As associações no terreno lamentam não terem sido ouvidas pela Câmara Municipal de Loures, que esta segunda-feira anunciou um plano extraordinário para recuperar rendas não pagas, e apelam ao diálogo para encontrar “soluções alternativas” aos despejos.

A Câmara de Loures apresentou o plano “Habitação Justa” para recuperar as rendas vencidas e não pagas verificadas em quase metade das habitações municipais, admitindo avançar para despejos se os inquilinos não aderirem ao plano de pagamentos proposto.

Em declarações à agência Lusa, José Duarte, missionário comboniano no concelho de Loures, defendeu a importância de “escutar” os agentes que lidam com o problema diariamente.

“Não houve essa possibilidade de diálogo e isso preocupa-nos, porque quem está no terreno devia também ser escutado. Estamos a falar de muitas organizações, associações”, frisou.

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Loures lança plano para recuperar rendas não pagas e admite despejos

É preciso expor “o problema nu e cru” e, “entre todos, procurar as soluções alternativas”, propõe, alertando que, “se a sociedade civil não é envolvida, há uma parte do problema que não vai ter solução ou, se a tem, não é a mais adequada”.

Questionado pela Lusa na conferência de imprensa que se seguiu à apresentação do plano “Habitação Justa”, o presidente da Câmara Municipal de Loures, Ricardo Leão (PS), garantiu que houve “ampla discussão pública” antes de se adotar o novo regulamento e recordou que, durante a campanha eleitoral, visitou “todos” os bairros municipais para “deixar claro” ao que vinha: “direitos e deveres iguais para todos”.

O tema da habitação no concelho de Loures “é complexo” e já se arrasta “há mais de 30 anos”, recorda o missionário José Duarte. “Nunca se fez um debate sincero e verdadeiro sobre este tema”, lamenta. O tema “nunca foi bem tratado” politicamente, “nem por uns, nem por outros”, avalia, apelando a que se veja “o todo” e, simultaneamente, que se analise “caso a caso”. O missionário descreve “pessoas esgotadas” nos bairros municipais.

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É gravíssimo o estado de saúde mental destas famílias (…), porque não encontram solução para os seus problemas básicos. Não é só a habitação, é a água, a eletricidade, a alimentação, é tudo”, assinala. O missionário aponta a humidade e a falta de higiene e limpeza urbanas como os principais problemas das habitações.

“Está tudo um pouco abandonado, não há acompanhamento adequado”, relata, no que é acompanhado por Rita Silva, da associação Habita!, que há muito segue a situação no concelho de Loures. Segundo aquela ativista, os bairros municipais estão ao “abandono completo” e “a falta de manutenção é crítica”, realçando que as pessoas deixaram de pagar renda também como forma de protesto por a Câmara não assumir as suas responsabilidades de manutenção do edificado.

“A Câmara devia anular as dívidas para trás, arranjar as casas e começar do zero”, propõe, criticando que a autarquia esteja a “culpabilizar as vítimas” e a nomear como “Habitação Justa” um programa que vai “pesar ainda mais em cima dos desfavorecidos” numa altura de aumento do custo de vida.

Na sessão de apresentação do plano, Ricardo Leão reconheceu que a habitação municipal “está degradada” e “a necessitar de intervenções profundas”. Anunciando “um pacto com os moradores”, o autarca prometeu requalificar os 1.500 fogos identificados como estando em “condições indignas”.

A autarquia anunciou que vai investir “mais de 100 milhões de euros” na habitação municipal que existe e, simultaneamente, na construção de 420 novos fogos (para serem entregues até setembro de 2026).