Os 171 quilómetros da quinta etapa do Giro não tinham o perfil indicado a marcar grandes diferenças entre os corredores. No entanto, a chuva podia não só ter uma palavra a dizer, como, ao pingar, fazer todo um discurso de lamentos sobre eventuais quedas. Aliás, nas etapas anteriores, vários corredores sofreram com o piso escorregadio e o próprio João Almeida teve que aguentar as mazelas de uma queda. Ativado o modo de sobrevivência, o ciclista português teve na etapa 4 um momento de recuperação ativa que nem por isso o fez abrandar. É verdade que caiu para quarto na geral, mas continuava junto dos favoritos.

“Mais um dia ultrapassado sem mais azares. Estou um pouco amassado da queda, mas vamos sobrevivendo. Amanhã, temos um dia muito duro pela frente com muita. chuva e frio, mas esperamos passar mais um dia sem problemas”, disse João Almeida no rescaldo à chegada a Lago Laceno que consagrou um novo camisola rosa, o norueguês Andreas Leknessund (Team DSM). “É super especial levar a camisola rosa. Da Noruega, só Knut Knudsen a teve antes de mim. É um grande dia na minha carreira, olhando para quem a vestiu nos últimos dias e o impacto que esta camisola tem”, referiu o ciclista de 23 anos que ganhou apenas por uma vez no World Tour. Apesar de tudo, a vitória na quarta etapa, essa ficou para Paret-Peintre.

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João estava “amassado”, apanhou outro susto mas salvou o dia: Leknessund fica com rosa, português desce a 4.º com o tempo de Remco e Roglic

Remco Evenepoel, a quem a Soudal Quick-Step parece não ter condições suficientes para ajudar de maneira constante, apresenta-se em poupança de energia para os momentos decisivos. Ainda assim, para além de João Almeida, Primosz Roglic, o outro grande favorito à vitória final, está em ascensão (chegava a 1’12” da liderança), pelo que o belga tem que ser meticuloso na gestão da vantagem que conseguiu nas corridas iniciais.

A primeira de duas contagens de montanha de terceira categoria na ligação entre Atripalda e Salerno cedo começou a agitar as águas. Literalmente, porque a chuva acabou mesmo por aparecer de forma intensa. Thibaut Pinot (Groupama-FDJ) apostou forte na chegada ao topo de Passo Serra e conquistou nove valiosos pontos para consolidar a camisola azul da montanha. Satisfeito, o francês deixou-se apanhar pelo pelotão, largando os ciclistas que se tinham juntado a ele para fugirem do grupo do camisola rosa.

Thomas Champion (Cofidis), Samuele Zoccarato (Green Project-Bardiani CSF-Faizanè) e Stefano Gandin (Team Corratec-Selle Italia) mantiveram-se numa fuga que podia ter pelo menos mais um elemento. Martin Marcellusi (outro ciclista da Green Project-Bardiani CSF-Faizanè) foi desencorajado a integrar a frente da corrida após uma queda dentro dos dez quilómetros iniciais na mesma curva onde também Stefano Gandin caiu. A diferença entre um e o outro, foi que o primeiro abdicou da fuga e o segundo manteve-se nela.

Giro: Evenepoel tem dores e hematoma do lado direito do corpo após cair

Não era um ambiente fácil para os corredores. A chuva não dava tréguas e os acidentes iniciais foram um aviso desnecessário para o perigo que era por si só evidente. Se a a chuva era esperada, o motivo pelo qual Remco Evenepoel caiu, não. O belga estava a fazer uma corrida tranquila junto dos colegas de equipa, mas foi surpreendido por um cão que apareceu na estrada e que causou vários acidentes. Acabou a ser rebocado pela Soudal Quick-Step de novo até ao pelotão. Apesar de tudo, o campeão do mundo não se livrou das consequências do impacto com o solo e do esforço extra para voltar ao grupo principal.

Não fosse o traçado propício para uma chegada ao sprint e estaria aqui uma boa hipótese para a concorrência lançar um ataque a Remco. Pelo meio, os velocistas tiveram dois momentos para brilhar. A primeira contagem, os homens da fuga ficaram com o maior número de pontos, mas atrás, os verdadeiros interessando no sprint intermédio tiveram que fazer pela vida. Dos homens do pelotão, Mads Pedersen (Trek-Segafredo) foi o mais rápido, seguido por Jonathan Milan (Bahrain Victorious, detentor da maglia ciclamino), Michael Matthews (Jayco AlUla), Kaden Groves (Alpecin-Deceuninck) e Alex Kirsch (Trek-Segafredo).

João Almeida e os restantes elementos da UAE Team Emirates só apareceram na frente do pelotão na hora de agarrarem nos sacos com os suplementos que faziam a vez do almoço. A Trek-Segafredo era a equipa mais interessada em anular fuga, que esteve sempre a não mais de 2’30”, para garantir que a chegada era efetivamente ao sprint. Se isso acontecesse, Mads Pedersen tornava-se no principal candidato à vitória na etapa. Apesar disso, era Team DSM, do líder Leknessund, quem mais trabalhava para alcançar Champion, Zoccarato e Gandin.

Toda a dinâmica levada a cabo em prol da vitória na etapa ficou em suspenso na hora da segunda contagem de montanha, no topo de Oliveto Citra. A Groupama-FDJ chegou-se à frente para ter a certeza de que lançava Pinot para a conquista de mais um ponto para a classificação dos trepadores que o francês garantiu que liderava no fim da etapa (40 pontos) seguido por Amanuel Ghebreigzabhier (Trek-Segafredo, 26 pontos).

Mais ação só no sprint intermédio seguinte. Gandin passou em primeiro e Champion em segundo, momentos antes de serem apanhados pelo pelotão a 20 quilómetros do fim. No entanto, a fuga não estava anulada Zoccarato, o último a beneficiar das bonificações, continuava a acreditar que conseguia evitar uma chegada em grupo. Quando o italiano estava a sensivelmente 1’06” um problema nas mudanças impediu-o de forçar o ritmo e foi apanhado dentro dos últimos dez quilómetros muito por culpa da INEOS Grenadiers de Tao Geoghegan Hart, Geraint Thomas e Filippo Ganna.

As equipas dos sprinters estavam a tentar ganhar a melhor posição possível para lançarem os homens mais rápidos. Tudo o que estava planeado, acabou por não se concretizar uma vez que os momentos finais foram caóticos. Roglic teve que trocar de bicicleta com um colega para não perder a frente. Uma queda numa curva à direita afetou muitos ciclistas, entre os quais vários elementos da UAE Team Emirates, mas sem serem dos que tiveram azar de ir ao chão. João Almeida conseguiu sair ileso. “Foram quatro horas de corrida e perdi quatro anos de vida. Não foi fantástico”, comentou João Almeida no final.

A mesma sorte não teve, no momento, a seguir Remco Evenepoel que voltou a cair numa zona onde a densidade de corredores não era assim tanta. O belga terminou a corrida com muitas queixas. Pior ainda ficou Mark Cavendish (Astana Qazaqstan Team) que cruzou a meta a deslizar no chão, após um choque com David Dekker (Arkéa-Samsic). Kaden Groves da Alpecin Deceuninck acabou por ser o mais rápido nos metros finais e vencer uma etapa (4h30’19”) em que muitos terminaram com feridas e a serem retirados de maca, tal a violência dos acidentes nos momentos finais. Jonathan Milan e Mads Pedersen completaram o pódio.

No final da corrida, Kaden Groves admitiu que não estava à espera de vencer em Salerno. “Surpreendi-me a mim próprio hoje. Tudo estava a correr bem, mas batemos. Conseguimos juntar o grupo de novo e ter a posição e as pernas para vencer”. Andreas Leknessund vai continuar a vestir de rosa, embora tenha admitido que a etapa não foi a melhor para exibir a camisola de líder. “Foi bom, mas não foi o melhor dia para aproveitar por causa da chuva e do frio”, admitiu o norueguês.