É uma polémica que se arrasta há quase uma semana, mas que se reacendeu ao fim da manhã desta terça-feira quando, em declarações aos jornalistas após a iniciativa “Músicos no Palácio de Belém”, o Presidente da República reagiu às polémicas protagonizadas pelo presidente do PSD, Luís Montenegro, e pelo presidente da Câmara de Lisboa e também ele social democrata, Carlos Moedas, sobre as políticas de imigração em Portugal.

Marcelo pediu bom senso a Carlos Moedas e a Luís Montenegro nas considerações que tecem sobre o tema da imigração: “Declarações muito emocionais feitas em cima de casos correm o risco de ser irracionais, de irem a reboque de posições mais emocionais que essas e terão sempre mais sucesso em termos de captar a opinião pública”, avisou Marcelo Rebelo de Sousa.

E prosseguiu: “Quando se trata de um tema tão sensível como esse, nós temos de ter muito bom senso no seu tratamento. Estamos a falar de pessoas, de pessoas que são vítimas, em muitos casos, de redes de utilização de seres humanos. Estamos a falar de deficiências do funcionamento do enquadramento dessas pessoas na sua legislação ou no acompanhamento da sua atividade laboral. E isso já é uma responsabilidade nossa”.

O primeiro a reagir foi Luís Montenegro, presidente do Partido Social Democrata (PSD), a quem Marcelo Rebelo de Sousa já tinha deixado um conselho: “Manter a cabeça fria e não ir a correr atrás do prejuízo, pensando que se pode cobrir quem tem posições mais emocionais”, até porque “a cópia perde sempre para o original” — uma referência à aparente aproximação dos sociais-democratas ao Chega na temática sobre a imigração nos últimos dias.

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Confrontado diretamente com as palavras de Marcelo, Montenegro respondeu: “Para mim não são de certeza.” “O Presidente da República é uma pessoa sensata, que me conhece bem e conhece os meus valores morais, éticos e humanos”, considerou o líder do PSD. E ainda reagiu às alegadas ligações entre o partido e o Chega: “Se há alguma cópia, a cópia não é o PSD”.

No fim do debate “O Novo Caminho para a Habitação”, questionado sobre como responde a quem o acusa de xenofobia, Luís Montenegro já tinha desafiado os jornalistas: “Diga-me quem foi.” “Isto não pode ficar no ar. Há alguém que tenha dito que eu era xenófobo? Diga-me quem foi. Se alguém disse isso de mim, se calhar tenho de agir contra essa pessoa”, respondeu, visivelmente irritado, o líder do PSD, que depois se defendeu.

“Nós somos efetivamente sociais-democratas, pensamos na dignidade das pessoas. Qualquer tentativa de nos colar a fenómenos de xenofobia ou desvalorização de gente desempregada é de gente malévola e com peso na consciência”, concluiu.

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Depois, foi Carlos Moedas que respondeu aos recados do Presidente da República. Na reunião da Assembleia Municipal de Lisboa, o presidente da Câmara Municipal de Lisboa disse que não aceitava lições “de ninguém” — e repetiu: “De ninguém” — sobre tolerância com emigrantes e imigrantes.

“Eu fui emigrante, sou casado com uma imigrante, o meu sogro é marroquino, a minha sogra é tunisina, por isso, há algo que gostaria de deixar muito claro: não aceito lições de ninguém nesta matéria, de ninguém”, declarou Carlos Moedas: “Conheço a emigração e a imigração na primeira pessoa, como poucos em Portugal”, afirmou, assumindo que “o país precisa de uma política de imigração digna” e que “precisa de imigrantes”.

É preciso recuar até 9 de fevereiro para encontrar as raízes das tensões entre Marcelo Rebelo de Sousa, o autarca lisboeta e o líder social-democrata. Tudo começou quando Moedas sugeriu em entrevista ao Público, na semana passada, a criação de contingentes que definiriam que imigrantes só poderiam entrar em Portugal se já tiverem um contrato de trabalho.

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No mesmo dia, e em reação à entrevista do autarca, Luís Montenegro defendeu que os imigrantes devem entrar no país “de forma regulada”: “Eu não concordo a 100% com essa visão. Sou muito claro sobre isso. Concordo que tem que haver regulação, mas nós temos que ser mais ousados. Temos de arriscar, procurar pelo mundo as comunidades que possam interagir melhor connosco.”

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Nesse dia, o Presidente da República disse que fechar as portas à imigração, por não se conseguir “fazer funcionar os mecanismos de legalização e de controlo das condições de trabalho”, é “solução fácil”. “É uma solução muito fácil o vir dizer: como não somos capazes de fazer funcionar os mecanismos de legalização e de controlo das condições de trabalho, o melhor é resolver o mal pela raiz, fecha-se. Como é evidente, esta é uma solução que é muito fácil, mas é, não sendo capaz de resolver certos problemas, estar a dar uma resposta ao lado que não tem a ver com certos problemas”, declarou.

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Sem querer posicionar-se sobre a política de imigração em concreto, o chefe de Estado disse que “todos têm direito à sua opinião” nesta matéria, mas que “o Governo é quem está em melhor posição, e a Assembleia da República, naturalmente, para poderem olhar para os dados e dizerem onde é que há falta de mão de obra, como é a falta de mão de obra, que tipo de imigração”. “Há regimes diferentes para a imigração, a Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) tem um regime diferente. Quer dizer, não pode ser na base dos palpites”, acrescentou.