O resultado são quase 38 mil caracteres. O rosto de Meghan Markle é a nova capa da revista The Cut e as suas ideias, considerações e pedaços de memória dos tempos como membro sénior da família real britânica são o grande destaque da edição de outono da publicação americana, parte da New Yorker — e que inclui ainda uma grande produção fotográfica com a antiga atriz. A jornalista a guiar a entrevista foi Allison P. Davis, que, teve a oportunidade de entrar na mansão de Montecito, no sul da Califórnia, onde os duques de Sussex vivem com os dois filhos, Archie e Lilibet, e, assim, observar este seu novo mundo. Entre o efeito dos tabloides, a permanência da responsabilidade que vem com um estatuto que já não é seu e a capacidade de perdoar, reunimos os seis pontos principais daquela que é a primeira grande entrevista em nome próprio de Meghan Markle, em 2022.

Meghan Markle vai voltar ao Instagram?

“Vou voltar para o Instagram”. Foi a primeira novidade que Meghan Markle partilhou com a jornalista Allison P. Davis e o ponto de partida para esta extensa conversa, em que a mulher do príncipe Harry falou sobre a sua relação com as plataformas online, assim como as regras implementadas na família real para a sua utilização. Quando se juntou à família real, a duquesa de Sussex deixou de poder utilizar livremente as redes sociais — antes, partilhava imagens do seu quotidiano, tendo assinado até um blog de lifestyle, o The Tig. “Foi um grande ajuste — um grande ajuste para passar desse tipo de autonomia para uma vida diferente”, refletiu.

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Com a entrada na monarquia britânica, Meghan Markle surgia apenas nas contas controladas pela realeza (incluindo os Kensington Royal, onde partilhavam o protagonismo com Kate Middleton e o príncipe William). “Existe literalmente uma estrutura pela qual se tem de passar se quisermos divulgar fotografias do nosso filho. Como membro da família, primeiro temos de entregá-las ao Royal Rota [os correspondentes da família real]”, contou, revelando que, muitas vezes, estas imagens eram divulgadas primeiro pelos meios de comunicação social, incluindo os tabloides que a denegriam.

Segundo Markle, isto deixava o casal desconfortável: “Porque é que eu daria às mesmas pessoas que estão a chamar o meu filho a palavra ’N’ [alusão a um termo racista] a sua fotografia, antes de poder partilhá-la com as pessoas que a amam?”.

Mais à frente na entrevista, a duquesa de Sussex considera que poderá ainda ser demasiado cedo para regressar ao universo online em nome próprio.

Será a história de amor dos Sussex o novo documentário da Netflix?

Há diferenças entre um documentário histórico e um documentário real, destacou Meghan Markle. A consideração veio a propósito da possibilidade de os Duques de Sussex estarem a produzir com a Netflix um conteúdo sobre a sua história, enquanto casal.

Foi um nim: Meghan não disse que sim, mas também não disse que não. Elogiou o trabalho com a realizadora Liz Garbus e deixou algumas ideias no ar. “Quando os media moldam a história à tua volta, é muito bom poderes ser tu a contá-la”, disse. “O pedaço da minha vida que não pude partilhar, que as pessoas não puderam ver, é a nossa história de amor”, diz, numa alusão à relação com o príncipe Harry.

Depois, lembra parte do discurso do seu casamento, em que concluiu que “acima de tudo, o amor vence.” É essa a sensação que quer gerar, seja qual for o molde do conteúdo que irá nascer com a plataforma de streaming: “Espero que seja esse o sentimento das pessoas quando virem qualquer conteúdo ou projeto em que estamos a trabalhar.”

Mesmo depois de despir o papel de princesa, Meghan ainda sente o peso estatuto

Meghan Markle partilha com Davis que ainda está consciente do impacto do seu “papel de princesa” e que, quando aparece em público, vai sempre ciente dele. “É importante pensar nisso porque, mesmo na entrevista com a Oprah [Winfrey], estava consciente do facto de que existem meninas que ficam, ‘Oh meu deus, é uma princesa da vida real”.

O seu desejo passa por transmitir a ideia de que é possível ter ambições maiores do que este estatuto: “Eu só olho para todas elas e penso: vocês têm dentro de vocês o poder para criar uma vida maior do que a de qualquer conto de fadas que leram. Não quero que isso signifique ‘um dia também te podes casar com um príncipe’, mas antes ‘ um dia podes encontrar o amor, podes encontrar a felicidade, podes enfrentar aquele que parece o maior dos obstáculos e encontrar a felicidade novamente.”

A dificuldade em “encaixar” na família real

Meghan Markle partilhou nesta conversa as já conhecidas dificuldades em ser membro da família real britânica, considerando que o facto de ser americana foi um obstáculo — não necessariamente por ser uma americana negra, ressalvou.

No início, encarou o papel de princesa, como faria com qualquer outro protagonista que lhe fosse atribuído num trabalho de representação.”Eu era atriz”, destacou. “Todo o meu trabalho era ‘digam-me onde posicionar-me, digam-me o que dizer, digam-me como dizer, digam-se o que vestir e eu faço-o’. E aparecia mais cedo e provavelmente cozinhava qualquer coisa para a equipa’”.

Aqui terá sido diferente. De acordo com Davis, o “seu desejo para fazer várias perguntas e de nunca se envolver em algo em que ela não pudesse participar parecia violar uma norma social tácita”.

Meghan e Harry teriam ido para qualquer país da Commonwealth para não beneficiar do dinheiro dos contribuintes do Reino Unido — e fugir aos tabloides

Desesperados por fugir aos ataques dos tabloides, Meghan partilhou que o casal estava disposto a mudar-se para qualquer país da Commonwealth e continuar a trabalhar como membro da realeza, mas deixando de beneficiar dos impostos dos contribuintes do Reino Unido — sob o pretexto de “interesse público”, era um dos argumentos que justificava aos medias o escrutínio das suas vidas privadas.

“Qualquer coisa… nós só por existirmos, estávamos a transtornar a dinâmica da hierarquia. Portanto, íamos embora. Por nós tudo bem. Felizes com isso”, desabafou. A duquesa de Sussex acrescentou que a mudança para outro país da Commonwealth não seria uma novidade entre os membros da família real. “Não era inventar a roda”, disse. Mas não conseguiram este acordo: “Isto, por algum motivo, não nos foi permitido, mesmo que outros membros da família real tivessem feito exatamente a mesma coisa.”

Quando questionada sobre o porquê de lhes ter sido negada essa possibilidade, Meghan repetiu a pergunta de volta, mas face ao silêncio da jornalista, disse apenas: “Não sei”.

Há espaço para perdoar a família real, mas duquesa de Sussex ainda está a “sarar”

Meghan nunca teve de assinar nenhum documento que a proibisse de falar sobre a família real. “Eu posso falar de toda a minha experiência e escolhi não o fazer. Porquê? “Ainda estou a sarar”, respondeu à jornalista.

Apesar da ferida, Meghan destaca que há espaço para o perdão entre ela, a família real e a sua família biológica. “Acho que o perdão é mesmo importante. Não perdoar requer muito mais energia”, disse. “Mas requer muito esforço perdoar. Fiz mesmo um esforço ativo, especialmente sabendo que não posso dizer nada.”

A mulher de Harry fez um silêncio, sorriu e terminou: “Tenho muito para dizer até não ter. Gosta disso? Às vezes, como se costuma dizer, a parte silenciosa ainda faz parte da música.”