O chapéu com a pala virada ao contrário podia dar a ideia de que era quase um treino, a primeira tentativa de Pedro Pablo Pichardo deitou por terra qualquer hipótese nesse sentido. Aliás, esse é o principal argumento para o atleta nacional chegar onde chegou e chegará sobretudo nestes últimos anos de carreira: encarar uma qualquer prova como se fosse a mais importante de uma vida qualquer que seja o reconhecimento nacional ou internacional em causa. E a qualificação para a final dos Europeus de Pista Coberta funcionou quase como uma festa antecipada para a mais do que provável medalha de ouro conseguida na competição.

Existe uma explicação para esse domínio que na verdade poderia ser um dos principais duelos em Istambul por estes dias: Jordan Díaz, atleta cubano que já tem a nacionalidade espanhola, só poderá competir pelo seu novo país a partir de junho de 2024, apostando assim tudo nos Jogos Olímpicos de Paris enquanto continua a trabalhar na estrutura de saltadores liderado por Iván Pedroso onde constam por exemplo Yulimar Rojas, Ana Peleteiro (que foi mãe em dezembro) e até há pouco tempo Nelson Évora. Assim, Pedro Pablo Pichardo, líder incontestável do triplo masculino, tinha a passadeira ainda mais estendida para a vitória.

Também por isso, o saltador quis fazer quase um statement desde início na competição, marcando logo um 17,46 na primeira tentativa que se tornou um novo recorde nacional em Pista Coberta (superando por dois centímetros o seu anterior máximo) e que ascendeu a terceira marca de 2023 apenas atrás dos 17,59 de Jordan Díaz – recorde de Espanha alcançado no meeting de Madrid – e dos 17,49 de Hugues Fabrice Zango. Para se ter noção das diferenças na qualificação, que fechou com um 16,20 do turco Batuhan Çakir, Max Hess, germânico que conseguiu o segundo melhor registo, ficou longe dos 17 metros (16,67), o que dava até uma esperança redobrada a Tiago Pereira de chegar às medalhas (quinto na qualificação com 16,39).

“Foi bom, consegui fazer a marca de qualificação, logo no primeiro ensaio. Foi recorde nacional, foi bom, estou feliz. O meu objetivo em todas as competições é tentar ganhar, em qualquer competição a minha cabeça está focada na medalha de ouro, tenho sempre o pensamento positivo. O corpo está bem, sinto-me bem, a cabeça também”, tinha comentado o campeão olímpico após a qualificação. “Passei à final, que era o objetivo principal. Agora vai ser um dia de luta. A estratégia era saltar o mais longe possível. Tive um inverno complicado, quase sempre afastado por lesão, mas acabei por recuperar-me à última das últimas. Estou feliz por estar aqui e a fazer o que todos os atletas querem, que é ganhar medalhas. Temos de ser realistas, o Pichardo está destacado de toda a concorrência e o meu objetivo perante isso é que Portugal traga o primeiro e o segundo [lugares]”, destacara Tiago Luís Pereira após o 16,39 conseguido na última tentativa.

Assim, e de forma natural, Pedro Pablo Pichardo, conseguiu a primeira medalha de ouro para Portugal nos Europeus de Pista Coberta de 2023, repetindo o arranque do fantástico ciclo que teve nos dois últimos anos: após ganhar em Torun-2021 o seu primeiro ouro individual em representação da Seleção, ganhou a medalha de ouro nos Jogos Olímpicos (quinta da história nacional), foi vice-campeão mundial de Pista Coberta e venceu os Mundiais e os Europeus ao Ar Livre. Ao mesmo tempo, ou em paralelo, Pichardo, de 29 anos, terminou a Liga Diamante de 2021 em primeiro (segunda vitória após 218) e a de 2022 em segundo. De acrescentar que esta é a quinta medalha consecutiva no triplo masculino português em Europeus de Pista Coberta: ouro em 2023 com Pichardo, ouro em 2021 com Pichardo (Torun), prata em 2019 com Nelson Évora (Glasgow), ouro em 2017 com Nelson Évora (Belgrado) e ouro em 2015 com Nelson Évora (Praga).

E, mais uma vez, Pichardo mostrou que até mesmo sem concorrência tenta a todo o custo superar-se em qualquer prova: após abrir a prova com um salto a 17,26 que muito provavelmente chegaria para lhe dar a vitória, o atleta prescindiu da segunda tentativa para ganhar balanço para o 17,60 que ficaria como novo recorde nacional em Pista Coberta e também melhor marca do ano. Tiago Pereira, que estava em quarto na última ronda mesmo fazendo melhor da época (16,51), ficou a seis centímetros das medalhas, que foram para o surpreendente grego Nikolaos Andrikopoulos (16,58, melhor marca do ano) e para o alemão Max Hess (16,57). Faltava apenas fechar a diferença da vitória de Pichardo, que se reservou para fazer uma última tentativa já com a medalha de ouro garantida por mais de um metro de diferença mas que acabou por ser nula apesar da sensação que deixou de que poderia ultrapassar esse registo de 17,60 antes alcançado.

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