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Rússia, China, Irão são o foco a ter a conta num “ambiente altamente complexo de ameaças interconetadas”. Dois responsáveis pelas secretas norte-americanas divulgaram informações aos senadores norte-americanos sobre os riscos que os Estados Unidos da América (EUA) enfrentam na comunidade internacional e de que forma aquele a que chamam “eixo do mal” está a agir.
Durante aproximadamente duas horas, os membros da Comissão dos Serviços de Informações do Senado puderam fazer perguntas a Avril Haines, diretora dos serviços secretos dos EUA, e ao tenente-general Jeffrey Kruse, responsável dos serviços de informações no Departamento de Defesa. Numa sessão difundida online, April Haines começou por elencar três tipos de ameaças. O primeiro risco, segundo ela, prende-se com a “competição” entre potências, algumas delas que desejam “minar” a atual ordem mundial e o “sistema internacional”. O segundo perigo relaciona-se com um tipo de ameaças “imprevisíveis”, que incluem ataques cibernéticos, as consequências das alterações climáticas e ainda terrorismo. Já o último tipo de ameaças têm a ver com as “tensões regionais e localizadas”, algumas delas que têm “implicações” na comunidade internacional que vão além da região e dos “países vizinhos”.
A diretora dos serviços secretos dos EUA enumerou três protagonistas que apresentam um maior nível da ameaça para os Estados Unidos e aliados: a China, a Rússia e o Irão, juntamente com os seus proxies. Já Para Jeffrey Kruse, vive-se o “nível de ameaça mais elevado em décadas”. Sendo certo que “individualmente” os riscos “estão ao aumentar”, há uma nuance importante a ter em conta, segundo o responsável: “Há um número crescente de adversários que estão a interagir e a fazer pactos de formas que nunca tínhamos visto”.
As ameaças da Rússia e a “paranoia” de Putin
Para a diretora dos serviços secretos dos EUA, neste momento, o Presidente russo, Vladimir Putin, sente que o tempo corre “a seu favor”. Ou seja: a conjuntura internacional é favorável para continuar a guerra na Ucrânia. O momento atual assim o prova: “A Rússia está fazer ganhos crescentes no campo de batalha e avanços na linha da frente de Donetsk e Kharkiv”.
Além disso, de acordo com Avril Haines, o chefe de Estado russo vê como “positivo” que a indústria de armamento norte-americana e europeia não esteja a ser capaz de sustentar o esforço de guerra ucraniano, havendo igualmente “desafios” na Europa e nos Estados Unidos, no âmbito político, “para ajudar os ucranianos”. Ainda que a análise norte-americana indique que Vladimir Putin esteja aberto a negociar, o Presidente não está disposto a “fazer quaisquer concessões” que beneficiem a Ucrânia.
Neste contexto, Avril Haines argumenta que “as táticas crescentemente agressivas de Putin contra a Ucrânia” — como os ataques contra as infraestruturas elétricas ucranianas — vão continuar. E têm como objetivo “dar a impressão à Ucrânia que continuar a guerra apenas vai aumentar os estragos e não vai oferecer qualquer caminho plausível para a vitória”.
Com o pacote de ajuda norte-americano recentemente aprovado, o Ocidente parece igualmente empenhado em não desistir da Ucrânia. Com este impasse, Avril Haines antecipa que as “táticas agressivas” da Rússia “vão continuar” e que “é improvável” que a guerra “acabe em breve”.
Ainda assim, a responsável das secretas quis deixar bem claro que a Rússia “pagou um preço enorme pela guerra na Ucrânia”. “Perdeu mil milhões de dólares e registou cerca de 300 mil baixas”, sinalizou Avril Haines. Apesar disso, Moscovo quer aumentar os custos com a Defesa nos próximos anos, esperando-se que atinja os 7% do PIB e 25% dos custos do governo federal.
Na ótica de Avril Haines, ao longo destes mais de dois anos de conflito, a “estratégia” e os receios de Vladimir Putin não se alteraram, pese algumas derrotas no campo de batalha. O Presidente russo reforçou a “ideia de que os Estados Unidos e a Europa querem restringir o poder da Rússia” e desenvolveu uma espécie de “paranoia” em redor desta possibilidade.
“Putin acredita que a segurança do seu país está em risco e sob ameaça”, prosseguiu a chefe das secretas norte-americanas, acrescentando que o chefe de Estado defende que apenas com umas “forças armadas poderosas” travará esse cenário, daí a aposta na guerra da Ucrânia.
Contudo, Avril Haines ressalvou que esta tese do Presidente russo acabou por gerar um alargamento da NATO, obtendo, por conseguinte, efeitos indesejados. “Precipitou a entrada da Finlândia e da Suécia na aliança. Certamente nunca teria acontecido antes da invasão”, afirmou, salientando que, perante esta movimentação, Moscovo deverá responder ao reforçar o seu contingente militar na fronteira.
As ameaças da China e a possibilidade de invadir Taiwan com a ajuda da Rússia
Na leitura dos serviços secretos dos Estados Unidos, o Presidente chinês, Xi Jinping, pensa que as relações bilaterais com os Estados Unidos serão marcadas por “instabilidade” nos próximos tempos e Pequim olha para Washington como ainda querendo “conter a ascensão da China e o poder do Partido Comunista”. As autoridades chinesas estão “preocupadas” atualmente com o “aumento das capacidades dos EUA” e receiam que consigam “igualar as capacidades tecnológicas” da China. Por conseguinte, diz Avril Haines, o país tem tentado retaliado economicamente contra os Estados Unidos, infligindo “custos tangíveis” às empresas norte-americanas.
Simultaneamente, as autoridades chinesas têm “ambições regionais” e usam a tecnologia e o domínio económico como forma de “controlar cadeias de abastecimento que podem prejudicar ou beneficiar outros” estados. “Pequim vai ainda continuar a usar força militares para intimidar os vizinhos e moldar a região consoante as prioridades do partido.”
Na mira chinesa está obviamente a reunificação com Taiwan e a possível invasão daquele território. Em termos militares, segundo Avril Haines, Pequim reforçará as suas “forças nucleares e capacidades cibernéticas”, enquanto diplomaticamente tentará “dividir os aliados na Europa e no Indo-Pacífico”.
Ao mesmo tempo, a China vai tentar “aprofundar a relação com o Irão e a Rússia”. Avril Haines não tem, por isso, dúvidas que o esforço de guerra de Moscovo foi sustentado, nos últimos tempos, por Pequim: “Os componentes materiais enviados para a defesa industrial russa foi um dos fatores que deu vantagem a Moscovo na Ucrânia e acelerou a reconstituição da força militar da Rússia, após a sua invasão custosa”.
Por conta das boas relações entre a China e a Rússia, Avril Haines salientou que os dois países estão a fazer “exercícios militares conjuntos” para a possibilidade de Pequim atacar Taiwan. Uma aliança sino-russa para invadir o território que as autoridades chinesas reclamam como seu é “certamente uma possibilidade”, vincou a chefe das secretas, que não precisou o “quão provável é” esse cenário concretizar-se.
O responsável dos serviços de informações no Departamento de Defesa expressou as mesmas preocupações e admitiu que os Estados Unidos estão “apreensivos” com as capacidades de Washington em responder a essa ameaça. Abrindo duas frentes — uma na Ucrânia, outra em Taiwan —, isso dividiria as atenções norte-americanas. “A cooperação [entre a China e a Rússia] é agora sem limites”, assinalou Avril Haines, que notou que em todos os “setores da sociedade” essa aliança está patente.
A ameaça do Irão e a guerra em Gaza
Outros dos países que preocupam os serviços secretos norte-americanos é o Irão e os seus aliados espalhados na região do Médio Oriente. Avril Haines frisou que, neste momento, o grupo xiita libanês Hezbollah não tem interesse numa “guerra total contra Israel e os EUA”, mas a situação tem “potencial para escalar”. Já o grupo iemenita dos houthis vai “continuar a aumentar os ataques” no Mar Vermelho, prejudicando as rotas comércio internacional.
Atualmente, depois dos ataques contra Israel, o Irão travou os planos em marcha para atacar as forças norte-americanas no Médio Oriente. “Não é claro quanto essa pausa vai durar”, afirmou Avril Haines, acrescentando que a tensão no Médio Oriente decorrente da guerra e Gaza e do antagonismo entre Teerão e Telavive pode “galvanizar a Al-Qaeda e o autoproclamado Estado Islâmico”, tendo um “efeito cascata” indesejado.
Para os serviços secretos norte-americanos, não dúvidas que o Irão providenciou “treino” e meios financeiros” a grupos como o Hamas para “minar o Estado de Israel”. E não só: Teerão faz isto igualmente para “reforçar a sua influência” no Médio Oriente, face aos países do Golfo, como a Arábia Saudita ou os Emirados Árabes Unidos.