A história de Portugal nos 1.500 metros dos Campeonatos do Mundo de atletismo começou por ser boa, rica e especialmente talhada para o sucesso nos primeiros anos. No feminino, Carla Sacramento, uma das maiores atletas nacionais de sempre, ganhou o bronze em Gotemburgo-1995 e o ouro em Atenas-1997, mas também no setor masculinos os bons resultados foram-se sucedendo até ao bronze de Rui Silva em Helsínquia-2005, com o registo de um quinto lugar com o mesmo Rui Silva em Paris-2003, uma sexta posição de Mário Silva em Tóquio-1991 ou um sétimo posto com Rui Silva em Edmonton-2001. Depois, veio o hiato. Foi como se o meio fundo tivesse “adormecido” durante largos anos. Agora, voltou a ser falado por Isaac Nader.

Isaac Nader poupou no que pôde para chegar tranquilamente à final dos 1.500 metros dos Mundiais de atletismo

Nascido em Faro, sobrinho do antigo avançado Hassan Nader que se destacou no Farense e no Benfica e que chegou a ser o melhor marcador do Campeonato pelos algarvios, o atleta de 24 anos começou por garantir o apuramento para as meias-finais logo na eliminatória 1 com o norueguês Jakob Ingebrigtsen, terminando na quinta posição e assegurando a entrada direta nas meias-finais com 3.34,36, naquele que foi o 11.º tempo no combinado das quatro corridas. No domingo, numa segunda eliminatória bem mais lenta do que a primeira, Isaac Nader aproveitou da melhor forma a “boleia” do escandinavo super favorito à vitória final e voltou a garantir a passagem direta à corrida decisiva com o quinto lugar da eliminatória e o 11.º no geral (3.35,31, 17.º tempo das duas meias-finais). Tudo o que viesse a partir de agora já seria algo positivo.

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“Estive sempre muito tranquilo porque tenho ganho experiência para ter calma, saber esperar e não cometer os erros que fiz no passado. O cronometro é um bom psicólogo porque treinando bem, as coisas saem e, depois, na competição, há que acreditar para lutarmos pelos nossos sonhos, conquistando-os ou não. Nos últimos 250 metros, avancei mais na corrida porque estava em sétimo e não queria ficar barrado. Ainda tinha muita força e, quando passa o norueguês [Jakob Ingebrigtsen], que muda forte, eu fui atrás dele e tentei controlar o máximo possível. A estratégia era a mesma, podendo não gastar, não gasto. A final vai ser muito difícil. Como se pode ver na lista de partida, os 1.500 nunca foram tão fortes. Fico contente por poder estar entre os 12 primeiros mas vou lutar pelo melhor lugar”, comentara após a meia-final à Lusa.

Os elogios ao atleta eram muitos, a começar por Domingos Castro, um dos dois primeiros atletas nacionais a ganhar medalhas em Mundiais, neste caso em Roma-1987 nos 5.000 metros. “Os últimos dois meses dele foram absurdos. Tinha 3.36 aos 1.500 metros e era apenas uma boa promessa e de repente arrancou cinco marcas abaixo de 3.35 e duas na casa dos 3.31. Começa a ameaçar o recorde nacional do Rui Silva”, admitiu mesmo numa entrevista ao jornal A Bola um dos gémeos mais famosos do atletismo, colocando essa marca de 3.30,07 feita por Rui Silva há mais de duas décadas no Mónaco como um objetivo alcançável.

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Ainda assim, e apesar de todo o entusiasmo, Domingos Castro não passava por cima das dificuldades que Isaac Nader iria enfrentar numa final com sete dos dez primeiros do ranking mundial da distância (o atleta nacional está na 17.ª posição). “Não é favorito. Esse é, de forma clara, o norueguês [Jakob Ingebrigtsen]. Há depois mais meia dúzia de atletas que já correram abaixo dos 3.30 e, por isso, no papel, o Isaac não é favorito a entrar nas medalhas. O que é bom, pois tem muito menos pressão. Não é favorito mas não me espantaria mesmo nada que ele regressasse a Portugal com uma medalha. Inacessível só o norueguês. Há depois os sempre perigosos africanos, tal como os britânicos, mas, pelo que vi na eliminatória e na meia-final, em que correu com grande facilidade, acredito que o Isaac possa entrar nos cinco primeiros”, frisara.

Até à última volta, as coisas pareciam correr bem: Isaac Nader colocou-se no grupo da frente, foi percebendo as movimentações de Jakob Ingebrigtsen quando passou para a liderança da corrida e passou a marca dos 1.100 metros entre o quinto/sexto lugar com tudo em aberto. Depois, cedeu: perante as acelerações que já eram esperadas na frente, o português foi caindo, afundou-se na classificação e não mais voltou a apanhar o comboio, terminando num modesto 12.º lugar com 3.35,41, longe daquilo que prometia fazer (e já fez). Ainda assim, a maior surpresa estava guardada para os últimos 200 metros: contra todas as expetativas, Ingebrigtsen acabou por ceder e o britânico Josh Kerr acabou por tirar o título mundial ao norueguês com 3.29,38 contra 3.29,65. O também norueguês Nrve Gilje Nordäs fechou com o bronze (3.29,68).