Publicado em agosto do ano passado, o novo Estatuto do SNS prometia autonomia para os hospitais, não só nas contratações, mas também nos investimentos, mediante a aprovação dos Planos de Atividades e Orçamento (PAO) de cada unidade. No entanto, até hoje apenas um dos 42 PAO foi aprovado, o que está a criar desagrado no seio dos administradores hospitalares (que continuam limitados na gestão das unidades). O Ministério das Finanças justifica o atraso com a necessidade de uma “análise criteriosa e muito rigorosa dos PAO o que”, salienta, “não raras as vezes, implica interações e troca de informação entre as diversas entidades”.

Durante o ano de 2022, o governo desdobrou-se em declarações à imprensa, para anunciar a novidade, há muito pedida pelas administrações dos hospitais, mas a verdade é que, quase a meio de 2023, praticamente nenhum destes planos foi aprovado e os hospitais continuam a fazer “uma gestão de secretaria”, criticam os administradores hospitalares, que acusam o Ministério das Finanças de ser o responsável pelo atraso.

Ao Observador, o presidente da Associação de Administradores Hospitalares (APAH), Xavier Barreto, confirma que “os planos continuam por aprovar, o que faz perigar a ideia da autonomia que foi prometida”. O responsável adianta que, a pedido do governo, os hospitais enviaram os respetivos planos até ao dia 18 de novembro, “com a expectativa de que seriam aprovados no início” de 2023. Expectativa essa que não foi cumprida.

Até agora, só um um dos 43 planos (o do Hospital de Santarém) teve luz verde das Finanças. Todos os outros, já assinados pelo Ministério da Saúde, estão no Terreiro do Paço à espera de aprovação. “Não faz sentido pedirmos urgência aos hospitais e depois acontecer isto”, lamenta Xavier Barreto.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Neste momento, os hospitais continuam, assim, sem autonomia para contratar profissionais (à exceção de médicos para os serviços de urgência), e para fazer investimentos acima dos 100 mil euros. Tudo isto tem de passar pelo crivo do Ministério das Finanças, que tem por hábito demorar meses a autorizar contratações ou despesas, limitando a ação das administrações hospitalares. “Às vezes nem aprovam”, diz Xavier Barreto.

A demora na aprovação dos Planos está até a criar desconforto no Ministério da Saúde. “O Ministério da Saúde não está satisfeito com a demora, porque não está de acordo com a expectativa que foi criada”, sublinha.

O novo Estatuto do SNS, publicado em Diário da República há mais de nove meses,  prevê a atribuição aos hospitais de mais autonomia para a contratação de trabalhadores e para investir, pois as Finanças passam apenas a ter de aprovar valores acima dos 2,5 milhões de euros em projetos previstos nos Planos de Atividade e Orçamentos.

Os conselhos de administração dos hospitais vão também poder celebrar contratos sem termo sempre que esteja em causa o recrutamento de trabalhadores necessários ao preenchimento dos postos de trabalho previstos no mapa de pessoal. Poderão também substituir profissionais temporariamente ausentes.

O presidente da APAH defende que, sem estes planos, onde os hospitais explanam os investimentos e a despesa que prevêem ter, “não é possível responsabilizar as administrações”. “Podemos responsabilizar quando há autonomia”, refere. “Para podermos avaliar um presidente, temos de garantir que as pessoas têm as ferramentas para gerir”, diz Xavier Barreto, admitindo a boa-fé da nova Direção Executiva do SNS no sentido de “alterar este paradigma”.

O Ministério da Saúde, contactado pelo Observador, descarta responsabilidades e garante que “ainda em 2022 foram assinados todos os contratos-programa com as 43 entidades EPE para 2023, tendo sido submetidos os Planos de Atividades e Orçamento (PAO) 2023/2025 para análise pela Unidade Técnica de Acompanhamento e Monitorização do Setor Público Empresarial (UTAM)”, sob alçada do Ministério das Finanças, “a quem compete a aprovação dos PAO”.

O Observador tentou saber, junto do Ministério da Finanças, quais as razões para a demora na aprovação dos Planos e quando estima que esses Planos possam ser analisados e aprovados. O Ministério, liderado por Fernando Medina, admite o atraso e garante que “estão a ser feitos todos os esforços para fechar mais processos” (para além do único PAO já aprovado, o de Santarém). As Finanças não se comprometem com prazos mas dizem que “o governo mantém o objetivo de, em 2023, conseguir a aprovação dos PAO das 42 entidades de saúde” em falta.

Ressalvando que os PAO necessitam de uma análise “criteriosa e muito rigorosa”, o Ministério adianta que “estão em fase final de análise e em condições de merecer despacho vários outros PAO já nos próximos dias e semanas, entre eles o do Centro Hospitalar do Médio Tejo”.