Escreve-se Wladimir, mas pronuncia-se Volodymyr. Como o nome próprio de Zelensky e não como o de Putin (Vladimir). É o esclarecimento que dá o pontapé de saída para um balanço de quase dois anos de guerra na Ucrânia feito por um antigo campeão olímpico e mundial, que tomou de ‘assalto’ o palco da Web Summit para “espalhar a notícia” sobre o conflito, mas que teve espaço para falar sobre corrupção e até António Costa.

Foi há algumas semanas que a Comissão Europeia recomendou ao Conselho que abrisse negociações formais para a adesão da Ucrânia à União Europeia. O combate à corrupção no país foi imposto como uma das condições. Wladimir Klitschko, ex-pugilista e irmão do autarca de Kiev, não escapou à pergunta sobre o que pode ser feito na luta contra a corrupção, e defendeu que a “melhor e mais rápida luta” reside na digitalização. Aproveitando a oportunidade, e mostrando estar relativamente atento às últimas notícias da política portuguesa, mencionou a Operação Influencer, ainda que sem referir esse nome.

Falando de corrupção, ouviram as notícias acerca do primeiro-ministro português [demissionário]? Acusações, mas que não eram verdadeiras, não eram corretas. Então, eram ou não eram?”, questionou, mostrando-se confuso com os contornos da investigação.

Considerando que a Ucrânia deve, tal como acontece com os campeões de boxe, continuar a “lutar até ao fim”, até à vitória, defendeu que é preciso “ser egoísta”. “Sem ego não vamos alcançar nada na nossa vida, nos nossos negócios, na nossa família, no nosso país, na nossa nação (…) ego é poder, força motriz. Não estou a falar de narcisismo, isso é negativo, ser egoísta é positivo.”

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Desta forma, Wladimir Klitschko acredita que a Ucrânia não deve “comprometer-se”, nomeadamente no que diz respeito a negociações com a Rússia para um cessar-fogo porque Moscovo, considera, tem vindo a “mentir há décadas”. “Não podemos confiar em mentirosos”, acrescentou, defendendo que a Ucrânia luta para viver em “democracia” e para ser associada a um “mundo livre”.

Wladimir Klitschko, o ex-campeão olímpico e mundial que se reinventou a pensar ser de novo campeão

Durante mais de 20 minutos — e com espaço para falar sobre o inverno que se aproxima e para explicar que, como nasceu no atual Cazaquistão, cresceu numa família que falava russo, mas que desde o início da guerra passou a adotar o ucraniano — o antigo atleta recordou que no início do conflito, as pessoas acreditavam que a Ucrânia ia “falhar em três dias, talvez numa semana”. Por isso, Kiev avançou para uma “guerra de defesa” das suas cidades, das suas vidas e do seu país. Um verdadeiro “underdog, se falarmos em termos de boxe”.

No papel de ex-pugilista e já perto do final da sua intervenção, Klitschko falou sobre os próximos Jogos Olímpicos, que se realizam em Paris no próximo ano, defendendo que “como consequência pela guerra, a Rússia e a Bielorrússia devem ser banidas” da competição, uma opinião que lhe valeu muitos aplausos. “Se não há consequências neste mundo, o agressor vai continuar. É preciso haver consequências”, mesmo que não sejam boas para os atletas.

“É doloroso perceber que atletas ucranianos que deveriam ir aos jogos olímpicos foram assassinados em Mariupol, Bakhmut, Kharkiv, Kiev…”, continuou o antigo campeão, que tinha estado presente na Web Summit de 2019, deixando uma questão no ar, numa altura em que a Ucrânia está sob ataque “todas as noites”. Afinal, “quantos mais atletas serão mortos até ao início dos Jogos Olímpicos?”.

Há quatro anos, ainda a Rússia não tinha invadido a Ucrânia, Wladimir Klitschko, que conquistou a medalha de ouro de pesos pesados nos Jogos Olímpicos de 1996, subiu ao palco para falar sobre a sua carreira, sobre o irmão (que na altura já era mayor de Kiev) e sobre a importância que a tecnologia pode ter no desporto atual. Após um hiato, regressou à cimeira com um propósito diferente, uma vez que tem sido uma das vozes mais ativas a defender a paz, mas ainda com a tecnologia em atenção. Uma Ucrânia que considera “muito moderna” e avançada na digitalização, algo que contrasta com uma Rússia que “desliga a internet” para que a população não “obtenha a verdade”. “A Rússia está a andar para trás em vez de desenvolver o seu povo, o seu país.”