Enviado especial do Obervador em Paris, França

“Aproveitem bem o último dia e vemo-nos em LA!”. Apesar de ser um “meio dia” ainda com várias medalhas por atribuir em múltiplos desportos, a manhã deste domingo começava a marcar a despedida dos Jogos de Paris-2024 já a projetar aquilo que será a próxima edição nos EUA e não era preciso muito para vermos os sinais de despedida, neste caso na sala de imprensa. Lá fora, quando todos os adeptos iam assumindo o seu lugar no Velódrome de Saint-Quentin-en-Yvelines, dezenas de voluntários iam fazendo as últimas imagens para mais tarde recordarem. Ao todo foram bem mais de 100 países representados nesta enorme organização que, sobretudo depois da cerimónia de abertura, foi começando a afinar trabalho sempre a melhorar.

À semelhança de Tóquio, Maria Martins era a última atleta portuguesa a entrar em ação. No Japão, fazendo também a respetiva competição no derradeiro dia, terminou na sétima posição a prova de omnium, dando um último diploma à Missão que conseguira os melhores resultados de sempre a nível de medalhas com o ouro de Pichardo, a prata de Patrícia Mamona e o bronze de Jorge Fonseca e Fernando Pimenta. Aí, de uma forma pragmática, a relevância e mediatismo do ciclismo de pista era reduzido. Muito reduzido. Três anos depois, assumiu o total protagonismo. Por mais cruel que à vezes possa parecer, a análise a um desempenho tem nos resultados a sua base. Sem a modalidade, havia a prata de Pichardo, o bronze de Patrícia Sampaio, alguns diplomas sólidos como os do triatlo e várias desilusões. Com a modalidade, a barreira dos melhores resultados de sempre estava ultrapassada, com as mesmas medalhas mas tendo pódios mais altos.

De forma surpreendente, Iúri Leitão tornou-se o grande atleta português em Jogos Olímpicos. A prata no omnium não era completamente inesperada, tendo em conta que chegava a Paris na condição de campeão mundial. Ainda assim, os contornos dessa conquista não deixaram de ser épicos. Já na prova de madison, aí, era tudo menos improvável na teoria. Nos melhores momentos do dia anterior antes do início da competição de Maria Martins, a transmissão em inglês do Eurosport recordava o fabuloso triunfo de Iúri com Rui Oliveira naquilo que descrevia como uma corrida de caos entre quedas, falhas na passagem e um ataque final nas últimas voltas pontuáveis que coroou uma estratégia de excelência que terminou com o ouro. Iúri igualava Lopes e Pichardo com um ouro, sendo o primeiro de sempre com duas medalhas numa edição.

De forma inevitável, Portugal passava a ser olhado de outra forma na modalidade e num plano internacional. Nessa mesma transmissão que é difundida por inúmeros países, davam conta do facto de o país ter quatro canais e de três deles estarem a fazer diretos lá fora com adeptos, dirigentes e demais pessoas envolvidas na Missão depois da conquista, quase que num reconhecimento daquilo da forma como se valorizava algo que não tinha propriamente grande expressão. Mais do que Iúri Leitão, mais do que Rui Oliveira (e o gémeo Ivo, que também foi a Paris a correr porque tinha compromissos de estrada no início da semana), mais do que o técnico Gabriel Mendes, foi a vitória de uma aposta e de um projeto de quase uma década e meia que tem outros nomes de peso na construção de um sonho como Artur Lopes, antigo líder da Federação.

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Ainda assim, havia um outro capítulo. Se antes da prova de Iúri Leitão o português era um dos focos até pelo estatuto de campeão mundial, no caso de Maria Martins isso não acontecia. Falava-se e muito de Jennifer Valente, norte-americana que era campeã olímpica de pista no omnium. Da belga Lotte Kopecky. Da francesa Valentine Fortin. Da britânica Neah Evans. Da australiana Georgia Baker. Da atleta nacional, quase nada. Nada mesmo. Ou seja, nessa perspetiva estava como a equipa de madison… com os resultados sabidos.

A prova de scratch, que começou com um ligeiro atraso adensado depois pela troca de bicicleta da italiana Letizia Paternoster na sequência de uma queda quando estava ainda no aquecimento, não foi propriamente um início auspicioso para Maria Martins mas sem condicionar também tudo o resto que se poderia seguir, terminando em 13.º com 16 pontos (atrás da sexta posição em Tóquio, que lhe deu então 30 pontos). Mais na frente, Jennifer Valente mostrava ao que vinha, vencendo à frente da canadiana Maggie Coles-Leyster e da australiana Georgia Baker. Não havia propriamente grandes sinais de preocupação apesar de haver o desejo de um lugar um pouco mais à frente, sendo certo sobretudo que as favoritas começavam a fazer um corte inicial sobretudo em relação à belga Lotte Kopecky, que não passou a abrir de uma 17.ª posição.

De seguida, a prova de tempo. A irlandesa Lara Gillepsie ficou com a lotaria dourada na mão, conseguindo logo de início uma fuga que não foi anulada e que lhe permitiu somar uma volta de avanço além de todos os pontos que foi fazendo. Já Maria Martins, que não conseguiu anular o corte feito pelas principais favoritas a partir de metade da prova, tentou colocar-se o melhor possível no grupo que se seguia e fechou num oitavo lugar que lhe garantiu mais 26 pontos e a ascensão ao 11.º posto a meio da corrida (o mesmo que tinha feito em Tóquio). Agora começava a chegar a praia que teria de ser sua para tentar repetir o diploma de 2020.

Problema? A prova da eliminação. Voltou a haver uma daquelas situações que podem depois retirar o foco de todos os corredores quando a polaca Daria Pikulic foi eliminada mas depois a decisão foi repetida e a corrida foi neutralizada para que se recolocasse no grupo. Maria Martins tinha dado consistência em Tóquio ao seu resultado com um quinto posto na terceira prova mas aqui bastou uma pequena distração, depois de ter andado muito tempo sempre bem colocada, para sair com a 15.ª posição, o que lhe custou pontos que seriam essenciais depois na última prova (somou somente 12). Mais do que o 13.º lugar na geral, o fosso com que ia para a luta por um diploma começava a ser pesado a não ser que fosse “sacar” uma volta de avanço.

Não aconteceu. Depois de uma referência que parecia impensável no ecrã gigante do velódromo que colocava Portugal na sexta posição em termos de medalhas de pista (os Países Baixos são reis, com cinco medalhas e três ouros), a final da prova de keirin masculino acabou por atrasar a decisão do omnium depois de Jack Carlin ter caído e levado consigo Muhammad Sahrom e Shinji Nakano quando estavam na luta pelo bronze numa competição ganha pelo inevitável neerlandês Harrie Lavreysen. Chegava a hora da decisão, chegava o momento em que não dava para mais: apesar de ter ainda conseguido sete pontos na parte final, Maria Martins nunca conseguiu encontrar a oportunidade para fugir em busca dos 20 pontos da volta de avanço e terminou o omnium na 14.ª posição, falhando esse objetivo de conseguir pelo menos o diploma.

Em atualização