O primeiro debate entre candidatos republicanos, que disputam a nomeação para a eleição presidencial de 2024, foi um retrato fiel das sondagens: de um lado, Donald Trump (ausente do debate) e que arrebata mais de metade das intenções de voto para as eleições primárias do Partido Republicano; do outro, todos os outros candidatos, a tentarem aproveitar o tempo de antena para angariarem eleitores, antes do começo das primárias, em janeiro. O debate, que juntou oito dos onze candidatos à nomeação republicana, em Milwaukee, ficou marcado pelas divergências em torno de Donald Trump e do apoio americano à Ucrânia.

O debate já ia com mais de uma hora de duração quando os candidatos se centraram no ex-presidente Trump, “o elefante que não está na sala”, como lhe chamou o moderador da Fox News Bret Baier. As opiniões dividiram-se quando os candidatos foram questionados sobre se apoiariam o candidato Donald Trump (caso o ex-presidente consiga a nomeação, o mais provável) mesmo que este seja condenado em algum dos processos judiciais que enfrenta.

Chris Christie, um dos mais ferozes críticos de Trump, recebeu um coro de vaias do público republicano presente no Fiserv Forum, em Milwaukee, quando defendeu que é preciso “parar de normalizar” a conduta de Trump. “Quer acreditem ou não nas acusações, a conduta não é digna do cargo de Presidente dos EUA“, disse o candidato. Christie e o ex-governador do Arkansas, Asa Hutchinson, foram os únicos que recusaram apoiar o magnata em caso de condenação. No entanto, a maioria dos candidatos disse que votaria em Trump mesmo que fosse condenado, segundo o Washington Post. Um dos mais acérrimos defensores do ex-presidente foi o empresário Vivek Ramaswamy, de 38 anos, que classificou mesmo Trump como o “o melhor presidente” da história dos EUA.

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Outra tema que fez exaltar os ânimos e elevar o tom do debate foi o apoio dos EUA à Ucrânia. Ramaswamy defendeu que, se for eleito, não enviará mais apoio à Ucrânia, uma vez que os interesses norte-americanos deveriam ter prioridade. “Deveríamos usar esses mesmos recursos militares para evitar a invasão da nossa própria fronteira sul, aqui nos Estados Unidos”, sublinhou o candidato.

Já o governador da Florida Ron DeSanctis defendeu que o apoio norte-americano à Ucrânia deve ser acompanhado pelo reforço do apoio dos países europeus. “Eu gostaria que a Europa assumisse um peso relevante na ajuda”, afirmou. Tanto Nikki Haley como o ex-vice presidente Mike Pence e Chris Christie defenderam vigorosamente a continuidade do envio de  ajuda como um elemento crucial para a segurança dos EUA.

Christie e Haley saíram por cima, diz analista

Entre os analistas, muitos consideram que a melhor prestação foi a de Ramaswamy, um dos candidatos mais interventivos e que conseguiu passar a ideia de que enfrenta o establishment do partido, segundo a analista Natalie Allison, citada pelo Politico. Para Collin Anderson, professor do departamento de Ciência Política da Universidade de Buffalo em Nova Iorque, Haley e Christe foram os candidatos com melhor prestação no debate. “Chris Christie teve um bom desempenho. Ele citou muito a sua experiência anterior como advogado e governador. O seu objetivo de se estabelecer como moderado ‘não-Trump’ parecia dar certo, à medida que ele insistia continuamente na importância de se deixar cair Trump. Várias das suas posições políticas foram recebidas com desaprovação pela multidão, por isso veremos se o seu desempenho pode traduzir-se num aumento nos números das sondagens”, disse Anderson, em declarações à agência Lusa.

Em relação a Nikki Haley, o analista considera que a antiga governadora da Carolina do Sul começou o debate tranquilamente, mas tornou-se mais presente à medida que o debate avançava, atingindo o seu ponto alto em temas como o aborto e a política externa.

“A sua política de aborto era pragmática — ela sabe que os Republicanos estão, em geral, do lado errado da opinião pública quando se trata de aborto. O aborto já esteve em votação durante as eleições intercalares de 2022 e isso afetou os Republicanos. Haley também elaborou uma política externa forte em relação à Ucrânia e à China, que contrastou com alguns dos seus colegas em palco. Ela provavelmente não obterá muito apoio com isso, mas mostrou que merece ser considerada uma candidata séria”, defendeu.

Em relação aos vencidos da noite, Collin Anderson, na contramão de muitos analistas e eleitores Republicanos, considera que o empresário de biotecnologia indiano-norte-americano Vivek Ramaswamy integra essa lista. “Ramaswamy entrou como terceiro preferido entre os eleitores Republicanos, mas a sua participação neste debate não lhe vai render qualquer apoio dos Republicanos moderados ou dos independentes”, apontou o professor universitário.

Também o segundo classificado nas sondagens, Ron DeSanctis, não teve um bom desempenho, na opinião de Anderson.“DeSantis precisava de usar este debate para realmente destacar-se da multidão. Infelizmente, o seu desempenho no debate não vai ajudar”, ao relançamento da sua campanha, frisou. Isto numa altura em que o governador da Florida desce consecutivamente nas intenções de voto e já se encontra a mais de 35 pontos percentuais de Donald Trump.

Para o analista, “realisticamente, este debate tornou-se uma entrevista de emprego para quem quer que seja o vice-presidente de Trump”.

Trump apostou na contraprogramação

Já “o elefante que não está na sala”, Trump escolheu resguardar-se e preferiu não comparecer em Milwaukee, antevendo a chuva de críticas de que iria ser alvo. Em vez disso, preferiu correr em pista própria: ao mesmo tempo que começava o debate, era divulgada na rede social X (o antigo Twitter) uma entrevista concedida pelo ex-presidente a Tucker Carlson, apresentador despedido da Fox News.

Na entrevista, que tinha sido gravada no seu clube de golfe em Bedminster (no estado de Nova Jérsia), Trump aproveitou para atacar os rivais à nomeação republicana e classificar os democratas como “animais selvagens, pessoas doentes”. Quanto a Joe Biden, Trump considera o atual presidente norte-americano “desonesto, corrupto e o pior presidente da história dos EUA”.