Os trabalhadores da central nuclear de Zaporíjia, na Ucrânia, têm sido “torturados” pelas forças russas para os obrigar a operar as instalações. A denúncia foi feita pelo chefe da empresa nacional de energia atómica ucraniana numa entrevista à Sky News, onde assume o desejo de que uma equipa da agência nuclear da ONU visite o local.

“Capturaram cerca de 1.100 trabalhadores da central”, afirmou Petro Kotin, adiantando que uma pessoa morreu e outra ficou gravemente ferida.

Nas últimas semanas a central, a maior da Europa, tem sido alvo de vários ataques, nos quais Kiev e Moscovo trocam acusações. Com os bombardeamentos multiplicam-se os apelos de entidades internacionais para desmilitarizar a zona.

A situação [na central] é muito má agora e está a piorar a toda a hora. Nas últimas semanas, verificou-se um aumento dos bombardeamentos no local”, denunciou.

Kotin, que já foi chefe do complexo de Zaporíjia, explica que fala diariamente com a atual gestão. Apesar do complexo estar em território ocupado pelas forças russas, as instalações são operadas sob o controlo ucraniano, explica. “Mas isto é só questões relacionadas com operações e questões físicas”. As chamadas são ouvidas pelas forças russas, porém, por vezes, os funcionários conseguem encontrar canais de comunicação que não estão vigiados.

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Numa entrevista ao The Guardian, na quarta-feira, Kotin denunciou que um projeto delineado por engenheiros russos ao serviço do Kremlin planeia cortar a ligação da central nuclear de Zaporíjia da rede elétrica nacional e ligá-la à rede elétrica da Rússia.

“Eles apresentaram [o plano] na fábrica e [os trabalhadores] apresentaram-no a nós. A pré-condição para este plano era o dano profundo de todas as linhas que conectam a central nuclear de Zaporíjia ao sistema ucraniano”, refere.

Normalmente a central é conectada à rede de energia ucraniana por quatro linhas principais, mas, segundo Kotin, três delas foram destruídas pela atividade militar russa. Caso a última linha seja danificada, isso pode provocar grandes apagões. Também duas das três linhas secundárias estão inoperacionais.

O chefe da Energoatom avisa, porém, que não se pode simplesmente desligar uma central nuclear de uma rede e voltar a ligá-la noutra: “É preciso de desligar tudo de um lado e depois começar a ligar do outro lado”. Se a refrigeração for comprometida em 90 minutos, “vai começar a haver fusão do núcleo” da central — um acidente nuclear em que o núcleo de um reator sobreaquece e derrete.

Não é a primeira vez que Kotin faz acusação é feita. Em agosto já tinha dito que a agência nuclear russa Rosatom quer recorrer a um procedimento para ligar a central à rede elétrica russa na Crimeia.

Uma visita da Agência Internacional de Energia Atómica (AIEA) às instalações tem sido muito discutida e, esta quinta-feira, o diretor-geral disse que uma inspeção poderá ocorrer “nos próximos dias”. Depois de um encontro com o presidente francês, Rafael Grossi disse que “há um acordo de princípio” com a Ucrânia e a Rússia sobre a visita ao complexo e que estão a ser acertados os detalhes. Também o ministro da Energia da Ucrânia confirmou a notícia. “Está prevista uma visita. Estamos a falar nos próximos dias, o mais tardar no início de setembro”, disse German Galushchenko à Reuters.