Um grupo de 22 conselheiros nacionais maioritariamente críticos da atual direção da IL forçaram a realização de um Conselho Nacional Extraordinário, onde vão pedir explicações à Comissão Executiva de Cotrim Figueiredo por não ter reunido este órgão antes de apresentar um projeto de revisão constitucional na Assembleia da República. A reunião vai ocorrer na quinta-feira e terá como ponto único uma discussão sobre o projeto entregue pela IL e a posição que o partido deve ter perante as propostas dos outros partidos.

Conselheiros nacionais ouvidos pelo Observador, desalinhados com a direção de Cotrim, denunciam uma “ausência de reflexão interna” e advertem que a proposta faz apenas “pequenos remendos” à Constituição, em vez de a alterar “profundamente” em prol de uma sociedade mais livre.

Entre os 22 subscritores da proposta estão, por exemplo, o ex-líder da Iniciativa Liberal, Miguel Ferreira da Silva (que é apoiante de Carla Castro), Cristiano Santos (ex-cabeça de lista por Aveiro nas legislativas), mas também o deputado da IL na Assembleia Regional dos Açores, Nuno Barata. No requerimento, ao qual o Observador teve acesso, os subscritores exigem assim a “discussão no Conselho Nacional da proposta de revisão constitucional entregue e das opções políticas relevantes a tomar em sede de revisão constitucional, nomeadamente no que concerne às propostas apresentadas por outras forças políticas“.

“Houve desconsideração da Comissão Executiva”

Um dos subscritores da proposta, o conselheiro nacional Carlos Figueira diz ao Observador que — mais do que discordar do conteúdo — o Conselho Nacional surge por o assunto “não ter sido discutido” internamente e lamenta ter “saber pela comunicação social” e pela “consulta do projeto” já finalizado o conteúdo de uma matéria tão importante como a revisão constitucional.

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Para Carlos Figueira “houve desconsideração por parte da comissão executiva” ao não apresentar a proposta aos conselheiros — o que podia até ter sido feito num ponto adicional do último conselho nacional, que considera ter sido “consumido pela redação do regimento para a própria comissão nacional.”

Um outro conselheiro — que não se quis identificar e não subscreve a lista (mas apoia as reivindicações dos críticos) — queixa-se de “ausência de reflexão interna”, mas vai mais longe nas críticas ao próprio projeto de revisão constitucional. Para este conselheiro ouvido pelo Observador, a proposta do grupo parlamentar liberal é “quase um rapar do tacho do programa”, lamentando que existam “apenas pequenos remendos”, em vez de se “alterar profundamente a Constituição  para tornar a sociedade mais livre”. Para este conselheiro, a “substância fica aquém do que me parece pertinente numa revisão constitucional.”

Há ainda conselheiros que lamentam não saber a posição do partido relativamente às propostas de PS e PSD, que abrem a porta a que a que as exceções do ponto de vista de restrições à liberdade possa estar o isolamento profilático.

A mesma fonte diz que “o grupo parlamentar, não sendo independente do partido, apesar autónomo, tem de prestar contas ao Conselho Nacional”. E deixa uma provocação ao líder cessante: “Uma das grandes queixas do João Cotrim foi que o Conselho Nacional não discutia política, discutia regimentos. Aí está a oportunidade para isso”.

O que diz o projeto de revisão constitucional da IL?

A Iniciativa Liberal começa por propor uma alteração do preâmbulo da Constituição, começa por , por exemplo, acrescentar uma referência ao 25 de Novembro no preâmbulo da constituição, que diz o seguinte:

A 25 de Abril de 1974, o Movimento das Forças Armadas, coroando a longa resistência do povo português e interpretando os seus sentimentos profundos, derrubou o regime fascista. A 25 de Novembro de 1975, Portugal consolidou-se como regime democrático pleno, impedindo a instauração de um regime comunista.”

E se faz referência ao facto de se ter impedido a “instauração de um regime comunista”, naturalmente apaga a parte em que diz que a Constituição pretende “assegurar o primado do Estado de Direito democrático e de abrir caminho para uma sociedade socialista “.

Além disso, a IL propõe a substituição de “um país mais livre, mais justo e mais fraterno” pela “construção de um país mais livre e mais justo, através de níveis mais elevados de desenvolvimento económico, político e social”. Ou seja, o “fraterno” desaparece.

No mesmo projeto, a IL propõe que os cidadãos tenham um “recurso de amparo para o Tribunal Constitucional, pois entende que os cidadãos devem poder recorrer àquele Tribunal sempre que entendam que as suas liberdades ou direitos estão a ser gravemente violados pelo Estado Português.”

A Iniciativa Liberal quer também deixar claro na Constituição que “não é admitida a extradição, nem a entrega a qualquer título, nos casos em que se verifique um risco sério de vida ou de sujeição a tortura ou a tratamentos desumanos e degradantes, nomeadamente por comprovada violação de direitos fundamentais pelo Estado requerente”. A IL, recorde-se, denunciou no Parlamento que existiam “esquadras chinesas” a operar em Portugal no sentido de identificar críticos de Pequim e, consequentemente, repatriá-los para que fossem julgados.

Os liberais pretendem ainda incluir na Constituição um ponto que estabelece que, para “assegurar o direito à habitação”, o Estado tem a responsabilidade de “estimular a construção privada e, quando necessário, promover a construção de habitações económicas e sociais, garantindo o acesso à habitação própria ou arrendada.”

Na mesma proposta, a IL quer que os membros do órgão dirigente do Banco de Portugal sejam “designados após um procedimento concursal aberto e transparente, nos termos da lei”.

A IL propõe ainda que o Orçamento não possa “prever a existência de défice orçamental, nem um volume de despesa pública que exceda 35% do Produto Interno Bruto”. As exceções para que haja défice ou se exceda este limite de dívida pública são os casos em que existem “catástrofes naturais ou situações de emergência extraordinária que prejudiquem significativamente a sustentabilidade económica ou social do Estado”. E só pode ocorrer “mediante lei aprovada por maioria de dois terços dos deputados presentes”.

Os liberais pretendem ainda que seja o Presidente da República a nomear e exonerar “sob proposta da Assembleia da República e ouvido o Governo, o presidente do Tribunal de Contas e o Procurador-Geral da República”.

O projeto, de 34 páginas, é assinado por todos os deputados da Iniciativa Liberal, incluindo o presidente cessante (João Cotrim Figueiredo) e os dois candidatos à liderança da IL, Rui Rocha e Carla Castro.