“Jogo mais importante da época até agora? Os jogos mais importantes do Benfica são sempre contra o FC Porto. Já vencemos duas vezes, e amanhã [terça-feira] não há uma decisão final na Champions….”. Quando foi questionado sobre a relevância da receção aos espanhóis da Real Sociedad, Roger Schmidt respondeu com aqueles argumentos que muitos utilizaram na última temporada para criticar o início do pior momento dos encarnados na temporada – a derrota com o FC Porto na Luz. Mais do que isso, o facto de alegadamente não percebido o que representavam os clássicos com os azuis e brancos em Portugal. Agora, percebeu. Percebeu de tal forma que puxou dos galões desses dois triunfos para lançar o encontro com os bascos, esse sim sem margem de erro perante os objetivos traçados pelas águias no início da temporada. Era impossível chegar aos oitavos da Liga dos Campeões somando mais uma derrota? Não. Mas não andaria longe desse cenário…

Benfica perde com Real Sociedad na Luz e fica com vida muito difícil na Liga dos Campeões

“Percebo a pergunta. Queremos ficar na Liga dos Campeões. Na época passada, esforçámo-nos para estar na Champions e para vencermos o Campeonato. A Champions é a maior competição de clubes e essa é a nossa grande motivação, continuarmos a jogar nesse nível. Vamos fazer tudo para vencer e para mudar a dinâmica do grupo. Liga Europa? Já falei muito disso, o nosso objetivo é passar à fase seguinte. Podemos consegui-lo sem termos de fazer contas. Se estivermos concentrados, podemos passar à fase seguinte. Está tudo nas nossas mãos. A Champions é um prova de fogo para os treinadores. Taticamente precisamos de encontrar a melhor abordagem para o jogo e depois temos de ver a melhor mentalidade para implementar. Falamos disto desde a época passada e é preciso olhar para trás e usar a experiência que temos em mais de um ano, recordar como gerimos estas situações e qual a melhor forma de estarmos no nosso melhor”, apontou.

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O último compromisso dos encarnados, frente ao Lusitânia nos Açores para a Taça de Portugal, teve como ponto alto o fim do jejum de golos de Arthur Cabral mas não representou muito em relação ao momento que o Benfica atravessava antes da paragem para as seleções. Até aí, e depois da vitória no clássico para a Liga com o FC Porto, houve uma derrota em Milão frente ao Inter com uma segunda parte onde os encarnados estiveram longe do que já mostraram em contexto europeu e um triunfo pela margem mínima nos descontos no Estoril em que a exibição e sobretudo o rendimento ofensivo deixou muito a desejar. Era em relação a essa fase que o técnico germânico procurava uma espécie de redenção, frente a uma equipa da Real Sociedad com parecenças a nível de jogo com o Benfica mas com outros pontos fortes e debilidades.

“Ao analisarmos a Real Sociedad, vemos uma equipa que joga um futebol de alta intensidade, com uma abordagem clara em termos táticos, muito boa nas transições. Não importa se perdem a bola mas quando a ganham têm jogadores que estão disponíveis para momentos de transição. Vejo uma equipa muito boa, sei bem que temos que jogar no nosso máximo. Eles estão em boa forma, na temporada passada estiveram muito bem, qualificaram-se para a Champions. São uma das melhores equipas da Liga neste momento e estão muito habituados uns aos outros. Vai ser muito difícil mas temos a vantagem de jogar em casa e sabemos que temos a capacidade de vencer. Será essa a nossa tarefa amanhã. Não foi o arranque ideal na Champions, é sempre difícil começar a sofrer dois penáltis e um vermelho na Liga dos Campeões, mas temos de saber gerir situações difíceis”, destacara Roger Schmidt, recordando a derrota na Luz com o Salzburgo.

Era um teste de fogo contra uma equipa que parece ser feita de gelo neste tipo de contextos. Olhando para o rendimento dos bascos esta temporada, marcada pelo adeus precoce de David Silva após contrair uma lesão grave no joelho, a Real Sociedad pode ou não ganhar mas é muito complicada de bater (só perdeu fora com Real e Atl. Madrid), numa competitividade que ficou bem patente no encontro inaugural com o Inter que só terminou em empate por um golo de Lautaro Martínez aos 87′. Agora, como dizia o próprio presidente Rui Costa à margem do habitual almoço de direções, “era a primeira de quatro finais”: “É um jogo de grande importância para nós. Ao contrário dos últimos dois anos, onde chegámos aos quartos, começámos bem o grupo, o que não aconteceu agora, mas continuamos a depender de nós. Temos todas as possibilidades de passar e é para isso que iremos lutar. Esperamos que conseguimos fazer um jogo ao nosso nível”.

Esperava-se uma noite à Benfica, foi tudo menos uma noite à Benfica. Mais do que isso, foi tudo menos uma noite daquelas a que a equipa comandada por Roger Schmidt já mostrou que consegue fazer, não só na Liga mas também na Europa. E se é verdade que alguns jogadores estiveram a anos luz do habitual rendimento, casos de Jurásek, João Mário, David Neres ou os lançados Kökçü e Arthur Cabral (Aursnes, João Neves e a aposta Tiago Gouveia foram as raras exceções), esta foi sobretudo uma derrota de treinador. Uma derrota porque a Real Sociedad fez o que faz sempre sem a mínima oposição nesse sentido. Uma derrota porque aquela agressividade e intensidade no jogo com e sem bola esteve sempre desaparecida. Uma derrota porque as mexidas ao intervalo ainda pioraram globalmente a equipa. Quando não podia falhar, o Benfica falhou e Schmidt passou ao lado sem corrigir tudo o que tinha falhado. Com isso, a Champions é uma miragem. Tão ou mais preocupante do que isso, foi uma equipa sem autor que averbou mais uma derrota de autor.

Ficha de jogo

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Benfica-Real Sociedad, 0-1

3.ª jornada do grupo D da Liga dos Campeões

Estádio da Luz, em Lisboa

Árbitro: Clément Turpin (França)

Benfica: Trubin; Bah (Chiquinho, 81′), António Silva, Otamendi, Jurásek (Juan Bernat, 59′); João Neves, Aursnes; David Neres (Tiago Gouveia, 69′), Rafa, João Mário (Kökçü, 46′) e Musa (Arthur Cabral, 46′)

Suplentes não utilizados: Samuel Soares, Morato, João Victor, Tomás Araújo, Florentino Luís, Gonçalo Guedes e Tengstedt

Treinador: Roger Schmidt

Real Sociedad: Remiro; Traoré (Elustondo, 69′); Zubeldia, Le Normand, Aihen Muñoz; Merino, Zubimendi, Brais Méndez; Kubo (Carlos González, 76′), Oyarzabal (Ali Cho, 90+2′) e Barrenetxea (Zakharyan, 76′)

Suplentes não utilizados: Ayesa, Unai Marrero, Olasagasti, Sadiq, Pacheco, Turrientes, González e Magunacelaya

Treinador: Imanol Alguacil

Golo: Brais Méndez (63′)

Ação disciplinar: cartão amarelo a Elustondo (71′), Mikel Merino (75′) e Bernat (77′)

Com David Jurásek de início como lateral esquerdo, Aursnes perto de João Neves no meio-campo perante a condição física ainda longe do ideal de Kökçü após problemas físicos e David Neres no lugar do lesionado Di María, o Benfica não demorou a receber o cartão de visita daquilo que a Real Sociedad queria fazer: muita posse, pressão alta, mobilidade na frente a explorar os espaços entrelinhas com a orquestra dos canhotos de Mikel Merino, Oyarzabal e Kubo desde início a tentar a diferença. Ainda assim, entre esse domínio a abrir, o único lance que criou alguma sensação de perigo acabou nas malhas laterais controlado por Trubin, numa iniciativa de Kubo da direita para o meio com remate fraco (7′). Do bom para o mau, Jurásek aproveitou as debilidades defensivas do japonês para dar profundidade pela esquerda numa jogada que terminou com o remate de David Neres prensado num defesa contrário antes de sair pela linha de fundo (9′). A defesa subida ajudava a formação espanhola no seu jogo habitual mas também motivou o primeiro “susto”, com Rafa a ganhar nas costas, a oferecer o golo a Musa que não falhou mas a ser anulado (12′).

O Benfica não teve propriamente resultados práticos desse lance mas deixou um aviso que a Real Sociedad soube ouvir, quase que “obrigando” os bascos a recuarem um pouco mais as linhas e dando outra margem de construção a partir de trás aos encarnados. No entanto, não conseguiu capitalizar as dúvidas que esse lance criou e o equilíbrio que tinha ganho na partida. Resultado? A Real Sociedad voltou a crescer. Com mais bola, com mais passes verticais, a jogar mais metros à frente, a criar mais oportunidades de perigo. E se a jogada em que o lateral Muñoz apareceu à entrada da área para arriscar a sua sorte de pé direito num remate que saiu a rasar o poste de Trubin (26′), Braias Méndez aproveitou um passe de Mikel Merino para o centro da área para desviar de cabeça para golo mas com o lance a ser também anulado por fora de jogo (29′).

Os bascos estavam inclinados para o ataque, tendo dois lances quase seguidos em que ficaram a pedir sem razão mãos de João Neves e António Silva para penálti que o árbitro e o VAR mandaram seguir. Ainda assim, e ao contrário do que aconteceu no arranque da partida, não mais o Benfica voltou a colocar os bascos “em sentido”, com Roger Schmidt à espera claramente do intervalo para organizar peças perante um conjunto basco que começava a justificar algo mais, que voltou a ficar perto num remate de Barrenetxea que passou a rasar o poste da baliza de Trubin (45′), e que deixava a Luz à beira de um ataque de nervos, como se percebeu pelos assobios que se foram ouvindo aqui e ali para a exibição muito aquém da equipa encarnada.

Ao intervalo, o germânico tentou agitar a equipa. Corrigiu posicionamentos, lançou Kökçü para fazer aquela habitual dupla de meio-campo com João Neves, trocou Arthur Cabral por Musa sem que se percebesse ao certo o porquê a não ser por um ato de fé inspirado no golo do brasileiro na última partida (até porque Musa, naquilo que conseguiu jogar, esteve bem). Estavam lançadas as cartas para uma mesa de jogo que seria ainda mais da Real Sociedad após o recomeço. Em posse, em território, em passes, em domínio, em controlo, sempre à frente na qualidade de processos e na quantidade de unidades que colocava no meio-campo. O golo parecia ser uma questão de tempo, sendo que Trubin também ia ajudando a manter o nulo como se viu numa grande defesa para canto num remate de Zubimendi, outro craque dos bascos (53′). No entanto, a resistência acabou mesmo por cair num lance em que Mikel Merino teve espaço no corredor central, lançou Barrenetxea na esquerda e Brais Méndez apareceu de rompante na área para fazer de primeira o 1-0 (63′).

Se até aí o equilíbrio emocional ainda se ia mantendo, nos minutos seguintes a equipa colapsou por completo e por sorte não ficou com uma desvantagem ainda maior, num lance em que Kubo fez mais uma vez aquela diagonal venenosa da direita para o meio até ao remate que bateu com estrondo na trave (67′). David Neres ainda teve um remate para defesa de Álex Remiro mas o encontro só mudaria um pouco de feição nos 15 minutos finais por dois motivos muito específicos: por um lado, a entrada de Tiago Gouveia, que agitou o ataque dos encarnados e até no limite deveria ter levado à expulsão por acumulação de Elustondo, que rendeu Traoré na lateral direita; por outro, a quebra física das unidades da frente dos bascos, que motivou substituições que não trouxeram nada de positiva à equipa. Ainda assim, e à exceção de um remate de Aursnes para defesa de Remiro (87′), a produção ofensiva foi sempre curta para quem não podia perder…