de recuperação para que as equipes da Ásia e da América do Norte e Central tenham mais hipóteses. Também acho que a partida teria sido diferente se o Al Jazira tivesse descansado. Tenho a certeza de que as equipas europeias, e neste caso o Chelsea, são claramente favoritas, disso não há dúvidas, mas também têm uma vantagem acrescida, pois só temos dois dias de recuperação”, lamentara o técnico português depois da goleada por 6-1 diante do conjunto dos EAU orientado pelo também ex-Sporting Marcel Keizer, naquele que foi o resultado mais volumoso de sempre no atual formato.

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Jardim apontou para o desgaste do adversário que o acabou por beneficiar nos quartos mas sabia que iria agora sofrer do mesmo nas meias. Mais do que isso, sabia que a diferença de valores no plano individual e do coletivo era bem maior em relação ao Chelsea do que foi com o Al Jazira ainda que com essa ligeira vantagem de saber que os campeões europeus não poderiam contar com o técnico principal, Thomas Tuchel, no banco de suplentes por estar ainda em isolamento após ter contraído Covid-19 e dar lugar ao adjunto Zsolt Low (mantendo-se a dúvida se poderia marcar depois presença na final em caso de triunfo com os sauditas).

Muito elogiado na antecâmara do encontro pela imprensa estrangeira, como aconteceu com os brasileiros do Globo que falavam num “quase novo Mourinho” muito pretendido por clubes sul-americanos (sobretudo do Brasil), Leonardo Jardim teria aquele que seria o seu maior enquanto treinador no plano internacional, num teste a uma filosofia que ainda hoje várias publicações recordam da “gestão GALO: Gestão Andando de um Lado para o Outro”. Durante uma hora, o plano falhou. Porque o Chelsea foi melhor, porque a defesa foi cometendo vários erros individuais e coletivos, porque a equipa nunca conseguiu ter bola e explorar os seus pontos fortes. Depois, e em menos de dez minutos, o Al Hilal somou três oportunidades soberanas e só com o melhor Kepa na baliza a vantagem mínima aguentou até ao final num triunfo justo mas com boa réplica.

A vontade do Al Hilal ficou bem expressa com pouco mais de 20 segundos de jogo decorridos, com Ighalo a receber a bola ainda muito longe da baliza mas a arriscar um remate que saiu muito por cima da baliza de Kepa (Mendy, campeão africano pelo Senegal, chegou a tempo mas foi suplente). No entanto, essa seria uma exceção a uma regra que se ia confirmando com o passar dos minutos: o Chelsea era melhor, aproveitava os erros defensivos e posicionais da defesa dos sauditas para ir somando oportunidades e ficou perto do golo por Ziyech (10′, ao lado) e Lukaku (26′, defesa de Al-Maiouf) entre vários outros lances em que a bola passou perto da baliza sem desvio final. De quando em vez o Al Hilal ainda tentava fazer uma saída com mais perigo mas poucas eram as oportunidades para isso perante o bom jogo sem posse também dos ingleses.

A vantagem parecia ser uma questão de tempo e chegou pouco depois da meia hora em mais uma jogada com culpas do Al Hilal à mistura: Kovacic conduziu pela esquerda uma saída rápida, Kai Havertz conseguiu à segunda tentativa fazer o cruzamento e Al-Shahrani acabou por amortecer de forma involuntária a bola para Lukaku que fuzilou na pequena área (32′). Al-Dawsari ainda teve dois remates até ao intervalo (um muito por cima, outra fraco para Kepa) mas o Chelsea dominava por completo o jogo sem conceder facilidades.

Se esse tinha sido o espelho da primeira parte, o segundo tempo começou da mesma forma e com Havertz, aproveitando mais um erro agora do lado direito da defesa dos sauditas, a arrancar para a área e a acertar no poste da baliza de Al-Maiouf (48′). Mohamed Kanno ainda tentou a meia distância (52′) mas as principais unidades ofensivas do Al Hilal continuavam com pouca bola e longe do contexto onde poderiam criar perigo, fosse Matheus Pereira nas transições em posse, fosse Marega na profundidade, fosse Ighalo mais na área. E quando isso aconteceu, apareceu Kepa: Matheus Pereira isolou Marega na área descaído sobre a direita e o maliano atirou para defesa do espanhol (63′); Kanno voltou a ter um remate de fora da área para nova grande defesa (68′); e Matheus Pereira tentou também de pé esquerdo a rasar o poste da baliza dos ingleses (70′). O melhor período do jogo esfumava-se e o Chelsea iria mesmo segurar a vantagem mínima até ao final.

“Os jogadores revelaram empenho, uma boa atitude e o jogo foi decidido num detalhe. Demos uma boa imagem do futebol da Arábia Saudita e da nossa qualidade. No segundo tempo fomos mais ofensivos, controlámos melhor o jogo, o adversário baixou a intensidade mas infelizmente não conseguimos o objetivo, que era ganhar”, comentou o treinador português ao Canal 11 no final do encontro.