Num dia em que os sindicatos representativos de médicos e enfermeiros se reuniram com a ministra da Saúde pela primeira vez, os papéis inverteram-se. Se nos últimos meses a contestação tinha ficado a cargo dos médicos (que fizeram greve e se recusaram a realizar horas extra, paralisando as urgências) agora são os enfermeiros a mostrar sinais de desagrado — de tal forma que, mesmo numa fase inicial da atividade do novo governo, vão manter a greve que já tinha sido agendada para dia 10 de maio.

À saída da reunião com Ana Paula Martins, o presidente do Sindicato Independente dos Médicos (o primeiro sindicato a ser recebido pela tutela) revelou que a ministra mostrou abertura para aceder ao aumento salarial de 15% que é reivindicado pelos médicos, embora tenha feito depender a satisfação dessa exigência da capacidade orçamental do país para acomodar esse aumento da despesa.

Médicos exigem aumento de 15%. Ministra promete avaliar “capacidade financeira”

“A ministra disse o que tem dito publicamente, que vão avaliar a capacidade financeira do estado para dar resposta à questão. Já tínhamos dito que aceitávamos que fosse faseado no tempo”, sublinhou Nuno Rodrigues, acrescentando que Ana Paula Martins mostrou abertura para analisar a questão e que se apresentou como uma pessoa “de diálogo e com vontade de resolver os problemas”.

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O recém-eleito presidente do SIM lembrou aos jornalistas, no final da reunião, que, mesmo com o aumento intercalar de 15% alcançado no ano passado, “os médicos ainda estão a perder 2% [de poder de compra] em relação a 2015, ou seja, ganham menos hoje do que em 2015”.

Nuno Rodrigues referiu que o SIM entregou esta sexta-feira o “caderno reivindicativo” à ministra da Saúde, embora as negociações ainda não se tenham iniciado. A expectativa do sindicato é que o protocolo negocial, que define os temas que vão ser alvo de discussão entre os sindicatos e a tutela, seja assinado em maio.

“Pedimos [à ministra da Saúde] que em 2024 se concretize um calendário para a melhoria das condições de trabalho dos médicos (mais de 50% estão na primeira categoria da carreira, o que é inaceitável).

Nuno Rodrigues adiantou que o SIM apresentou também “propostas para o aumento da acessibilidade dos portugueses à saúde (tanto nos cuidados de saúde primários como nos hospitais) e propostas para que os setores privado e social possam ajudar o SNS, dando um contributo para que os problemas dos portugueses fiquem resolvidos”.

Já a Federação Nacional dos Médicos espera que o protocolo negocial seja assinado em maio e diz que ministra teve “postura mais séria” em relação ao anterior governo. À saída da reunião com a ministra da Saúde, a presidente daquela estrutura sindical, Joana Bordalo e Sá, revelou que o protocolo negocial (com as matérias a negociar e respetivo calendário) pode ser assinado pela FNAM e pelo Ministério da Saúde até final de maio, dando início às negociações.

“Há compromisso de, dentro de um mês (pelo menos até 27 de maio), nos sentarmos à mesa e firmarmos um protocolo negocial. O SNS não pode esperar mais”, referiu Joana Bordalo e Sá, aos jornalistas.

Segundo a responsável sindical, “houve uma postura mais séria e de compromisso relativamente à equipa ministerial anterior”. “Foi-nos apresentada uma convocatória com uma ordem de trabalhos e ficou o compromisso de que as formalidades e a correção se vão cumprir”, sublinhou a presidente da FNAM.

Joana Bordalo e Sá adiantou que o sindicato teve oportunidade de apresentar à nova equipa ministerial as principais propostas, nomeadamente a atualização da grelha salarial dos médicos e o regresso ao horário de 35 horas de trabalho semanais. A FNAM quer também melhorar as condições dos médicos internos, “que são um terço da força de trabalho e estão fora da carreira”, lembrou.

Sindicato dos Enfermeiros quer respostas “mais cedo” e mantém greve de dia 10

Já do lado dos enfermeiros, a plataforma que une cinco sindicatos de enfermagem saudou a abertura ao diálogo por parte da ministra da Saúde para tentar resolver os problemas que afetam a classe.

Houve abertura por parte da ministra para tentar solucionar os problemas que afetam a enfermagem portuguesa. Foi entregue o nosso compromisso pela enfermagem, comum a estes cinco sindicatos, onde temos as nossas reivindicações que pretendemos ver negociadas a um curto prazo de tempo”, salientou Fernando Parreira falava aos jornalistas após os dirigentes do SIPE, Sindicato de Enfermeiros (SE), Sindicato Democrático dos Enfermeiros de Portugal (SINDEPOR), Sindicato Independente de Todos os Enfermeiros Unidos (SITEU) e Sindicato Nacional dos Enfermeiros (SNE) se terem reunido hoje à tarde cerca de uma hora e meia com Ana Paula Martins no Ministério da Saúde, em Lisboa.

No entanto, o Sindicato dos Enfermeiros Portugueses, afeto à CGTP, decidiu, já depois da reunião, que vai manter a greve agendada para dia 10 de maio. “O Ministério da Saúde não assumiu hoje o compromisso de, até ao dia 10 de maio, dia de greve nacional dos enfermeiros, fixar o conjunto das matérias a negociar, dos tópicos a negociar e da agenda negocial”, disse o presidente do SEP, José Carlos Martins, à saída do Ministério da Saúde. “Os problemas são tão conhecidos e tão graves, há tantas injustiças e tanta discriminação, que os enfermeiros querem respostas muito mais cedo”, salientou.

De acordo com José Carlos Martins, o Ministério da Saúde e o Governo “não se comprometeram a negociar”, entre outras coisas, a contagem dos pontos e a alteração à carreira de enfermagem. “Não assumiu negociar isto, a fixação destes tópicos, num protocolo negocial, até ao dia 10 de maio, que nos empurra para concretização desta greve”, frisou.

José Carlos Martins lembrou, no entanto, que o Ministério da Saúde tem “vontade de continuar a negociar para fixar em protocolo negocial as matérias que existem”, mas “não é compatível com a urgência que os enfermeiros têm”.

“Não ficou em cima da mesa nenhuma perspetiva de nova reunião até ao dia 10 de maio, e, por isso, vamos em frente com aquilo que é a exigência, dando expressão à insatisfação dos enfermeiros, para que rapidamente se negocie a solução para os seus problemas”, sustentou.