Dois golos de Tammy Abraham, um de Lorenzo Pellegrini, a vaga na próxima Liga Europa garantida. Na última jornada da Serie A, disputada fora com o Torino, a Roma não facilitou e assegurou a sexta posição do Campeonato naquela que foi a época de estreia de José Mourinho no comando da equipa. No final, o técnico português não falou. Não fez balanços. Não enalteceu a posição ocupada, não relativizou o lugar em que terminou. O foco estava apenas e só na Conference League, a competição que desde o início se tornou o grande objetivo da temporada. Por ser a primeira edição, por ser a possibilidade de garantir para os romanos uma conquista europeia, por ser aquela onde teria na teoria mais hipóteses de se assumir como um candidato, por ser a oportunidade para voltar aos títulos sendo já um dos técnicos mais titulados.

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“O meu carisma não vai fazer diferença e a experiência também não vai ajudar. Esperava que sim mas sinto exatamente a mesma coisa que senti quando estava a preparar a primeira final na carreira. Tudo o que quero fazer é ler o jogo da melhor maneira e ajudar a equipa. Vamos ter de fazer tudo o que estiver ao nosso alcance para conseguir ganhar. Não acredito em poções mágicas, apenas no trabalho da minha equipa e quanto a isso, aconteça o que acontecer, sei que esta vai ser uma época positiva. Sim, se eu ganhar serei o primeiro a ganhar todos os troféus europeus. Mas isso só se eu ganhar…”, comentara na antecâmara de um encontro que voltou a colocar José Mourinho como o Special One, a alcunha que ganhou em 2004.

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“Essa história do Special One é uma história antiga, já foi quando estava ainda no início [da minha carreira]. Quando se tem mais maturidade e estabilidade, pensamos mais nas pessoas e menos em nós próprios. É uma história antiga, não acredito em magia. Quando se chega a uma final depois de uma temporada como a que fizemos, o trabalho está feito. Este é o momento da equipa, não o momento de um indivíduo”, destacou na projeção do jogo que serviu também para receber rasgados elogios de Rui Patrício, um dos portugueses em campo no lado dos romanos a par de Sérgio Oliveira, ambos em época de estreia.

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“Mourinho é o melhor do mundo e tem sido fantástico aprender com ele este ano. Tudo o que fazemos é para ganhar e foi assim que conseguimos alcançar uma final europeia. É a primeira vez para mim a nível de clubes e estou muito contente com isso. Quero continuar a aprender com ele. Fui a primeira contratação de Mourinho mas ele explicou-me o plano completo do que se estava a passar. Além disso, ele já sabia a minha ética de trabalho e que enquanto profissional dou tudo para ajudar o clube”, salientou o guarda-redes que tinha como único título europeu a conquista do Campeonato da Europa de seleções em 2016.

Por mais que o treinador quisesse colocar o centro das atenções nos jogadores, na equipa e no “nós”, havia uma parte de “eu” que estava sempre latente no jogo decisivo frente ao Feyenoord, equipa que acabou a Liga dos Países Baixos no terceiro lugar mas com o trabalho de Arne Slot muito elogiado nos neerlandeses. Apesar de contar já com 25 títulos na carreira, entre duas Champions no FC Porto e no Inter e duas Taças UEFA/Liga Europa no FC Porto e no Manchester United além de ter sido campeão em Portugal, Itália e Espanha, Mourinho seguia num caminho de cinco anos sem títulos após a primeira temporada no Manchester United e a passagem pelo Tottenham e via na decisão de Tirana, na Albânia (antecedida por vários incidentes entre adeptos que fizeram dezenas de feridos), um momento de afirmação da sua versão 2.0 que muitos condenaram ao insucesso mas que podia terminar com a conquista de mais um troféu.

No final, ganhou pela quinta vez noutras tantas decisões e pela quarta vez voltou a não sofrer golos. O jogo não foi propriamente entusiasmante, o Feyenoord acabou na frente em quase todas as estatísticas no plano ofensivo pelo que fez no segundo tempo, mas a Roma mostrou que este tipo de encontros não se jogam, ganham-se. Foi isso que fez, com um momento de inspiração de Zaniolo que é um jogador mais completo desde que começou a trabalhar com o português e duas grandes defesas de Rui Patrício que seguraram a vantagem após o intervalo. E foi assim que os romanos ganharam um título europeu mais de 60 anos depois da Taça das Cidades com Feira (que não era organizada pela UEFA, o que faz deste o primeiro troféu oficial), quebrando ainda o jejum transalpino de vitórias na Europa de 12 anos.

Com Mkhitaryan de regresso à equipa da Roma após longa ausência por lesão e o Feyenoord a apresentar o seu habitual 4x3x3, os minutos iniciais tiveram como única impressão de registo a capacidade demonstrada pelos neerlandeses em pressionar algo e condicionarem a fase de construção dos transalpinos, obrigando Pellegrini a recuar muito para tocar na bola mas sem que depois em posse isso se traduzisse em perigo na área de Rui Patrício. Assim, os minutos iam passando sem remates, sem oportunidades e com uma troca madrugadora por motivos físicos com a saída do lesionado Mkhitaryan por Sérgio Oliveira (17′).

Aos poucos, a Roma foi crescendo. Não foi exatamente pela troca forçada com a entrada do médio nacional mas pela capacidade que a equipa foi tendo para jogar mais no meio-campo contrário, para ter um critério diferente na posse, para mostrar que sem bola o Feyenoord mostrava fragilidades. Depois, imperou a eficácia: na primeira oportunidade de golo (e única até ao intervalo), Mancini lançou longo para a área em Zaniolo descaído sobre a esquerda, Trauner não conseguiu cortar por centímetros e o internacional tocou com classe por cima do guarda-redes Bijlow para o 1-0 (32′). Kökçu ainda teve um remate que criou alguma dificuldade a Rui Patrício pelo efeito que levava (40′) mas a Roma chegou mesmo ao descanso na frente.

Havia um dado curioso em relação a José Mourinho nas finais europeias: em cinco jogos, saiu sempre a ganhar por 1-0 ao intervalo. Agora, restava confirmar o outro dado que passava pela vitória em todas essas decisões e sofrendo golos apenas na primeira com o Celtic em 2003 (FC Porto, Taça UEFA). E o registo foi seriamente ameaçado logo a abrir, com Mancini a desviar de forma inadvertida para o poste da própria baliza após canto e Rui Patrício a fazer uma defesa gigante na recarga de Til na área (47′). Pouco depois, de novo o guarda-redes português a brilhar com outra intervenção fantástica a um míssil de fora da área do lateral Malacia que bateu ainda no poste antes de seguir para novo canto dos neerlandeses (50′).

O encontro estava a partir, com a Roma a sair prejudicada num lance em que Tammy Abraham seguia para a baliza isolado, foi agarrado por Senesi que seria expulso mas o árbitro nada assinalou. Essa seria contudo a exceção e não a regra, perante a pressão do Feyenoord já com Toornstra em campo que foi deixando os romanos sem saída, sem bola e a tentar a todo o custo evitar o empate “empurrada” para perto da sua área. Era necessário fazer algo e foi aí que Mourinho abdicou de Zaniolo para lançar Veretout e adiantar mais no terreno Pellegrini (além de trocar Zalewski por Spinazzola). Os neerlandeses continuaram com muita bola mas as melhores oportunidades foram da Roma, com Bijlow a evitar os golos de Veretout (73′) e Pellegrini (85′). Mourinho já tinha a mão preparada para abrir os dedos pelos cinco títulos europeus.