O investigador guineense Wilson Te considerou que o último golpe de Estado na Guiné-Bissau, há dez anos, deu azo a entusiasmo, mas depois veio a desilusão, e concluiu que desde então “nada mudou para bem”.

“Os guineenses viveram este período entre entusiasmo e desilusão”, disse o investigador do Instituto Português de Relações Internacionais (IPRI) da Universidade Nova de Lisboa, em declarações à Lusa a propósito dos 10 anos do golpe de Estado de 12 de abril de 2012, que depôs o Presidente da República interino, Raimundo Pereira, e o primeiro-ministro, Carlos Gomes Júnior, em pleno período eleitoral.

O entusiasmo, contou, ocorreu quando o Partido Africano para a Independência da Guiné e Cabo Verde (PAIGC) ganhou as eleições legislativas com maioria absoluta, em 2014, “mas mesmo assim decidiu formar um Governo de inclusão” que juntava todos os partidos com a representação parlamentar.

Foi “uma coisa inédita” na Guiné-Bissau, afirmou.

“Mas o entusiasmo acabou por se transformar numa desilusão, com a demissão do mesmo Governo um ano depois”, lembrou Wilson Te, considerando que, desde então, “praticamente nada mudou para bem”.

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“Eu poderia até dizer que, em vez de crescer, voltámos um pouco para trás. (…) Não mudou para o bem, mas sim para o pior”, afirmou.

O investigador responsabiliza por esta desilusão “um grupo de pessoas que não conseguem viver fora do poder”.

Outro motivo para a instabilidade política na Guiné-Bissau é que “um dos pilares da democracia não funciona: a justiça”.

“Falta de aplicação da justiça e falta de observância da Constituição da República”, apontou.

Questionado sobre se seria preciso alterar a Constituição para resolver o problema, Wilson Te disse que “o problema não está na Constituição da República. O problema está nas pessoas”, que não a cumprem.

Exemplificou com o facto de o Presidente da República, Umaro Sissoco Embaló, ter afastado o Governo do PAIGC, que tinha ganhado as eleições de 2019, e nomeado um Governo liderado por um partido que tem apenas cinco deputados, quando a Constituição diz que o primeiro-ministro é nomeado pelo Presidente da República “tendo em conta os resultados eleitorais e ouvidos os partidos políticos representados na Assembleia Nacional”.

Por outro lado, disse que o chefe de Estado “diz claramente que é o único chefe da Guiné-Bissau, enquanto na Constituição há separação de poderes”.

Admitindo que a Guiné-Bissau tem “problemas sérios”, Wilson Te disse acreditar que a solução para o país está nos guineenses e que passa por “conversar e tentar ultrapassar os impasses”.

“Na democracia há duas coisas importantes, a observância da lei e o diálogo, que é muito importante. Agora não querer diálogo com ninguém, isso não resolve problema nenhum”, disse.